O ambulatório de saúde auditiva da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) registra fila de espera de mais de seis meses para a entrega de aparelhos auditivos. O dispositivo, que amplifica os sons, é usado por pessoas com perda de audição. Atualmente há 540 pacientes aguardando para receber o equipamento.
O aparelho auditivo é distribuído de forma gratuita pelo SUS (Sistema Único de Saúde) estadual. Na região, a Unicamp é referência para tratamento auditivo para pessoas que tiveram perda de audição. O tratamento ocorre por dois caminhos: com uso de aparelho auditivo externo ou cirurgia para instalar implante.
AUMENTO
Segundo a Unicamp, antes da pandemia, os pacientes esperavam cerca de um mês para receber o aparelho. Já atualmente, a fila de espera aumentou e as pessoas aguardam por pelo menos seis meses. Hoje são 540 aguardando para receber o dispositivo. Já para implante auditivo, a fila de espera tem 80 pessoas.
O médico otorrinolaringologista e professor da Unicamp Arthur Castilho explicou os motivos para o crescimento da fila de espera.
“Aconteceu basicamente que o covid-19 por si só já causa a perda de audição. Então teve aumento no número de pacientes. As prefeituras aqui em volta que disponibilizavam aparelhos de audição agora estão comprando menos, então tem mais pacientes vindo para cá. Também tem a espera de pacientes que perderam a capacidade econômica, perderam o emprego, não têm mais como comprar e agora usam o sistema público. Então isso fez com que a fila de espera aumentasse bastante”, explicou.
Com o aumento de pacientes aguardando, a universidade fez um pedido Ministério da Saúde, solicitando a ampliação do teto para a disponibilização dos aparelhos. Segundo a Unicamp, atualmente o teto financeiro permite a entrega apenas de 2,2 mil aparelhos por ano. Ou seja, como a maior parte dos pacientes usam os equipamentos nos dos ouvidos, o hospital só pode atender 1,1 mil pacientes.
“No sistema de saúde ninguém deveria esperar nada. Especificamente nesse ponto, ficar com perda de audição leva a pessoa a perder a capacidade de comunicação, faz a pessoa se isolar, aumenta a chance de depressão e mais recentemente a gente sabe que pessoas que têm perda de audição e não usam o aparelho ou o implante coclear têm uma chance maior de ter Alzheimer e demência. Então tem muitos motivos para que ninguém espere na fila e isso seja visto com importância”, reforçou o médico.
NA ESPERA
A dona de casa Luciana Silva é uma das pacientes na espera pelo aparelho. Há anos ela aguardava pelo dispositivo no sistema municipal, mas agora entrou na fila da Unicamp. Ela relata as dificuldades com a perda de audição nos dois ouvidos.
“É difícil, a gente fica nervoso, as pessoas ‘zoam’ com a gente, falando ‘você está surda? Não escuta?’ Ninguém quer passar por um problema desse, de não escutar. E muitas pessoas não reconhecem que você não responde porque não está escutando”, disse.
Emocionada, ela contou que está com uma grande expectativa pelo aparelho. “Tem que esperar, para poder escutar. Poder abraçar minha filha, minha netinha, que muitas vezes conversa comigo e eu não entendo direito o que ela fala. Vou esperar com muita ansiedade para por o aparelho”, disse.
IMPLANTE COCLEAR
Segundo o médico da Unicamp, o hospital também tem capacidade para aumentar os procedimentos de implantes cocleares, que são feitos por meio de cirurgia.
“Implante coclear hoje nós fazemos 120 cirurgias, mas temos capacidade para fazer até 500 no instituto novo, e temos a espera em cerca de 100 pacientes”, disse, citando que o aumento também foi pleiteado na unidade.
A microempresária Alessandra Aguirra conta que primeiro perdeu audição de forma parcial até deixar de ouvir completamente. Ela conseguiu voltar a ouvir com a cirurgia coclear e relata como foi a emoção.
“Da primeira consulta até a cirurgia foram 72 dias. Foi o tempo dos exames, que são vários, mas perceberam toda a necessidade e me encaminharam para a cirurgia. A primeira vez que ouvi a chuva novamente eu chorei, ouvir a voz do meu filho, não tem coisa melhor do que estar de volta ao mundo dos sons”, disse.
O QUE DIZ O ESTADO?
Em nota, a secretaria estadual de Saúde informou que tem uma linha de cuidados de saúde auditiva que inclui avaliação diagnóstica, tratamento e, se necessário, a prótese auditiva é concedida.
“A porta de entrada é sempre o Centro de Saúde e existe um fluxo até a concessão da prótese que passa por serviços de avaliação e por serviços ambulatoriais e conveniados da secretaria de saúde, como a Apascamp e a PUC-Campinas, que é quem entrega a prótese”, informou.
O Ministério da Saúde foi procurado pela reportagem, mas ainda não retornou.