SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um antigo líder do PP intensamente alvejado pela Lava Jato no auge da operação ressurgiu para a política na eleição municipal de 2020 e agora irá reconstruir sua carreira como prefeito no interior do Rio Grande do Sul.
José Otávio Germano, 58, se elegeu à Prefeitura de Cachoeira do Sul, município de 82 mil habitantes a 200 km de Porto Alegre, dois anos após fracassar na tentativa de se manter na Câmara dos Deputados, em meio à onda de renovação do pleito de 2018.
Ele ainda é réu em processo da Lava Jato no qual é acusado de receber dinheiro de empreiteiras com contratos na Petrobras.
A ação decorre de denúncia apresentada pela PGR (Procuradoria-Geral da República) em 2017, ano de ápice da investigação iniciada no Paraná, contra um grupo de congressistas do PP que incluía Arthur Lira (PP-AL), líder do centrão e hoje candidato à presidência da Câmara com o apoio do governo Jair Bolsonaro.
O trecho da acusação contra Lira foi rejeitado, enquanto as imputações contra Germano e outros três ex-deputados do partido receberam aval do STF (Supremo Tribunal Federal) para seguir tramitando.
Segundo o Ministério Público Federal disse à época, Germano era um dos integrantes do PP mais envolvidos com o esquema do partido na Petrobras, que tinha como pilar o então diretor Paulo Roberto Costa, mantido na área de Abastecimento da estatal com o apoio da sigla.
Em uma segunda acusação, o novo prefeito foi incluído, ao lado de Lira, na denúncia de organização criminosa contra o chamado “quadrilhão do PP”.
Sob os holofotes da Lava Jato, Germano se recolheu e pouco aparecia ou fazia manifestações públicas. Na eleição de 2018, teve um terço dos votos obtidos no pleito anterior e não se reelegeu deputado. Saiu da Câmara após quatro mandatos consecutivos.
Antes de deixar o cargo, pediu aposentadoria por invalidez no Congresso, rejeitada posteriormente pelo comando da Câmara.
Em 2018, quando ainda era deputado, viveu uma situação de constrangimento. O PP gaúcho decidiu afastá-lo de atividades partidárias por causa de um vídeo em que transexuais cobravam, em frente a seu prédio, um pagamento. O então parlamentar dizia que era alvo de extorsão e armação.
Quando parecia fadado ao ostracismo, resolveu neste ano apostar sua força política em seu reduto eleitoral, em contraposição a um prefeito desgastado que tentava a reeleição. Primeiramente, passou por prévias do partido.
Ex-cartola do Grêmio e de família de tradição política, teve como uma de suas vitrines as verbas de emendas parlamentares que destinou para a localidade por meio de obras.
Outro mote eleitoral foi o seu alegado conhecimento sobre órgãos federais e a obtenção de verbas em Brasília.
Em entrevista neste ano, disse ser amigo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), seu ex-colega na Câmara e no partido. Uma adversária chegou a afirmar que esse seria um método de política “do pires na mão”.
Germano contou ainda com a estrutura do PP no interior gaúcho, onde a sigla é tradicional e costuma ser campeã de prefeitos eleitos. Declararam apoio líderes como os senadores Luís Carlos Heinze (RS) e Esperidião Amin (SC), além da ex-candidata a vice-presidente Ana Amélia Lemos.
Sua condição de favorito alimentou ataques de adversários a respeito de seu histórico na Justiça e de um eventual dano à imagem da cidade.
“Eu não poderia nem ser candidato se não fosse ficha-limpa”, declarou o ex-deputado, em um dos debates.
Dizia que “toda a bancada do PP” tinha sido envolvida nas suspeitas levantadas pela Lava Jato e sempre negou irregularidades. Foi eleito com 31,7% dos votos válidos, ante 21,5% do atual prefeito, Sérgio Ghignatti (PL).
A reportagem procurou José Otávio Germano e pediu entrevista, mas não obteve resposta.
Ao tomar posse, na sexta-feira passada (1º), o novo prefeito disse que o retorno à política municipal, depois de décadas de carreira fora, foi vontade de Deus. Também prometeu uma gestão transparente e honesta.
“Não aceito corrupção. Quem souber, quem tiver notícia, de algo que não esteja dentro dos mais sagrados princípios éticos e morais, por favor, me fale ou fale para a cidade, de alto-falante”, disse, em discurso.
Uma de suas primeiras medidas no cargo agora foi ampliar o horário de funcionamento de restaurantes, limitado por causa da pandemia do coronavírus.
Além do processo criminal em tramitação, sua maior dor de cabeça na Lava Jato ainda é uma ordem de bloqueio de bens até o valor de R$ 11,8 milhões em ação civil de improbidade, ajuizada pela União, na qual é cobrada a devolução dos recursos supostamente recebidos no esquema na Petrobras. Nesse processo, Arthur Lira também é réu.
Nesses processos, pesa contra Germano o recebimento de doações de campanha da empreiteira Queiroz Galvão, em 2010, que seriam propina disfarçada decorrente do esquema na estatal, conforme apontado pelo doleiro Alberto Youssef, delator e articulador do caixa paralelo do PP.
O operador diz que o ex-deputado estava em uma lista de mesadas.
Em planilha de pagamentos de um auxiliar de Youssef constavam três entregas ao então parlamentar em 2012, totalizando R$ 200 mil.
A acusação criminal apresentada em 2017 foi inicialmente enviada do Supremo para a Vara Federal de Curitiba responsável pela operação quando o ex-deputado perdeu o foro especial, em 2019.
Posteriormente, os acusados conseguiram ordem no STF para transferir o caso para a Justiça Eleitoral do Distrito Federal, sob a argumentação de que as acusações tratam de financiamento eleitoral. O processo agora está sob sigilo.
À Justiça a defesa do ex-deputado negou que ele tenha cometido irregularidades. Afirmou que não há indícios concretos da prática de crimes e que as acusações se baseiam apenas nas palavras de delatores não confirmadas por outros elementos de prova. Também disse que ele recebeu de boa-fé doações eleitorais declaradas que eram consideradas lícitas na época.
Já a acusação sobre o “quadrilhão do PP” teve a parte que envolvia Germano enviada à Justiça Federal no DF, com o fim do mandato dele. Em relação a parlamentares que permanecem no Congresso, o julgamento caberá ao STF.
Uma terceira denúncia criminal contra o político, por suposto pagamento de propina da empresa Fidens, acabou rejeitada pelo STF em 2018, sob argumento de que se baseava apenas no relato de delatores.
Antes da Lava Jato, o novo prefeito já havia sobrevivido a uma crise política estadual. Chegou a ser denunciado sob acusação de desvios no Detran gaúcho na época em que foi secretário estadual, de 2003 a 2006.
A investigação sobre o órgão de trânsito à época causou uma das maiores crises na gestão da então governadora Yeda Crusius (PSDB), que governou de 2007 a 2010, e motivou pedidos de impeachment, também barrados.
Em 2013, o Supremo rejeitou abrir o processo contra Germano.
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Ex-deputado acusado com Lira refaz carreira como prefeito
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