A Polícia Civil investiga denúncias graves contra um médico neurologista que atua em Campinas. A EPTV teve acesso a boletins de ocorrência registrados por mulheres que acusam o profissional de assédio – veja detalhes abaixo. As vítimas são de cidades diferentes e os casos aconteceram em anos distintos. A primeira denúncia oficial foi registrada em 2015.
O médico tem 73 anos, é neurocirurgião e tem vínculo com o HC (Hospital de Clínicas) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). Além disso, atende no Hospital Irmãos Penteado e em uma clínica particular na Rua José Paulino, no bairro Itapura. Pelo menos cinco mulheres registraram boletins de ocorrência contra ele por supostos assédios e até abusos, durante ou após consultas médicas. Os documentos foram registrados em 2015, 2021 e 2023 por pacientes de Campinas, Santa Bárbara d’Oeste e Paulínia.

Casos denunciados
2015 — Beijo forçado e tentativa de coerção
O primeiro boletim de ocorrência registrado contra o médico, datado de abril de 2015, foi feito por uma mulher que acompanhava a sogra em atendimento no Hospital Irmãos Penteado, em Campinas. Segundo o documento, a sogra da vítima fazia tratamento neurológico com o médico. Durante a visita, o médico convidou a acompanhante a acompanhá-lo até uma sala próxima à recepção, sob a justificativa de mostrar os resultados de exames da paciente.
Já na sala, a mulher se sentou em frente ao neurologista, que iniciou perguntas sobre como ela estava lidando com a situação de saúde da sogra. Ao ouvir a dúvida da vítima sobre o estado da paciente, o médico teria dito que o único problema identificado era hepático. Quando a mulher se levantou para sair, o médico também se colocou de pé, segurou os braços dela, colocou-os sobre seus ombros e disse: “Me abraça gostoso”.
Assustada, ela tentou se desvencilhar, mas ele passou as mãos em suas costas, elogiou seus olhos e afirmou que havia simpatizado com ela. A mulher tentou desconversar, dizendo que ele atendia bem sua sogra, mas o médico insistiu, dizendo que ela não era sua paciente. Em seguida, segundo o boletim, o neurologista segurou-a pelo pescoço e tentou beijá-la à força. Mesmo diante da recusa e da ameaça da vítima de gritar, ele continuou a segurá-la e insistiu para que ela permanecesse no local. Após alguma resistência, ela conseguiu sair da sala, mas ainda foi retida brevemente pelo braço, quando o médico afirmou que “só queria fazer um carinho”, pediu que ela não ficasse brava e sugeriu que “deixassem aquilo só entre eles”.
2021 — Beijos no pescoço e perguntas pessoais em consulta
Em boletim registrado em 21 de maio de 2021 na 1ª Delegacia de Defesa da Mulher de Campinas, uma paciente relatou ter sofrido importunação durante sua primeira consulta com o médico em uma clínica particular. Ela afirmou que havia localizado o contato do médico pela internet e agendado o atendimento.
A consulta, segundo ela, começou normalmente, mas logo o médico pediu que retirasse a máscara de proteção facial e, ao vê-la, comentou: “Você é muito bonita, uma princesa”. Em seguida, passou a fazer perguntas pessoais, inclusive sobre relacionamentos amorosos, o que causou estranhamento.
Ao final da consulta, o médico solicitou que ela se levantasse para que pudesse explicar o encaminhamento do tratamento. Sem máscara, e muito próximo da paciente, ele a abraçou e deu beijos nos dois lados do pescoço e, por fim, na testa. A mulher relatou que ficou paralisada e não conseguiu reagir de imediato, saindo do consultório logo em seguida, ainda em estado de choque.
2022/2023 — Tentativas recorrentes de assédio e ameaças veladas
Outro boletim de ocorrência, registrado em 7 de julho de 2023 no 5º Distrito Policial de Campinas, narra episódios ocorridos em 2022. De acordo com o documento, a vítima acompanhava sua mãe em consultas médicas com o médico, que já a atendia há cerca de uma década. Durante esse período, ela passou a perceber um padrão de comportamento suspeito: sempre que a mãe era atendida sozinha, o médico entregava receitas rasuradas, o que obrigava a filha a retornar ao consultório para solicitar correções.
