Ser mãe não é uma das tarefas mais fáceis, principalmente quando se é uma atleta de alto nível. Além das mudanças no corpo e dos preparativos para chegada do bebê, ainda é preciso lidar com o preconceito e a falta de apoio das entidades esportivas.
Esta foi a realidade vivida pela meia da Ferroviária e também da seleção portuguesa, Suzane Pires. Ela é brasileira, mas tem dupla nacionalidade.
Em 2020, a jogadora descobriu que estava grávida, seis meses depois do casamento com o goleiro Gauther Martins. Na época, ela atuava pelo Marítimo.
“Meu período menstrual começou a atrasar, o que não acontece. Isso durou umas duas semanas e faltavam sete dias para a estreia no campeonato. Eu estava meio assim de fazer o teste de gravidez, e aí eu fiz o teste e deu que eu já estava de cinco semanas”, contou bem humorada a afeana.
Ela lembrou que fazia treinos em excesso e chegou até a levar cotovelada na barriga durante um jogo.
Então, veio uma mistura de sentimentos: a felicidade pela realização de um sonho com o marido, mas também a incerteza sobre o futuro da carreira.
“Eu não fiquei triste. Eu fiquei feliz porque eu amo meu marido, já estávamos casados e queríamos construir uma família, só não sabia que seria aquele momento. Mas no começo foi um choque porque eu estava supermotivada para começar a temporada em Portugal, já tinha sido pré-convocada para disputar um torneio na China. Então, quando eu descobri foi um pouquinho de um choque”, explicou.
E ela tinha todos os motivos para ter a sensação de insegurança, até porque no futebol feminino (no Brasil e em Portugal, por exemplo) ainda existem discriminação e falta de incentivo dos clubes em relação à maternidade. No caso da Suzane, quando atuou no Marítimo-POR, não foi diferente.
“Para ser sincera, eu falei que estava grávida e eu sabia que não teria nenhum apoio financeiro por parte deles, que não jogaria mais aquela temporada e não teria salário, o que é bem triste. Aqui no Brasil, eu vejo alguns clubes começando a querer ajudar, mas ainda não é visto com bons olhos uma mulher que queira engravidar durante a temporada e depois deseja seguir carreira”, lamentou a mãe do menino Gautinho de dois anos.
Este cenário mexeu com o psicológico da atleta e fez a jogadora da Ferroviária pensar em parar a carreira antes dos 30 anos. Era uma decisão, que evitaria a sua chegada a Araraquara e a continuidade em vestir a camisa tradicional da seleção de Portugal.
“Eu achava que não iria voltar a jogar, mas meu marido me incentivava, minhas amigas, a Katiuscia (lateral do Corinthians) e meus pais diziam ainda não acabou, mas na minha cabeça não tinha mais como”, lembrou quando cogitou encerrar a carreira para ser mãe.
EXEMPLO
Achar uma mãe e jogadora de futebol é como revelar uma Marta por ano. Quando se tem um exemplo é preciso aproveitar. Logo, a Suzane se tornou uma espécie de “coach” sobre o assunto. Jovens jogadoras, companheiras e até funcionárias da comissão técnica a questionam sobre como é viver a maternidade no mundo esportivo.
“Tem algumas que perguntam como é e como foi voltar a jogar. Não são só jogadoras, técnicas também. Eu conto que não é um bicho de sete cabeças como eu achava que era […] elas sabem das dificuldades e da luta que é [em relação ao modo como as diretorias lidam com a maternidade], por isso elas nem cogitam essa possibilidade enquanto estão atuando”, explicou.
APOIO DO FILHÃO
Fã número 1, o filho Gauther, mesmo nome do pai, tem o grito mais alto entre os torcedores durante os jogos das Guerreiras Grenás, na Arena Fonte Luminosa. Ainda sem saber falar muitas palavras, o bebê de dois anos tem um canto preferido na arquibancada: “mamãe Suzane”.
“Neste ano, ele estava no estádio e a gente respeitando o um minuto de silêncio. Do nada, escutamos um grito bem alto mamãe, e isso dá muito mais força para gente”, riu a meia-campista.
Com a mãe jogando em Portugal, a seleção que o Gautinho torce é a dos lusitanos. A Suzane contou que ele não pode ver uma camisa dos colonizadores que já fica agitado.
Além disso, o menino é super protetor. Quando a jogadora chega em casa com algum ralado ou machucado, ele fica todo preocupado. “Eu volto de algum jogo ou treino com um roxo, arranhão ou mancando, ele fica doido: mamãe, quem fez isso com você, me conta que vou atrás dela”, lembrou.
Contudo, não só de carinho vive a mãe. Até porque o xodó dela também é crítico e questiona quando ela pega pouco na bola durante a partida.
“Ele não entende porque não pode entrar no campo comigo e quando eu fico muito tempo sem tocar na bola ele pergunta por que ninguém tá tocando para mamãe?, finalizou a jogadora.