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PolíticaEm gesto de boicote, senadores da CPI da Covid abandonam depoimento de defensores de tratamento ineficaz

Em gesto de boicote, senadores da CPI da Covid abandonam depoimento de defensores de tratamento ineficaz

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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A maioria dos senadores membros da CPI da Covid não compareceu ou mesmo abandonou a sessão desta sexta-feira (18) da comissão, que ouviu dois médicos defensores do tratamento precoce para a Covid-19, com medicamentos sem eficácia científica comprovada para a doença.

A sessão já havia começado com poucos senadores, muito diferente de todas as oitivas anteriores. O relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou que declinaria seu direito de fazer perguntas aos convidados e se retirou da sessão.

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Também saíram do plenário o vice-presidente, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), e outros senadores oposicionistas, como Humberto Costa (PT-PE). Entre titulares e suplentes, a CPI tem 18 membros.

Permaneceram apenas o presidente Omar Aziz (PSD-AM), que disse que garantiria que os convidados fossem ouvidos, e uns poucos senadores governistas, como Jorginho Melo (PL-SC), Marcos Rogério (DEM-RO), Eduardo Girão (Podemos-CE) e Luis Carlos Heinze (PP-RS).

Participaram da sessão como convidados os médicos Ricardo Ariel Zimerman e Francisco Cardoso Alves.

Em sua fala inicial, Renan criticou a declaração negacionista do presidente Jair Bolsonaro, que em transmissão ao vivo na quinta-feira (17) afirmou que a contaminação é mais eficaz do que a vacina contra Covid. A fala vai na direção das suspeitas da CPI, de que o governo adotou a tese da imunidade de rebanho.

“Eu sinceramente, em função desse escárnio, desse descaso, eu me recuso, mesmo como relator dessa comissão parlamentar de inquérito, a fazer qualquer pergunta aos expoentes, aos depoentes, com todo o respeito que eles tenham. Mas eu me recuso. Não dá para continuarmos nessa situação”, afirmou.

“A CPI tem o papel de dissuadir práticas criminosas, como essa do presidente da República. E ele continua a fazê-lo em desrespeito a uma instituição da República, que é a comissão parlamentar de inquérito, com poderes constitucionais, judiciais criada para investigar uma coisa cujos órgãos convencionais não estavam investigando. Isso não pode continuar”, ressaltou Renan.

O relator ainda afirmou que o Brasil deve atingir a marca demeio milhão de mortes por covid e que ainda se ouve “esse tipo de irresponsabilidade impunemente”.

“Chega. Nós precisamos dar um basta nisso tudo”, completou, para em seguida deixar a sessão.

Após a saída dos senadores independentes e oposicionistas, entraram em cena outros parlamentares que nunca ou raramente comparecem às sessões, como Styvenson Valentim (Podemos-RN), Nelsinho Trad (PSD-MS), Carlos Portinho (PL-RJ) e Roberto Rocha (PSDB-MA). Todos são mais alinhados ao governo Bolsonaro.

Os dois primeiros nunca haviam participado das sessões. Portinho e Rocha compareceram a apenas uma oitiva. O maranhense comparou os medicamentos com um paraquedas que não tem certificação do Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia).

“Se um avião estiver caindo, você vai ou não vai usar esse paraquedas?”, questionou Rocha.

Os senadores que permaneceram fizeram duras críticas a Renan por ter abandonado a sessão. Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) afirmou que apresentaria um requerimento para destituí-lo do cargo.

“O relator abandona a CPI, vai embora hoje, porque realmente parece que não interessa a busca pela verdade, apenas uma parte da verdade. A gente tem dito isso desde o começo da CPI. Hoje está claro, está explícito para o Brasil inteiro isso”, disse Girão.

“O que ficou evidente aqui é que o relator já tem uma sentença debaixo do braço. Se alguém tinha dúvida, hoje está evidente. Lamentável isso. Lamentável”, complementou Marcos Rogério.

Durante a oitiva, os convidados condenaram a politização envolvendo os medicamentos. Afirmaram que a decisão final sobre os tratamentos cabem aos médicos e aos pacientes e que muitos profissionais são estigmatizados e motivos de chacota por defenderem esses medicamentos.

Também acrescentaram que existem sim formas de tratamento precoce para a Covid-19 e que o grau de comprovação científica exigido por muitas associações não é aplicado para medicamentos usados em pacientes de outras doenças.

“Corticoide inalatório, para quem diz que não existe terapia precoce. O corticoide inalatório agora foi incorporado pelo SUS inglês, pelo National Health Service. Por quê? Porque é barato e reduz em 91% o risco de internar com Covid. Não é recomendado por nenhuma autoridade”, afirmou Zimerman.

“Quando a gente está com um paciente dentro da gente, na nossa frente, quem tem que dar satisfação para o familiar dele, se ele for mal, não é a Organização Mundial da Saúde, não é nenhuma sociedade, não é nenhum coletivo; somos nós. E nós fazemos isso com base na nossa autonomia na prescrição de medicações off label, que nos é garantida pela nossa autarquia, pelo CFM [Conselho Federal de Medicina]”, completou.

Alves, por sua vez, atacou as práticas de isolamento social, em especial a mais rígida delas, o lockdown. O médico afirmou que era um absurdo municípios, estados e país estarem atualmente fazendo a terceira ou quarta rodada de lockdown.

“[Tentei demonstrar] o absurdo que era municípios estarem fazendo o terceiro, quarto lockdown, países fazendo o terceiro, como Israel. E claramente essa prática não estava servindo pra conter o vírus, nem suas variantes, nem suas ondas”, disse.

“O motivo pelo qual algumas autoridades ainda insistem nessa prática, para mim, é desconhecido. Pode ser um mix de preconceitos concebidos sobre epidemias, pode ser um misto de desconhecimento sobre a dinâmica da Covid ou pode ser insistência no erro também. O fato é o seguinte: enquanto se continuar apenas pensando que lockdown vai ser a solução, a bala de prata para a solução da Covid no Brasil e no mundo, nós vamos continuar enfrentando esse problema.”

Único remanescente do grupo de independentes e oposicionistas na comissão, Aziz entrou em discussão algumas vezes com os convidados e os senadores. ​Em primeiro lugar, questionou falas envolvendo o estado que representa, o Amazonas, a respeito do impacto da segunda onda da pandemia.

Aziz criticou os médicos por terem participado da missão que propagou o tratamento precoce em Manaus no momento em que o estado entrava em colapso por falta de oxigênio, que resultou na morte de pacientes por asfixia.

“Eu acho que o problema da pandemia se agrava justamente por situações como estas que nós estamos tendo aqui na CPI: leigos, palpiteiros achando que conhecem alguma coisa de virologia e de transmissibilidade”, rebateu Marcos Rogério, dando início a uma discussão fora do microfone.

O presidente da comissão depois também acusou os depoentes de participar da tentativa de mudar a bula da hidroxicloroquina por decreto presidencial, o que foi negado pelos médicos.

“Isso é uma falta de respeito com os depoentes, o senhor acusar, virar para um cientista e dizer para ele que ele quis mudar a bula, está fazendo uma acusação”, disse Girão, que foi rebatido por Aziz.

“E daí? E daí? Quem é você para me chamar atenção aqui rapaz?”, respondeu o presidente da CPI.

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