BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A eleição do democrata Joe Biden para a Presidência dos EUA fez o governo de Jair Bolsonaro adotar o discurso de ocupação militar da Amazônia como demonstração de força a outros países. A estratégia, porém, pode ficar só na retórica: o governo brasileiro deve ter uma menor presença de militares na região nos próximos dois anos.
A posição sobre mostrar ao mundo que a Amazônia não está abandonada foi externada pelo ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. Em um ofício enviado em 9 de dezembro à Câmara dos Deputados, para explicar a maior operação de simulação de guerra já realizada na região, em 2020, o ministro defendeu a estratégia.
“As operações militares realizadas na Amazônia evidenciam ao mundo que o Brasil tem se preocupado em estar presente nessa estratégica porção do território nacional”, disse o titular da Defesa.
Naquele momento, Biden já havia sido eleito presidente dos EUA. Cinco dias depois, o Colégio Eleitoral confirmou a vitória do democrata.
A posição do ministro da Defesa pode não encontrar eco na realidade. A reportagem apurou que duas das principais frentes de ocupação militar de espaços amazônicos devem refluir em 2021 e em 2022.
A Vice-Presidência da República informou à reportagem que a militarização da fiscalização de crimes ambientais na Amazônia não deve ser prorrogada, o que significa que ela deve ser encerrada em 30 de abril deste ano.
O vice-presidente, general Hamilton Mourão, preside o Conselho Nacional da Amazônia Legal, que é responsável pela execução da GLO (garantia da lei e ordem) decretada para a região amazônica.
Por meio dessa GLO, os militares passaram a empreender as Operações Verde Brasil 1 e 2. A primeira envolveu um efetivo de 9.700 militares e custou R$ 124,4 milhões. A segunda está em curso e se encerra em 30 de abril. Emprega 3.000 militares.
A Verde Brasil é uma tentativa de resposta do governo à escalada dos índices de desmatamento, queimadas e exploração de garimpo e madeira ilegais na Amazônia. Na prática, os militares escantearam a atuação de fiscais do Ibama.
Segundo a assessoria de Mourão, não há estudos para a renovação da GLO e a operação deve chegar ao fim em abril. O motivo, segundo a assessoria, são “limitações fiscais e orçamentárias”.
O Ministério da Defesa também não deve voltar a repetir operações de simulação de guerra com a dimensão do treinamento feito em setembro de 2020 –que recebeu o nome de Operação Amazônia.
“No tocante a uma comparação com a Operação Amazônia, não há previsão de exercícios desse vulto para os próximos dois anos”, afirmou a assessoria do ministério à reportagem, com informações fornecidas pelo Exército.
Em setembro, o Exército mobilizou 3.600 militares para simular uma guerra entre dois países, o Vermelho e o Azul. O primeiro invadiu o segundo, na simulação. A operação durou 15 dias, contou com a participação de militares de postos do Exército do país inteiro e empregou viaturas, aviões, helicópteros e balsas. Na simulação de guerra, houve lançamento de foguetes do sistema Astros do Exército, uma das apostas da Força em investimentos em armamento.
A operação de treinamento no Amazonas ocorreu no mesmo momento em que o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, visitava Roraima, região de fronteira com a Venezuela. Ele é um dos principais nomes do governo de Donald Trump. O chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, acompanhou Pompeo na visita, que foi duramente criticada.
Biden assume a Presidência dos EUA nesta quarta-feira (20). Ele é crítico da destruição da Amazônia e levou o assunto para sua campanha.
O então candidato afirmou que “a floresta tropical no Brasil está sendo destruída” e disse que se juntaria a outros países, se eleito, para oferecer US$ 20 bilhões à preservação do bioma. “Parem de destruir a floresta e, se não fizer isso, você terá consequências econômicas significativas”, afirmou na campanha. Bolsonaro criticou a postura de Biden, que chamou de “lamentável”.
O presidente brasileiro seguiu se colocando em posição oposta à do democrata. Bolsonaro se mantém ao lado de Trump mesmo após a invasão do Capitólio, por estímulo do republicano. O brasileiro foi um dos últimos a reconhecer a vitória do democrata e reproduz o discurso falso de fraude nas eleições nos EUA.
Em novembro, numa referência às críticas de Biden à política para a Amazônia, Bolsonaro chegou a dizer que “quando acaba a saliva, tem de ter pólvora”. A suposta ameaça de conflito bélico virou motivo de piada. E de contrariedade nas cúpulas militares.
O ministro da Defesa, no ofício que enviou à Câmara, a partir de um pedido de explicações por deputados do PT, disse que não há hipótese de conflito entre o Brasil e qualquer país da América do Sul, nem “ameaça de invasão do território nacional” ou “sinais de mobilização iminente de efetivos”. “As Forças Armadas devem se manter em permanente estado de prontidão para manter a inviolabilidade do território nacional.”
Os Comandos Militares da Amazônia e do Norte, do Exército, têm um efetivo de 29 mil pessoas. Os números têm se mantido constantes. A Aeronáutica tem um efetivo de 26 mil militares na região amazônia. Já o efetivo da Marinha é de 6.300, o maior nos últimos três anos. “A instalação de diversas unidades na fronteira e nos mais distantes rincões da Amazônia garante a presença brasileira e a soberania nacional, muitas vezes representando a única presença do Estado”, disse, em nota, o Ministério da Defesa.
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Com Joe Biden, governo Bolsonaro tenta demonstrar força na Amazônia
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