NATAL, RN (FOLHAPRESS) – “Já estou em casa. Vou começar a treinar mais tarde. As coisas começam tudo do zero de agora em diante. Agora é pensar nos próximos desafios. É nós! Já, já papai vai surfar.”
O sol não havia nem nascido nesta sexta (30) quando Ítalo Ferreira, primeiro medalhista de ouro do Brasil nos Jogos de Tóquio, entrou na casa dele em Baía Formosa (RN), cidade onde nasceu e pegou as primeiras ondas. Poucas horas depois já estava no mar, surfando sob o olhar admirado dos conterrâneos.
O campeão olímpico desembarcou em sua terra natal durante a madrugada para, segundo ele, evitar aglomerações, uma preocupação diante do risco de contaminação por Covid. E já estava com roteiro definido: “Vocês vão me ver na praia. Estarei surfando em algum lugar”, disse Italo nas redes sociais.
É entre falésias e ondas da praia na qual deu os primeiros passos no esporte -no início, por falta de recursos, usava tampas de caixas de isopor como prancha- que o surfista vai se preparar para a próxima etapa do Circuito Mundial de Surfe, entre 10 e 20 de agosto, em Barra de la Cruz, no México.
A ideia de Italo é ficar “três ou quatro dias” com a família e treinar –sem desfile pelas ruas da cidade ou eventos para exibição da medalha de ouro que carrega com orgulho no peito.
Será um cenário bem diferente do de 2019, quando conquistou o título da WSL (Liga Mundial de Surfe). À época, cruzou as ruas de Baía Formosa com o troféu em um caminhão do Corpo de Bombeiros, seguido por crianças e adultos. Em São Paulo, primeira parada no retorno ao Brasil, Italo disse, na tarde desta quinta-feira (29), ter ficado impressionado com a reação dos brasileiros após a vitória no Japão.
Para o surfista, é estranho receber tanto reconhecimento. “Não estava acostumado. Tem realmente outro público agora, que quer saber um pouco mais do que eu faço, como eu vivo”, afirmou o campeão olímpico.
Homenagens nas redes sociais e mensagens de pessoas do país inteiro o deixaram “em choque”. “Você leva uma bandeira, você leva uma nação com você”, acrescentou sobre o carinho que tem recebido.
Em Baía Formosa, o surfista é inspiração para crianças e adolescentes que sonham conquistar troféus e, agora, medalhas. Em um projeto local que oferece aulas gratuitas de surfe para crianças e adolescentes filhos de pescadores ou de desempregados, o número de participantes dobrou em um ano e meio.
“Há um efeito Ítalo na cidade”, diz a pedagoga e empreendedora social Barbara Arenhaldt, que fundou em 2017 com o marido, César, o Projeto Swell. “Todos querem ser iguais a ele”, afirma.
A dona de casa Vanizia Souza, 37, sente esse efeito dentro de casa: os cinco filhos, de 11 a 19 anos, inspiram-se no conterrâneo nas ondas que pegam em aulas e competições no Brasil.
“Quem acompanhou toda a trajetória do Italo desde que ele era criança tem conhecimento do esforço, do foco que ele sempre teve praticando surfe. Sendo assim, qual surfista não se inspira nele?”, diz Vanizia. “Italo se tornou espelho e exemplo de dedicação para todos.”
No Japão, o campeão olímpico abocanhou a medalha de ouro após superar o anfitrião Kanoa Igarashi. A conquista se deu na estreia do surfe em Olimpíadas e foi definida por Ítalo como gigantesca. “Todos os surfistas que competiram em Tóquio têm um pedaço dessa história. Foi uma história linda, que Deus escreveu da melhor forma possível.” Na primeira postagem publicada em uma rede social nesta sexta-feira, já em casa, a referência divina mais uma vez apareceu: “O que Ele abrir ninguém conseguirá fechar.”