BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Ao entrar de vez na campanha de seus candidatos às presidências da Câmara e do Senado, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se desgasta com partidos que, nos dois primeiros anos de governo, votaram junto com o Palácio do Planalto.
Por causa dessa atuação, líderes partidários avaliam que, mesmo com a vitória de seus apadrinhados, o presidente terá dificuldade para emplacar pautas bolsonaristas, promessas de campanha e parte da agenda econômica.
Bolsonaro tem feito apelos diretos a bancadas em favor de Arthur Lira (PP-AL), candidato do governo a comandar a Câmara, e também já declarou apoio ao senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que concorre à presidência da Casa.
Os principais adversários deles são do MDB: o deputado Baleia Rossi (SP), que é presidente do partido, e a senadora Simone Tebet (MS).
O MDB foi uma das siglas que mais votaram com Bolsonaro, embora não tenha integrado a base do governo. O mesmo acontece com DEM, PSDB e Cidadania.
Como a disputa tende a ser acirrada, integrantes desse grupo de partidos acreditam que, se Lira e Pacheco vencerem, será com votos da oposição, inclusive membros do PT. Portanto, a eleição dos candidatos de Bolsonaro em fevereiro não representa a base dele nas Casas. O voto, nesse caso, é secreto e, como reforçam parlamentares, não representa compromisso com a agenda do governo.
A pauta de costumes deve ser a que mais sofrerá resistência no Congresso após o desgaste de Bolsonaro com siglas de centro. Mas projetos econômicos, como privatizações, também podem ter mais dificuldade que antes, na avaliação de congressistas.
Bolsonaro quer, por exemplo, aprovar uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que cria o voto em papel para auditar a urna eletrônica, a PEC do voto impresso. Mas essa ideia precisa do voto de 60% da Câmara (308 votos) e do Senado (49 votos). O mesmo quórum é exigido para redução da maioridade penal, defendida pelo presidente.
Mas parlamentares citam ainda dificuldade para aprovar projetos de lei, que exigem menos votos, como ampliação das causas excludentes de ilicitude (alívio a punição de policiais que matassem em serviço), medidas de enfraquecimento dos meios de comunicação, flexibilização do porte de armas e a regulação do ensino domiciliar.
O Planalto aposta na vitória de Lira para avançar com essas propostas na Câmara. Mas aliados do candidato dizem que não há compromisso de voto nessas pautas nem acordo para que Lira busque maioria para aprová-las.
“O cenário vai ficar muito mais fragmentado daqui em diante. Cabe ao governo articular e convencer os deputados para aprovar projetos de interesse do presidente”, disse o líder do Solidariedade na Câmara, Zé Silva (MG), que apoia Lira.
A cisão entre as siglas de centro também é vista como um entrave a pautas bolsonaristas por integrantes de PP, PL e PSD, que compõem o entorno de Lira e o centrão –grupo de legendas que se aproximaram do governo após a liberação de cargos e emendas.
No caso das reformas econômicas, a avaliação é que a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, deverá perder o protagonismo nas negociações. As reformas tendem a ser mais modificadas pelos parlamentares.
No mês passado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), fez críticas à interferência do governo na eleição da Casa.
“Ele [o governo] está correndo risco de reduzir a grande maioria que tem na pauta econômica para tentar interferir na Câmara. […] E vai colocar em risco, sim, o ambiente de relacionamento com a centro-direita, que sempre votou a pauta econômica sem precisar de emenda, de cargos”, disse o presidente da Câmara.
Desde o ano passado, o Planalto atua com a promessa de emendas e nomeações em cargos públicos para atrair votos a Lira. A Câmara é a Casa onde a eleição está mais acirrada.
Nos últimos dias, Bolsonaro se reuniu pessoalmente com deputados aliados para articular em favor do candidato do PP. Além disso, cobrou a bancada ruralista por engajamento na campanha de Lira. Os ruralistas e a bancada evangélica devem se dividir na votação, pois a sucessão na Câmara é fortemente influenciada por questões partidárias.
O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), nega que haverá dificuldade em aprovar matérias prioritárias do governo.
“Não vejo problema de formação de maiorias. A base do governo é sólida. E o compromisso dos deputados com as reformas é muito forte”, afirma. Ele lembra que DEM e MDB, partidos que formalmente devem se alinhar a Baleia, sempre votaram com o governo em questões econômicas. No entanto, esses dois partidos têm mostrado maioria a favor de uma reforma tributária diferente da defendida pelo governo, por exemplo. Baleia é autor da PEC que reformula o sistema tributário, mas num modelo mais amplo que o defendido por Guedes.
Por isso, líderes dizem que, na agenda econômica, a divisão provocada pela campanha de Bolsonaro na eleição do Congresso deverá acirrar o movimento de protagonismo do Legislativo nessa área.
Para alguns dirigentes de partidos de centro, apesar da fragmentação das siglas na Câmara, o núcleo duro tanto de apoio a Lira como a Baleia não será hostil ao governo na pauta econômica.
A aprovação das matérias dependerá, porém, da popularidade de Bolsonaro, o que, creem parlamentares, tende a cair nos próximos meses.
No caso da tributária, por exemplo, com a divisão dos partidos, ficaria cada vez mais difícil para o governo tentar emplacar uma proposta que preveja a recriação de um imposto nos moldes da CPMF.
Orlando Silva (PC do B-SP) avalia que será difícil haver a formação de maiorias no Congresso. O deputado atribui a dificuldade em grande parte à forma como Lira tem tocado a campanha pela Câmara.
“Os ataques aos líderes vão criar ambiente de mais fracionamento no Congresso, é uma luta fratricida. É um ambiente que vai desqualificar ainda mais a política. Não vai ser simples a construção [política]”, diz.
Para Silva, Lira age como Bolsonaro ao desqualificar as direções partidárias. “A sequela dessa linha de campanha é a maior fragmentação dos partidos, as bancadas vão ficando ingovernáveis. Vai ter que ser criado um balcão do tamanho do mundo para que qualquer matéria seja aprovada na Câmara. Só a ideia não vai ser suficiente”, critica o deputado do PC do B.
Hoje, o bloco que apoia Baleia é formado por PT, PC do B, PSB, PDT, DEM, PSDB, MDB, Cidadania, PV, Rede e PSL.
Formalmente, o bloco de apoio a Lira é menor que o do emedebista, composto por PL, PSD, Republicanos, Avante, Podemos, Patriota, PSC e PROS. Outros partidos, como Solidariedade e PTB, ainda não tomaram uma decisão formal. E há siglas rachadas quase ao meio, como o PSL.
Para vencer, Lira e Baleia contam com dissidências. São necessários 257 do total de 513 para eleger quem comandará os deputados pelos próximos dois anos.
No Senado, a contabilidade é favorável a Pacheco, apoiado pelo atual presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
O bloco do mineiro é formado por DEM, PL, PP, PROS, PSC, PSD, PT, PDT e Republicanos, que reúnem os 41 votos necessários para vencer a eleição para a presidência da Casa –a maioria absoluta dos senadores.
O MDB, de Tebet, é a maior bancada do Senado, com 15 votos. E, apesar de não ter conseguido o apoio do presidente, é o partido dos líderes do governo na Casa e no Congresso, respectivamente Fernando Bezerra Coelho (PE) e Eduardo Gomes (TO).
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Bolsonaro assume risco de fragmentar base com disputas no Congresso
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