SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após enfrentar dificuldades de preparação, quando chegou até a morar em um trailer, Rodolpho Riskalla, 36, conquistou nesta quarta-feira (26) a medalha de prata no hipismo adestramento classe IV (para cavaleiros com um ou mais membros debilitados ou algum grau de deficiência visual) nas Paralimpíadas de Tóquio-2020.
O brasileiro, que montou Don Henrico, obteve a pontuação de 74,659 em sua apresentação. Foi a oitava medalha brasileira no Japão, a primeira no hipismo.
O ouro ficou com a holandesa Sanne Voets, com a montaria Demantur, com 76,585. O bronze com a belga Manon Claeys, com 72,853 pontos.
Na final, ele contou com a torcida da mãe, Rosangele, que é sua treinadora, e da irmã, Victoria, ex-atleta de adestramento. Mas o cavaleiro nem reparou.
“Na realidade não absorvo muito o que está acontecendo em volta. Tento absorver o que está acontecendo ali com o cavalo. Não pude treinar nenhum dia dentro da pista [das Paralimpíadas de Tóquio], mas conheço o cavalo. E ele foi relaxando durante a apresentação”, contou Riskalla, em entrevista ao SporTV.
O ciclo paralímpico de Riskalla foi cheio de dificuldades após os Jogos do Rio, em 2016. Em primeiro lugar, ele teve que aposentar a antiga montaria após o evento no Brasil. Ficou um ano sem um cavalo.
Em julho de 2017 conseguiu Don Henrico, que pertence à ex-amazona alemã Ann Kathrin Lisenhoff, 61, campeã olímpica no adestramento por equipes em Seul-1988.
Começou, então, a preparação para os Jogos Equestres Mundiais de Tryon (Estados Unidos), em 2018, e para as Paralimpíadas de Tóquio, originalmente marcadas para 2020.
No Mundial, a parceria funcionou muito bem. Riskalla ganhou a prata no individual e no individual estilo livre, ambos na classe IV.
Aí veio a pandemia. Para poder treinar na França, onde reside, ele chegou a morar durante dois meses em um trailer com a mãe e a irmã após o fechamento do Polo Club, em Paris. Com isso, viveu a 60 km ao sul da capital para continuar os treinos em um haras de uma amiga.
Com a reabertura das fronteiras, ficou entre a França, onde trabalha na grife Christian Dior, e a Alemanha, país que usou para a reta final de preparação para os Jogos.
Originalmente, Riskalla competia no adestramento para atletas sem deficiência. Em 2014, decidiu encerrar a carreira, após uma sequência de resultados decepcionantes.
Ele, que já trabalhava na Christian Dior em Paris, voltou ao Brasil em 2015, quando seu pai morreu. No país, viveu um drama: contraiu meningite bacteriana e chegou a ficar entre a vida e a morte.
“Estava muito doente. Eles me colocaram em coma para que pudesse respirar. Meu coração e tudo estavam parando. Estive em coma por quase três semanas ” contou o brasileiro, em entrevista ao site da FEI (Federação Equestre Internacional).
“De alguma forma, consegui sobreviver. Disseram que provavelmente foi porque estava bem de saúde [antes da doença]. Mas minhas mãos e as pernas sofreram muito”, acrescentou.
Como seu seguro médico era da França, Riskalla voltou a Paris, onde teve que amputar a parte inferior das pernas, a mão direita e dois dedos da mão esquerda.
Parecia o fim da linha. Mas o esporte mostrou a ele novos caminhos. Riskalla voltou a treinar adestramento em janeiro de 2016, cinco meses após as cirurgias de amputação, com um cavalo emprestado.
“É importante ter metas. Sonhava participar dos Jogos Olímpicos. Mas então pensei: ‘Por que não as Paralimpíadas?’ Minha mãe me disse: ‘Tudo bem, você tem quatro anos para conseguir se classificar’. E eu disse a ela: ‘Não, quero ir para as Paralimpíadas neste ano'”, contou o cavaleiro.
O sonho se tornou realidade meses depois. Nos Jogos Rio-2016, competindo na classe III, ficou em 10º no individual e 7º por equipes. Cinco anos depois, em uma categoria mais competitiva, conseguiu subir ao pódio paralímpico.
“Sempre quero mais. Quero vencer, ser o melhor. Sempre fui assim. Foi assim que passei por isso, porque consegui me adaptar. Adaptabilidade é a palavra-chave, e forçar um pouco seus próprios limites. Todos nós temos mais força do que pensamos ter”, ensina o cavaleiro.