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Lazer e CulturaNegligência com Cinemateca é criminosa, afirma ex-presidente da instituição

Negligência com Cinemateca é criminosa, afirma ex-presidente da instituição

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RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Diretor da Cinemateca Brasileira entre 2002 e 2013, o administrador Carlos Magalhães viveu o que ele chama de “fase áurea” da instituição. Durante todo aquele período, contou com orçamento de aproximadamente R$ 170 milhões, dos quais R$ 20 milhões foram repassados diretamente pelo governo e os outros R$ 150 milhões foram captados via renúncia fiscal e convênios com o extinto Ministério da Cultura.

Nesta quinta, um incêndio atingiu um depósito da instituição, no bairro da Vila Leopoldina, na zona oeste de São Paulo. Isso após especialistas já terem alertado sobre a possibilidade.

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“Nasceu como fundação de direito privado e foi incorporada ao governo federal no início dos anos 1980, por iniciativa do designer pernambucano Aloísio Magalhães, que foi secretário de cultura do Ministério da Educação e Cultura e diretor do Iphan [o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional] e morreu logo depois. A ideia era ser um braço do Iphan, cuja concepção foi idealizada por Mário de Andrade”, relata Magalhães.

Aos 62 anos, o ex-diretor, que talvez seja o que ocupou o cargo por mais tempo, lamenta que o órgão tenha se transformado em “prêmio de consolação”, comenta a atual situação —”delicadíssima, de más condições técnicas a falta de orçamento”— e afirma que nem Regina Duarte nem Mario Frias têm qualificação para o posto.

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Pergunta – Qual o tamanho da instituição como equipamento cultural?

Carlos Magalhães – Ela equivale ao que é a Biblioteca Nacional, só que em termos de audiovisual. Guarda a memória da produção do país. Tem uma responsabilidade muito grande, que é a de preservar o material produzido pela classe artística, além de abrigar e cuidar desses materiais. É uma instituição que tem viés técnico, uma vez que preserva diversas mídias, desde a película até o digital. É um acervo da nação, cuja propriedade física pode até ser de um sujeito ou de uma sociedade sem fins lucrativos, mas seu conteúdo pertence à sociedade.

P. – Qual é o seu papel no campo cultural e econômico?

CM – Difundir esse material, além de preservar. É comum usar imagens de arquivos para novas produções. Nos primórdios da história do cinema brasileiro, incluindo a fase pré-cinema, a gente perdeu muita coisa antes de a Cinemateca existir. Foi com ela que veio essa consciência e necessidade de preservar, tanto pelo valor cultural como pelo valor econômico.

P. – O que de mais precioso guarda a Cinemateca?

CM -Tem os filmes mais antigos, coleções de cinejornais, um acervo incrível da extinta TV Tupi de telejornal, preciosidades em película e acervos digitalizados, além de documentação, livros, roteiros, fotografias. Estamos falando de uma instituição complexa, com a documentação da extinta Embrafilme. Riquíssima em termos de informações de como e quanto custava tudo, o audiovisual e todas as atividades correlatas.

P. – Há algum tempo, a Cinemateca Brasileira enfrenta uma situação delicada, sofrendo com más condições técnicas e falta de orçamento. Vem de quando este descaso?

CM – A situação da Cinemateca hoje tem mais de um responsável, talvez a primeira [crise] foi com a atitude de Marta Suplicy enquanto ministra da Cultura, que destituiu uma direção e não fez nada para ocupar aquele lugar depois, desrespeitando sua autonomia. Em seguida, vieram outros ministros, Marcelo Calero, em 2016, e Sérgio Sá Leitão, em 2017.

P. – Em entrevistas, você disse, e chegou a repetir, que em sua gestão, entre 2002 e 2013, o órgão viveu sua fase áurea. A que você atribui isto?

CM – A Cinemateca ganhou mais visibilidade, verbas e equipamentos modernos. Relatórios de preservação e difusão mostram o quanto ela se equipou nesse período, se comunicou com o mundo externo, se conectou a outras visões cinematográficas, ao intercâmbio.

P. – Se nos dois meses enquanto secretária especial de Cultura, Regina Duarte não demonstrou muita presença, o que esperar do seu colega Mario Frias?

CM – Sou muito cético e, do ponto de vista de alguma racionalidade, é para a gente cortar os pulsos e não esperar nada. Mas sei lá, vai que o sujeito que deu o presente entregou um cheque junto. Torci para que dessem para Regina Duarte recursos, e que ela tivesse humildade de convidar pessoas que entendessem da questão para auxiliar, pois, pelo que a conheço, ela não tem uma formação que a qualifique para isso. Vale lembrar que, como atriz e personalidade do audiovisual brasileiro, ela tem parte da sua história ali, o que, por si só, não a qualifica para o cargo.

P. – Uma carta aberta afirma que, além de não ter recebido em 2020 nenhuma parcela do orçamento anual —no valor de R$ 12 milhões—, a Cinemateca vem passando por processo de enfraquecimento institucional e, ainda, está com acervo em perigo por causa não somente de sucessivos incêndios ocorridos em sua estrutura nos últimos anos, mas também uma enchente ocorrida no ano passado. Qual a dimensão desta possível perda?

CM – Primeiro que é um absurdo não receber um aporte tão pequeno dentro do orçamento público. A Cinemateca precisa de energia para manter o acervo a salvo. Esse valor é, no mínimo, duas vezes e meia menor que o de uma instituição como a Pinacoteca, por exemplo. Estamos falando do básico. Ela cuida de acervo que está sob a guarda dela, mas que não pertence a ela. Pertence a qualquer um, ao cineasta que pretende utilizar uma imagem de arquivo para realizar seu filme.

P. – Qual é a função da Sociedade Amigos da Cinemateca?

CM – Tem quase 50 anos de serviço prestado, com envolvimento de acadêmicos e intelectuais. Mas foi excluída de seu papel em 2013, transformando-se em uma organização social com a responsabilidade diminuída de gerir a Cinemateca.

P. – Olhando para o que deu certo e errado, que caminhos a Cinemateca deveria seguir?

CM – O da difusão do que é preservado. Sempre bati nessa tecla, firmando parcerias com cinematecas de outros países, como Portugal e Dinamarca.

Lembro um fato que marcou a história da Cinemateca, que foi a restauração do filme “Limite”, de 1930, escrito e dirigido por Mário Peixoto em 2010, sob a responsabilidade de Saulo Pereira, a cargo da Cinemateca com recursos da Film Foundation [entidade fundada e presidida por Martin Scorsese].

Um músico norueguês se apaixonou pelo filme, uma das obras-primas do cinema brasileiro, e chegou a compor uma trilha, apresentada durante uma exibição para 1.500 pessoas na Noruega, com a participação do baixista Rodolfo Stroeter e do percussionista Naná Vasconcelos. Depois repetimos a performance em São Paulo.

P. – Quem você nomearia para o cargo que já foi seu?

CM – Carlos Augusto Calil, professor do departamento de cinema da USP, um tremendo gestor e que já foi diretor da Cinemateca, conhece de cima a baixo. Também foi secretário municipal de Cultura, um intelectual preparado para o cargo.

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