TÓQUIO, JAPÃO (FOLHAPRESS) – Quando Ahmed Hafnaoui passou ao lado da piscina no Centro Aquático de Tóquio, outros nadadores, treinadores e funcionários das Olimpíadas que ocupavam as arquibancadas se levantaram para aplaudi-lo. Alguns fizeram gesto de quem saúda a realeza, com os braços erguidos para cima e para baixo.
Sua reação foi sorrir e levantar a mão que segurava o buquê de flores dado aos que sobem no pódio.
O tunisiano de 18 anos havia acabado de protagonizar uma das maiores zebras da história dos Jogos. Classificado com o oitavo tempo entre os oito finalistas, ele venceu os 400 m livre com o tempo de 3min43s36. Na qualificação, ele havia feito 3min45s68. Neste ano, antes da viagem a Tóquio, seu melhor resultado era 3min49s36.
Na saída da piscina, em entrevista a uma emissora de TV que tem os direitos de transmissão, a produtora pediu para Hafnaoui confirmar como era a pronúncia do seu nome. Ele obedeceu. Duas vezes.
“É uma coisa que eu não consigo acreditar. Ainda estou meio perdido. Já ouvi que sou herói nacional. Não sei o que dizer. Eu tinha a ambição de chegar aqui e conseguir um bom resultado. Mas isso… É a sensação mais incrível da minha vida”, disse o nadador à reportagem, ao passar pela zona de imprensa.
O fato de ele ter se classificado para a final já foi considerado uma surpresa. Seu resultado mais expressivo até então havia sido o oitavo lugar na mesma prova nos Jogos Olímpicos da Juventude de Buenos Aires, em 2018.
Assim que terminou a competição em Tóquio, ele afirma ter pressentido que algo especial havia acontecido, mas não queria comemorar antes da hora. Por via das dúvidas, olhou para o placar. Viu seu nome na primeira posição e começou a gritar. Apontou para as cadeiras onde estavam integrantes da equipe tunisiana e seu técnico.
“Nunca ninguém se sentiu tão orgulhoso. Estou ansioso para falar com as pessoas na Tunísia e ver como estão felizes lá por esse resultado. Quero voltar logo para me divertir com meus amigos”, disse.
Em alguns momentos, Hafnaoui tinha problemas para dar respostas coerentes. Talvez tenha se atrapalhado com as questões em francês (sua língua nativa) e o inglês, em que demorava mais para emendar uma palavra na outra. Mas o que ele parecia mesmo era estar aéreo. Quase foi embora levando uma caixa em que estavam telefones celulares de jornalistas que gravavam suas declarações.
Foi a quinta medalha de ouro olímpica na história do esporte tunisiano. Desde 1960, o país não participou apenas dos Jogos em Moscou, em 1980.
Com o resultado deste domingo (25), Hafnaoui se aproxima da marca do seu ídolo, o nadador Oussama Mellouli, vencedor dos 1.500 m livre em Pequim-2008 e da maratona aquática de 10 km em Londres-2012.
O tunisiano abriu largo sorriso quando foi questionado sobre a técnica que utilizou para chegar à vitória que ninguém esperava. Pela sua reação, nem ele.
“Não tenho nem cabeça para explicar a prova, o que fiz ou não fiz. Eu só pulei na água e nadei o mais rápido que pude”, tentou explicar.
Durante todos os 400 metros, ele estava entre os três primeiros e parecia que surpreenderia ao ficar com o bronze ou até a prata. Nos 50 metros finais, passou a disputar a liderança com o favorito Jack McLoughlin, da Austrália. A zebra venceu por 0s16.
Ahmed é filho de Mohamed Hafnaoui, jogador de basquete que defendeu a seleção da Tunísia. Aos 12 anos, o garoto entrou no programa para revelar talentos mantidos pela federação de natação do país africano.
Na conversa com a reportagem, três vezes ele disse “obrigado” como forma de encerrar a entrevista.
“Preciso ir. Quero ligar para meus pais, eles devem estar tão felizes e orgulhosos que preciso falar com eles.”
Mas cabia uma última tentativa para tentar saber como o garoto de 18 anos, sem resultados expressivos anteriores e que já havia dito almejar uma medalha apenas em Paris-2024, havia chegado ao ouro em 2021.
“Não fiz nada que não vinha fazendo. Simplesmente aconteceu.”
Ahmed Hafnaoui agradeceu pela quarta vez e foi embora, com a medalha no pescoço, mas a segurando com a mão direita, para não deixá-la escapar.