COM FOLHAPRESS – As escolas estaduais retomam hoje (8) às aulas presenciais em São Paulo – que tem maior rede pública de ensino do país. Em Campinas, ao todo são 166 escolas estaduais, que contam com 106.024 alunos, no entanto, ainda não há um levantamento de quantos estudantes retornarão as aulas presenciais nesse início de ano letivo. Vale lembrar que as aulas presenciais estão suspensas desde de março do ano passado por causa da pandemia de coronavirus.
Apesar da volta às aulas anunciadas pelo governo estadual para hoje, ainda há muitas incertezas sobre esse retorno. Além da insegurança de pais e responsáveis em mandar os estudantes de volta as escolas, a Apeoesp (Sindicato Professores do ensino Oficial do Estado de SP) informou na última sexta-feira (5) que os profissionais devem entrar de greve a partir de hoje por conta dos casos de covid-19 nas unidades de ensino (leia mais aqui).
Em Campinas, ao menos duas escolas estaduais já confirmaram casos entre os funcionários e outras duas estão com ocorrências suspeitas antes mesmo das aulas começarem (leia mais aqui).
Na rede particular, as aulas já retornaram no fim de janeiro. Já nas escolas municipais em Campinas as atividades voltam de forma remota nesta segunda. A retomada presencial está prevista para o dia 1º de março, também com revezamento e com a limitação de 3h diárias.
CAPACIDADE
Na semana passada o governo estadual afirmou que, nas escolas estaduais, as aulas iniciarão com apenas 35% da capacidade e ainda mantendo as aulas remotas.
Segundo o Estado, isso deve acontecer durante as duas primeiras semanas de aula e haverá uma avaliação sobre o aumento de capacidade. Enquanto isso, permanecerão com o percentual reduzido, sem obrigatoriedade, e em esquema de rodízio.
INCERTEZAS
O retorno é ainda bastante polêmico. Muitos pais não querem a retomada das aulas presenciais até que a pandemia esteja mais controlada. Os estudantes que estão no grupo de risco para covid-19 ou com receio do ensino presencial neste momento poderão continuar em casa. A partir de hoje que a pasta vai saber dizer quantos alunos não retornarão após o início das aulas.
PROFESSORES NO ESTADO
Segundo levantamento, até um quarto dos professores da rede pode continuar sem frequentar as cerca de 5.100 escolas paulistas por estar no grupo de risco para a covid-19.
No ano passado, cerca de 43 mil docentes declararam ter problemas de saúde que impedem o retorno, segundo levantamento feito pela reportagem junto à secretaria de Educação do governo Doria (PSDB).
A rede estadual de ensino de São Paulo possui cerca de 166 mil professores ativos espalhados pelas 645 cidades paulistas.
Além de docentes com comorbidades como diabetes, pressão alta, doenças autoimunes, dentre outras, a pasta diz que 5.100 têm idades acima de 60 anos. Outras 1.700 professoras da rede estão grávidas.
Segundo o secretário de Educação de SP, Rossieli Soares, a pasta contratará professores temporários para substituir presencialmente aqueles que são do grupo de risco. No entanto, o número de contratações ainda não foi definido.
Rossieli avalia, no entanto, que o número de docentes que não retornarão presencialmente seja menor, em torno de 18% a 19% do total. A diferença deve ocorrer porque a secretaria exigiu dos profissionais a apresentação de atestado médico que comprove o maior risco para o vírus.
“Uma coisa é a autodeclaração, outra é o médico dizer que a pessoa pertence ao grupo de risco. Precisamos do atestado para evitar fraudes”, diz Soares.
Professores que têm comorbidades relacionadas aos grupos de risco para o coronavírus relatam dificuldade para conseguir comprovar a necessidade de serem mantidos em atividades remotas.
Segundo eles, as escolas já exigiram que apresentassem atestado médico ao menos três vezes desde o início da pandemia -sempre com a regra de que o laudo estivesse atualizado.