Em uma dessas idas à clínica, sozinha, ela relatou que o médico tentou agarrá-la e forçar um beijo, mas ela conseguiu se desvencilhar. Em outro episódio, durante uma nova consulta da mãe, com ambas presentes, o neurologista teria dito à jovem: “Não esqueça que você está me devendo algo”, em referência ao beijo que tentara forçar anteriormente.
A vítima ainda relatou à polícia que outras duas mulheres da sua família também foram vítimas de comportamentos semelhantes por parte do médico, mas optaram por não registrar boletins de ocorrência.
Agosto de 2023 — Beijo na boca e conduta insistente após negativa
No boletim registrado em 31 de agosto de 2023 na 2ª Seccional de Campinas, uma mulher afirmou que foi importunada durante uma consulta com o médico em uma clínica da cidade. Segundo o relato, o médico teria feito perguntas de cunho íntimo, como detalhes sobre seu casamento, vida conjugal e atividade.
Ao fim da consulta, após entregar os pedidos de exames e dispensá-la, o médico se aproximou, deu-lhe um beijo no rosto e, em seguida, um beijo na boca. A paciente disse ter se assustado e ficado sem reação por alguns instantes, mas logo repudiou a atitude. O médico então teria perguntado se ela não havia gostado, e ao ouvir um “não”, respondeu de forma debochada: “Mas você deixou”, insistindo nas tentativas de beijá-la, enquanto a chamava de “bonita”.
Diante da recusa da vítima, o médico teria encerrado o episódio dizendo que se tratava apenas de “uma brincadeirinha”.
Setembro de 2023 — Estupro e assédio contínuo durante internação
O caso mais grave foi registrado em Paulínia por uma mulher que passou por cirurgia neurológica com o médico em julho de 2023. Segundo o boletim de ocorrência registrado em setembro de 2023 na Delegacia de Polícia de Paulínia, uma das vítimas procurou o médico para discutir os detalhes da cirurgia neurológica à qual seria submetida. O atendimento ocorreu no dia 11 de julho, na mesma clínica onde os casos foram registrados anteriormente. Ela estava sozinha no consultório e relatou que, em meio à conversa sobre o procedimento, o médico teria se aproveitado de sua fragilidade física, decorrente do quadro clínico, para beijá-la e tocar seus seios e sua genitália.
Ainda conforme o relato, a mulher reagiu, afastou-se e o repreendeu verbalmente. O médico, então, teria justificado a abordagem dizendo que, na consulta anterior, ela teria dado a entender que desejava manter relações com ele. Após a investida, entregou os documentos relacionados à cirurgia e a liberou.
A vítima informou ainda que tentou procurar outro profissional para realizar o procedimento, mas, segundo ela, foi convencida pela assistente social do Hospital Municipal de Paulínia a manter o tratamento com o mesmo neurologista. O argumento utilizado, segundo o boletim, foi de que ela estaria acompanhada por outras pessoas e que, diante da gravidade do seu estado de saúde, seria difícil encontrar outro especialista disponível.
A cirurgia foi realizada no Hospital Irmãos Penteado, em Campinas, e, de acordo com a paciente, os abusos continuaram no período pós-operatório. Enquanto ainda se recuperava da anestesia, sozinha com o médico no quarto, ele teria pedido que ela se deslocasse para mais perto da cabeceira da maca. Diante da recusa, explicando que não conseguia se mover, ele respondeu: “Como não consegue? Até agora estava fazendo sexo comigo e estava gostando”.
Nos quatro dias seguintes de internação, o médico teria mantido comportamentos abusivos sistemáticos: durante os exames, passava as mãos por suas partes íntimas — genitália, nádegas e seios — e, segundo a denúncia, fazia questão de vê-la despida sempre que possível. Em uma das abordagens, teria dito: “Vai tomar banho para eu poder te ver peladinha”.
