SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Polícia Militar de São Paulo deverá manter o afastamento do coronel Aleksander Lacerda, punido a pedido do governador João Doria (PSDB) por ter feito uma convocação para o ato bolsonarista do Sete de Setembro e uma série de críticas a políticos e ao Judiciário.
O policial comandava sete batalhões na região de Sorocaba, e tornou-se o mais graúdo oficial da ativa estadual a ser pego em redes sociais fazendo proselitismo pelo presidente Jair Bolsonaro, manifestação política vetada pelo regulamento.
Lacerda foi chamado a se explicar no Comando-Geral da PM na mesma segunda (23), logo após seu afastamento. O teor de seu depoimento não foi divulgado.
Pessoas ligadas à corporação, políticos e militares foram unânimes em avaliar o caso como solucionável apenas com a manutenção da remoção do comando, restando a dúvida se o PM irá pedir para ir à reserva ou se ficará em alguma função administrativa.
A última solução era a preferida pelo alto oficialato estadual, que lamentou o episódio mas ressaltou a interlocutores o currículo considerado exemplar do coronel. Mais: em um ambiente altamente corporativista, não quis ver generalizada a crítica ao topo da hierarquia.
Por outro lado, há o fantasma do caso Eduardo Pazuello. General da ativa, o ex-ministro da Saúde participou de um ato de apoio a Bolsonaro no Rio em maio. Deveria ter sido punido, pelas regras, mas o presidente insistiu em que ele fosse perdoado.
O Exército aquiesceu, mas o episódio nunca foi bem digerido pelo risco embutido de insubordinação e multiplicação de situações semelhantes. O presidente usa sua imagem de proximidade com militares e policiais sempre que pode, de forma a intimidar outros Poderes em seu embate institucional.
O novo capítulo da briga é justamente o 7 de Setembro, que bolsonaristas querem transformar num dia de apoio ao líder. O próprio Doria, rival do presidente e pré-candidato à sua cadeira em 2022, alertou outros govenadores de que o caso Lacerda poderia se repetir em outros estados.
No ano passado, Bolsonaro deu apoio ao motim da PM do Ceará, que desandou em violência. Neste ano, policiais recifenses atuaram sem ordens e atiraram em manifestantes contrários ao presidente.
Em São Paulo, a situação política foi repassada com o caso Lacerda e, por ora, a avaliação do Bandeirantes é de que foi algo isolado. Nem todos os aliados de Doria pensam assim, preocupados com confusão para o 7 de Setembro.
Entre eles houve também o temor de que a rapidez com que puniu o policial pudesse repercutir mal na tropa, mas a avaliação do campo político do governo é de que a situação está sob controle.
Estava presente o eco do afastamento de todos os 31 PMs envolvidos na operação de Paraisópolis, em dezembro de 2019, que deixou 9 mortos e 12 feridos. Doria foi bastante criticado nos meios policiais, e o caso é visto como estopim da saída do então comandante da força, Marcelo Vieira Salles.
O tucano tem um histórico turbulento em sua relação com as polícias estaduais, mas apostou em uma interlocução próxima. A cada 15 dias, ele se reúne com o secretário de Segurança, general da reserva João Camilo Pires de Campos, e os dois adjuntos da pasta os chefes da PM e da Polícia Civil.
No governo paulista, um foco de preocupação é a Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo). Estatal federal que o presidente vetou ser repassada a Doria, ela tem à frente o bolsonarista Ricardo de Mello Araújo, ex-comandante do batalhão de elite da PM Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar).
Lá, diversos ex-policiais têm se organizado. Bolsonaro inclusive já foi ao local para fazer ataques a Doria e pedir apoio dos presentes.
Tanto ele, que está na reserva, quanto Lacerda serão investigados pelo Ministério Público do Estado, em iniciativa proposta a partir da eclosão do caso do coronel de Sorocaba, revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo na segunda-feira (23).
Essa agitação de policiais encontrou eco nesta terça numa nota da Amebras (Associação dos Militares Estaduais do Brasil). Sua representatividade é duvidosa, mas a tese é clara: os governadores estão abaixo do Exército na ordem de subordinação das PMs.
A nota visa sustentar que governadores, e aí o alvo é Doria, poderiam ser desrespeitados. Ela ignora o artigo 42 da Constituição, que estabelece a subordinação estadual, e sugere que por serem forças auxiliares do Exército (artigo 144), as PMs podem ser mobilizadas contra inimigos a lei que rege a mobilização nacional, a 1.163/2007, só fala em ameaças externas.