Kamilla Cardoso sempre alimentou o sonho de fazer carreira no basquete americano. Aos 20 anos, a brasileira de Montes Claros-MG tem a WNBA (liga de basquete feminino dos EUA) como principal objetivo. Conquistas recentes e números impressionantes favorecem a mineira e permitem que seu sonho esteja mais próximo de ser realizado. Nos Estados Unidos, ela já é conhecida.
No início deste mês, Kamilla foi campeã da NCAA, a principal divisão do basquete universitário do país. A pivô liderou a equipe da Universidade da Carolina do Sul (South Carolina Gamecocks) na vitória sobre Uconn Huskies, de Connecticut, por 64 a 49 na decisão do torneio. Com a vitória, a mineira de 2,01m se tornou a primeira brasileira a erguer o troféu. Foram quatro pontos e três rebotes na final.
Considerada uma das mais promissoras jogadoras do Brasil, Kamilla Cardoso se mudou para os EUA aos 15 anos. Nestes cinco anos atuando por lá, a pivô mostrou qualidades para ser apontada como a grande estrela da nova geração da seleção brasileira. Ao Estadão, ela disse que sua maior dificuldade em adaptação aos EUA foi aprender a falar inglês, mas entende não ter tido problemas por ser brasileira e buscar espaço no país.
“Não acho que tive grandes desafios por ser brasileira e estar jogando basquete nos EUA. O meu único desafio foi me mudar para lá ainda muito nova. Eu tinha apenas 15 anos, não sabia falar inglês, não sabia falar nada, só ‘Hi’. Nos meus primeiros meses, foi muito difícil me comunicar. Também tive muita saudade da minha família. Mas não foram empecilhos para eu jogar basquete”, disse Kamilla.
A brasileira sabe da relevância de sua conquista em uma modalidade que os americanos dominam. Mesmo tendo uma carreira completa pela frente, o troféu levantado tão jovem dá visibilidade à modalidade e abre portas para jovens e crianças que queiram se espelhar na mineira para alavancar a modalidade.
“Eu entendo que minha conquista na NCAA é muito importante para mim e para várias pessoas do Brasil, porque acabo incentivando meninos e meninas. Fico muito feliz por estar proporcionando isso para as pessoas”, iniciou Kamilla. “Também estou muito contente por ser a primeira brasileira a chegar à final NCAA. Espero continuar incentivando a todos a seguir em frente, não desistir dos seus sonhos, seguir lutando. É preciso acreditar nos seus sonhos, e você será capaz de conquistá-los.”
O basquete brasileiro tem sofrido com diversos problemas há anos. Para além da desorganização política, apontada por muitos anos como o grande fator para não haver desenvolvimento esportivo da modalidade, a falta de investimento nas categorias de base impede que times locais e a seleção consigam captar importantes talentos.
Kamilla é um exemplo comum do que acontece no basquete local. Ela foi para os EUA e sonhava com tal objetivo porque sabia que no Brasil dificilmente conseguiria espaço e projeção. Mesmo entendendo não ter sido fator determinante, a pivô aponta a falta de valorização do esporte como um pressuposto que orientou sua decisão de sair do País.
“Eu acho que a falta de investimentos no basquete não teve tanto peso na minha decisão. Meu sonho sempre foi jogar basquete nos EUA, porque já sabia que o esporte não era tão valorizado no Brasil. Mas acho que não interferiu tanto. Meu sonho era jogar no ‘high school’, no ‘college’ e depois ir para a WNBA, e atuando no Brasil isso não seria possível”, esclareceu.
Kamilla Cardoso defendeu o Hamilton Heights Christian Academy, do Tennessee, no chamado ‘high school’, que equivale ao Ensino Médio no Brasil. Seu bom desempenho gerou disputa entre as Universidades da Virgínia Ocidental e Mississippi. A mineira optou por ir a Syracuse, onde fez história. Em uma vitória sobre Boston College, Kamilla fez 24 pontos e somou sete rebotes, convertendo 10 de 11 arremessos, o que lhe alçou à segunda melhor marca de uma jogadora de Syracuse na história do basquete feminino.
Por um pedido da multicampeã olímpica e mundial Dawn Staley, South Carolina foi buscar Kamilla Cardoso. A treinadora ficou encantada com o desempenho da brasileira e fez questão de tê-la em sua equipe da NCAA.
Kamilla já serviu a seleção brasileira em duas ocasiões. No entanto, é comum que com o desenvolvimento da carreira, jogadores de basquete abandonem o sonho de vestir verde-amarelo para se dedicar exclusivamente à liga mais importante do mundo. A mineira, por sua vez, nega que dará preferência à WNBA, quando lá estiver, e reitera a vontade de defender a seleção do seu país.
“Jogar na seleção deve ser o sonho de qualquer atleta brasileiro, seja homem ou mulher. Já fiz duas participações na seleção, uma na AmeriCup e outra no Pré-Mundial. Eu tenho muito interesse de continuar representando o nosso País. Atuar na WNBA é meu desejo desde os 11 anos de idade”, contou Kamilla, que também analisou a gestão do basquete brasileiro e elogiou José Neto, treinador da seleção desde 2019.
“A chegada do José Neto tem ajudado muito na abertura da seleção para garotas jovens como eu. Ele está abrindo portas para o futuro”, introduziu Kamilla antes de valorizar a presença da histórica jogadora brasileira Magic Paula em cargo de direção da Confederação Brasileira de Basquete. “Acho muito importante ter a Magic Paula como vice-presidente da CBB. Ela já esteve em muitas competições com a seleção, foi campeã e sabe como funciona e como manusear as situações. A Paula também passa muita confiança para as garotas e ajuda em tudo o que é preciso. É muito legal tê-la nessa posição.”