Pelo menos 31 famílias de Araraquara viveram de perto a dor do abuso sexual de crianças e adolescentes, segundo mapeamento inédito do Conselho Tutelar. Mas este número pode ser ainda maior.
Os dados consideram apenas o período de janeiro a outubro do ano passado. Além das ocorrências de novembro e dezembro, que não estão no estudo, existe ainda a subnotificação – crianças que sofrem caladas, por medo.
Segundo o conselheiro tutelar, Márcio Servino, a palavra da criança não deve ser contestada e, se há relatos é porque houve alguma violação de direitos.
“Não temos um parâmetro pra dizer se isso é decorrente da pandemia, porque este levantamento, este trabalho nunca tinha sido feito. Mas um abuso é inaceitável, imagina 31. Infelizmente com a questão pandêmicas, crianças fora da escola, fica ainda mais difícil identificar estas possíveis violências”.
VÍTIMAS
Das vítimas, 77% são crianças, ou seja, com até 12 anos de idade, e 23% adolescentes. Foram 24 crianças vítimas de abuso sexual em apenas 10 meses, em Araraquara.
Do total de casos, 10 foram registrados no Plantão Policial, ou seja, à noite ou aos finais de semana, e 21 na Delegacia da Mulher, que é a responsável por casos que envolvem crianças e adolescentes.
A delegada titular da DDM, Meirelene de Castro Rodrigues, explica que a definição de abuso sexual é ampla e que as famílias devem ficar atentas aos sinais.
“Abuso seria prática de conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso, e este ato tem um sentido mais amplo. Muitas vezes, um beijo forçado é um ato libidinoso. Na nossa experiência, a criança e o adolescente dá sinais, alguma coisa de errada começa a ser demostrado pela vítima, por isso, é preciso ficar atento aos sinais”, diz ela
ACUSADOS IDENTIFICADOS
O mapeamento do Conselho Tutelar também revela 94% dos acusados foram identificados, eram maiores de 18 anos (94%) e tinham algum vínculo de convivência (61%).
A maioria dos crimes aconteceu na casa das vítimas (58%), depois na casa de algum familiar (26%) e por último em qualquer outro lugar.
A delegada afirma que a palavra da vítima é crucial para a responsabilização do agressor, mas que laudos médicos também podem embasar e sustentar a denúncia.
“Nestes casos é difícil ter testemunha da prática já que autor espera ficar sozinho com a vítima, então testemunha é complicado. Por isso, todas as acusações partem da própria vítima e sempre tem exame de corpo delito”, explica.
MENINAS SÃO AS QUE MAIS SOFREM
As meninas são as que mais sofrem. Elas representam 90% dos casos de abuso sexual, em Araraquara.
Na hora de procurar a polícia, a maioria foi acompanhada dos pais ou algum responsável (77%), seguida de familiares (17%) e amigos (6%).
Segundo a advogada Maria Antônia Alves Pedroso, presidente da Comissão da Infância e Juventude da OAB, toda sociedade é corresponsável na proteção de crianças e adolescentes e deve atuar para combater este crime.
“O papel da sociedade é maior do que punir os culpados é além disso, prevenir e proteger, evitar que este casos aconteçam e o primeiro caso para responsabilizar os culpados é fazer a denúncia”, diz ela.
As zonas sul e norte concentram 29% dos casos, com nove ocorrências cada. Depois aparecem a zona leste (26%), oeste (10%) e a zona rural (6%).
DENÚNCIA
O conselheiro tutelar, Márcio Servino, explica que identificar os pontos com maior ocorrência ajuda o poder público a traçar políticas públicas capazes de reduzir a violação de direitos.
A delegada titular da DDM, Meirelene de Castro Rodrigues, destaca que a omissão em relação a violência também é crime. “A denúncia precisa ser feita sempre”.
Neste dia 18 de maio, Dia Nacional Contra Abuso Sexual de Crianças, a palavra de ordem, para a advogada Maria Antônia Alves Pedroso é conscientizar. “Precisamos orientar as crianças e adolescentes para que eles consigam identificar um abusador”.
Para denunciar pode ligar no disque 100 ou no 190. A Delegacia da Mulher também recebe denúncias em Araraquara e fica na Alameda Rogério Pinto Ferraz, 900, na Fonte.