Com obesidade, hipertensão e problemas respiratórios, Valeria Cristina Vieira, 48, diz ter apresentado três laudos médicos para ser dispensada das atividades presenciais na unidade em que leciona, a Escola Estadual Adolfo Cazais Monteiro, na zona sul da capital paulista.
“As doenças que nos colocam em grupo de risco são doenças crônicas, que não vão ser curadas em dois meses. Eu tomo remédio para hipertensão há mais de 20 anos. Sinto como se duvidassem de mim com toda essa exigência”, diz.
Segundo o secretário, a pasta deu prazo de três semanas para que os professores apresentassem o atestado médico, o que ele considera ser suficiente.
Docentes que não são do grupo de risco, mas são responsáveis pelo cuidado de pessoas nessa situação também temem o retorno presencial. Pela regra da Secretaria Estadual de Educação, eles não poderão continuar em atividades remotas.
Jaiane Batista Estevam, 35, é mãe de um bebê de 1 ano que tem problemas cardíacos. Ela ainda amamenta o menino. Seu receio é de que possa ser contaminada e infectar o filho.
“Estou em isolamento total com ele desde março, porque não sei exatamente qual o risco de ele ser infectado, do risco de transmissão pela amamentação. Fico desesperada com a ideia de retornar para a escola”, contou.
Segundo Rossieli, quem estiver em trabalho remoto terá de desenvolver atividades em conjunto com os colegas que estiverem em sala de aula. Aí está o maior desafio: fazer a sinergia acontecer para não sacrificar ainda mais a aprendizagem dos cerca de 3,5 milhões de estudantes.
Sabendo do gigante a ser enfrentado, a própria secretaria adiou o retorno presencial das aulas em uma semana para preparar os docentes para a nova realidade.
DISTÂNCIA
O plano de volta às salas de aula prevê que os professores remotos ficarão sob o encargo de alimentar as plataformas digitais das escolas com conteúdo para os estudantes e tirar as dúvidas daqueles que também não voltarão à escola.
Outra função atribuída aos professores que trabalharão a distância é de que sejam responsáveis pelas burocracias, como o preenchimento de notas no sistema. Já os docentes em sala de aula farão o acolhimento dos estudantes e a cobrança da entrega de atividades, além do ensino presencial.
Para a especialista em formação docente Ângela Soligo, professora da Faculdade de Educação da Unicamp, as aulas nos dois formatos vão exigir muita organização e coordenação para evitar nova sobrecarga aos professores.
“É preciso ter um planejamento muito bem definido de quantos alunos e professores estarão em sala, o que cada um vai fazer e como será essa convergência. Sem isso, os dois grupos de docentes vão ficar sobrecarregados.”
Antes mesmo do início do funcionamento das escolas, Rossieli ainda enfrenta grupos dissidentes de prefeitos que optaram por não cumprir o calendário. Em Santo Expedito, a 609 km da capital paulista, as aulas das redes municipal e estadual estão suspensas até 24 de abril por força de decreto municipal. “Acionaremos a prefeitura para ela seguir a nossa determinação”, diz Rossieli.
O secretário diz que o número de prefeitos resistentes ao retorno das aulas presenciais é pequeno. No ano passado, a reabertura das escolas foi travada pela falta de consenso com os municípios até mesmo o prefeito Bruno Covas (PSDB), aliado de Doria, resistiu a autorizar a volta.
Problemas estruturais, atraso de reformas e até vandalismo também são entraves para a volta das atividades em algumas escolas. “Mas não passam de 20 unidades com esses problemas. As escolas nestas condições continuarão fechadas até que possam dar segurança para alunos, pais e professores”, afirma o secretário.
“O desafio é ‘limpar’ o campo dessa decisão da volta e discutir o que a gente precisa fazer para não comprometer ainda mais a aprendizagem”, acentua o secretário.