A paciente também relatou que, embora tivesse direito a um quarto coletivo por meio do plano de saúde, acabou sendo colocada sozinha em um apartamento — o que, segundo ela, teria ocorrido por interferência direta do médico e contribuído para o ambiente propício aos abusos. Ao final do boletim, a vítima afirmou que relatou o ocorrido a uma enfermeira da unidade.
Investigação sobre médico
A investigação foi conduzida pelo 5º Distrito Policial de Campinas. Segundo a Polícia Civil, o inquérito foi concluído e enviado ao Poder Judiciário. Por se tratar de um crime deste tipo, o processo corre em segredo de Justiça.
Na 1ª Delegacia de Defesa da Mulher de Campinas também tramitam outros procedimentos criminais relacionados ao médico. Alguns já foram concluídos e enviados à Justiça; outros ainda estão em andamento. Um termo circunstanciado relacionado a um caso anterior também foi finalizado e encaminhado ao Judiciário na época.
Quem é o médico acusado de abuso?
O médico é natural de Natuba, no Agreste da Paraíba. Por esse motivo, possui registros no CRM (Conselho Regional de Medicina) da Paraíba e de São Paulo. O CRM paraibano informou que o registro do médico está em situação de “interdição cautelar total”, o que invalida os demais registros – inclusive o de São Paulo. De acordo com o Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo), o CRM do médico está suspenso desde o dia 20 de maio. O Cremesp disse ainda que o acusado pode recorrer da suspensão do CRM.
O que dizem os envolvidos?
Procurado, o Hospital de Clínicas da Unicamp informou que acompanha o caso com atenção, respeitando os trâmites legais e a autoridade dos órgãos competentes. Segundo o HC, o médico atuava eventualmente no Caism (Hospital da Mulher), mas em casos de emergência e sempre acompanhado de médicos residentes.
O Hospital Irmãos Penteado informou que não pode comentar o caso por impedimentos legais, conforme orientação do departamento jurídico. Afirmou ainda que, ao receber denúncias desse tipo, toma as providências previstas em lei e em suas normas internas, além de comunicar as autoridades competentes. Questionado se o médico atua atualmente no hospital, respondeu que, devido à LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), não pode fornecer essa informação.
O Tribunal de Justiça de São Paulo foi questionado se há inquérito em aberto envolvendo o médico, mas respondeu que, por se tratarem de processos sob segredo de justiça, não tem como informar, já que esses casos não aparecem em pesquisas simples do sistema.
A Polícia Civil confirmou que, sobre os fatos registrados no 5º DP de Campinas, foi instaurado inquérito policial, as diligências foram realizadas e o caso foi encaminhado ao Judiciário.
O que diz a defesa do médico?
Em nota, a defesa do médico informou que as denúncias são de conhecimento do neurologista, que, “desde o início, têm adotado todas as providências legais cabíveis para o esclarecimento do caso”.
“O médico nega as acusações que lhe foram imputadas e tem mantido postura transparente e colaborativa perante as autoridades competentes, sempre com respeito à Justiça, à verdade dos fatos e às partes envolvidas”,
afirma.
Ainda, segundo a nota, como “demonstração de compromisso com a lisura da apuração, o médico
afastou-se, totalmente, das funções profissionais relacionadas aos episódios sob investigação, visando preservar a integridade do processo e assegurar um ambiente isento e sereno para o seu curso”.
“O investigado já prestou esclarecimentos formais à autoridade policial, apresentou documentos relevantes, indicou testemunhas e sugeriu diligências capazes de comprovar a regularidade de sua atuação profissional”,
completou.
A defesa finalizou afirmando que “confia plenamente na atuação responsável das instituições e na rigorosa
observância dos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa e da presunção de inocência – garantias essenciais à imparcialidade do sistema de Justiça e à proteção contra julgamentos precipitados”.
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