SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ministro da Economia, Paulo Guedes, criticou a repercussão na imprensa e nas mídias sociais da defesa que fez, na quinta (17), de que sobras de restaurantes fossem destinadas a “mendigos e pessoas fragilizadas”, atrelando políticas sociais ao que chamou de “excessos” cometidos pela classe média.
Em rede social, o ministro disse lamentar o foco que a repercussão sobre o debate da fome, em um contexto de pandemia e as formas de combater o desperdício de alimentos, ganhou nas redes sociais.
“[Há] muito desconhecimento quanto a um conceito básico de segurança alimentar. Apenas em um contexto de total polarização política expressar ideias de auxílio aos mais necessitados [é possível que] seja motivo de ironia na imprensa e entre políticos”, escreveu, na conta do Twitter do ministério da Economia.
“O prato de um [membro de] classe média europeu, que já enfrentou duas guerras mundiais, são pratos relativamente pequenos. E os nossos aqui, nós fazemos almoços onde às vezes há uma sobra enorme. Isso vai até o final, que é a refeição da classe média alta, até lá há excessos”, disse na quinta.
“Como utilizar esses excessos que estão em restaurantes e esse encadeamento com as políticas sociais, isso tem que ser feito. Toda aquela alimentação que não for utilizada durante aquele dia no restaurante, aquilo dá para alimentar pessoas fragilizadas, mendigos, desamparados. É muito melhor do que deixar estragar essa comida toda”, afirmou.
A declaração, que aconteceu durante o Fórum da Cadeia Nacional de Abastecimento, promovido pela Abras (Associação Brasileira de Supermercados), gerou críticas, sobretudo em um momento de alta dos preços dos alimentos e aumento da insegurança alimentar no país.
“Num momento em que o mundo passa por obstáculo sanitário, seria a hora de as pessoas se unirem para encontrar soluções sustentáveis, produtivas e humanas”, disse o ministro.
Segundo Rodrigo Afonso, diretor-executivo da ONG Ação da Cidadania, organização de combate à fome fundada por Betinho, a frase de Guedes é inaceitável e evidencia que o ministro “nunca sentou com uma família para saber o que é fome”.
Na nota no Twitter, Guedes afirma que se referiu na live à “sobra limpa”, em panelas de alimentos preparados nos restaurantes e não consumidos, e não aos restos no prato. “Arroz, feijão, frango, por exemplo, que em condições de higiene, temperatura e condicionamento, possam manter a qualidade do alimento.”
“Por que não utilizarmos disso para pessoas que precisam e queiram. Por que não pensarmos em polos que mantenham a qualidade da comida para consumo imediato?”, questiona o ministro.
O ministro, no entanto, não explicou como o governo faria para operacionalizar uma ação de doação de sobras de comida de restaurantes em grande quantidade.
No evento da Abras, o governo anunciou que vai criar um grupo de trabalho para avaliar proposta de flexibilização da regra que trata da validade de alimentos, adotando modelo para vendas abaixo do preço e doações a partir de determinado prazo.
O episódio dos pratos de comida é o mais recente de uma série de declarações polêmicas dadas por Guedes. Há pouco mais de um ano, ao comentar o dólar mais alto, ele disse que era preciso superar o patamar anterior da moeda. “[Era] todo mundo indo para a Disneylândia, empregada doméstica indo para a Disneylândia, uma festa danada.”
O ministro também já criticou o Fies (programa voltado para o financiamento do ensino superior), ao dizer que o filho de um porteiro do seu prédio supostamente havia sido aprovado com nota zero.
“Houve excessos no Fies. É verídico. O porteiro do meu prédio um dia me falou ‘doutor Paulo, meu filho fez vestibular para uma faculdade privada, e olha a carta que recebi’. A carta dizia ‘parabéns, o senhor foi aprovado com média…’ e tinha um espaço. E no espaço a média zero”, disse à época.
Em outras ocasiões, ele também chegou a dizer que “as pessoas destroem o ambiente para comer”, que “o chinês inventou o vírus [da Covid-19]”, reclamou que “todo mundo quer viver, 100, 120, 130 anos” e reforçou uma ofensa feita à mulher do presidente da França, Emmanuel Macron.