A disputa entre senadores e o governo trava ao menos 60 indicações do presidente Jair Bolsonaro para cargos em agências, órgãos e embaixadas. Responsável por aprovar os escolhidos, o Senado bloqueia 46 indicados. Além deles, segundo o Estadão/Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) apurou, pelo menos mais 14 nomes já foram escolhidos e estão na Casa Civil para serem enviados ao Congresso. O impasse tem dificultado o trabalho de órgãos como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o Banco Central e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
Chamadas de “pacotão” no Planalto, as indicações não avançam porque há atrito entre “padrinhos”, incluindo senadores, ministros, integrantes do Centrão e o entorno do presidente. A divisão do “latifúndio” de cargos só deve ser resolvida após a reforma ministerial, no início de abril, e dependerá das escolhas de Bolsonaro para substituir os ministros que deixarão a Esplanada até o dia 2 para concorrer às eleições. O Senado quer indicar integrantes para as pastas.
De acordo com fontes, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), segura indicações há mais de um ano porque quer “dividir o bolo” de uma vez, para atender de forma “equilibrada” as alas que têm interesses nos cargos. O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, também defende, segundo apurou a reportagem, a negociação em bloco. Procurados, eles não se manifestaram.
Pacheco, que tenta consolidar apoio para ser reeleito no comando do Congresso, em fevereiro de 2023, é pressionado por senadores a cobrar do Planalto a troca de pessoas já indicadas. Há polêmicas em torno de nomes para a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e o Cade, entre outros.
Interinos no comando
Agências e órgãos reguladores atuam de forma desfalcada por conta da demora do Senado em analisar indicações. Uma das situações mais críticas é a da Agência Nacional de Águas (ANA), que é hoje dirigida por interinos.
A diretoria da agência é formada por quatro diretores e um diretor-presidente. Hoje, porém, a presidência é ocupada interinamente por Victor Saback, que foi nomeado para diretor, e quatro diretorias são ocupadas por servidores da agência que, por lei, assumem os cargos em caso de vacância. O presidente Bolsonaro já enviou quatro nomes para as diretorias da ANA, mas as indicações ainda não começaram a tramitar.
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) também tem vagas abertas há quase um ano. Em fevereiro, com o fim do mandato da conselheira Paula Farani, foi aberta uma segunda vaga no conselho. O Estadão/Broadcast apurou que o mais cotado hoje para ser indicado ao cargo é o advogado Victor Oliveira Fernandes, atual chefe de gabinete do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Outros dois nomes “correm por fora” e são citados por fontes que acompanham as negociações: o do presidente interino da ANA, Victor Saback, e da advogada Juliana Domingues, que foi secretária nacional do Consumidor na gestão de Bolsonaro e é assessora especial do ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres. Outras duas indicações para o Cade já estão no Senado desde meados do ano passado, mas ainda não foram aprovadas.
Já a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) completou em março sete meses com a diretoria incompleta, o que tem causado preocupação no setor regulado pelo órgão. O diretor-geral da agência, Rafael Vitale, não convocou até o momento diretores substitutos para ocupar as duas cadeiras que começaram a vagar em agosto do ano passado, iniciativa que, no entendimento de técnicos, contraria a Lei das Agências Reguladoras.
De agosto até o início de fevereiro, a diretoria realizou votações com apenas quatro diretores, das cinco vagas previstas. Vitale então teve à sua disposição o voto de Minerva nos casos de desempate. Esse poder foi decisivo para o diretor-geral fazer prevalecer seu entendimento em um dos casos de maior repercussão julgados pela ANTT recentemente, sobre as regras do mercado de transporte rodoviário de passageiros.
Dificuldades
Na avaliação da advogada Ana Frazão, ex-conselheira do Cade e especialista em Direito Público, a composição das agências têm como destinatário final o cidadão, “que é o titular do direito de ter uma regulação adequada, rápida e eficiente”. “A partir do momento em que os problemas de composição das agências começam a dificultar ou a criar embaraços para o exercício das suas competências legais, a maior prejudicada é a sociedade brasileira”, disse Frazão.
Ela lembrou que, em alguns casos, a falta de pessoal nesses órgãos cria problemas dramáticos, como dificuldades para em votações, o que acarreta a necessidade de utilização de mecanismos excepcionais, como voto de desempate.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.