Autor do pedido que abriu investigação contra Sérgio Moro, presidenciável do Podemos, no Tribunal de Contas da União (TCU), o subprocurador Lucas Rocha Furtado negou ao Estadão que o processo tenha em vista uma interferência no jogo eleitoral deste ano. Segundo ele, não há a intenção de tirar o ex-juiz das eleições e a ação não excede suas atribuições na corte, como acusam defensores do pré-candidato. “Procuro não invadir o mundo político. Conheço meus limites”, afirmou.
A investigação que apura possíveis ilicitudes na atuação do pré-candidato à Presidência junto à consultoria americana Alvarez & Marsal embala um conflito interno no TCU. Críticos ao processo no próprio tribunal enxergam em Furtado uma extrapolação de suas funções e incompatibilidade com as normas internas da corte. Um deles é o procurador Júlio Marcelo de Oliveira, sorteado para atuar na investigação e desafeto declarado de Furtado.
Segundo Oliveira, Furtado descumpre uma regra do Ministério Público que determina o afastamento do responsável pela abertura de um processo após o início das investigações. Ao Estadão, o procurador apontou que seu desafeto na corte parece ter predileção pelo tema da Lava Jato. “Ele (Furtado) é autor de centenas de ações e em nenhuma delas continua atuando, a não ser nas que dizem respeito à operação”, afirmou.
“O ponto que considero fundamental é que o TCU não tem competência para tratar de contratos entre agentes privados, recuperações judiciais ou questões tributárias”, completou.
Furtado tem agido de forma ativa no processo contra Moro. A apuração teve início a partir de suspeita de conflito de interesses e, posteriormente, passou a se debruçar sobre uma possível omissão de valores do contrato entre o ex-juiz e a consultoria. Dias atrás, após a entrada de Oliveira na ação, por sorteio, Furtado pediu o arquivamento da investigação, alegando que não cabe ao TCU investigar contratos privados. Depois, foi na via oposta e solicitou o bloqueio de bens do ex-juiz, justificando ter identificado novas informações relevantes ao processo. O movimento foi visto como uma forma de tentar tirar Oliveira do caso.
Na avaliação do subprocurador, Oliveira teria entrado na investigação com o intuito de blindar Moro e a Lava Jato como um todo, o que, segundo ele, “chega às raias do absurdo”. O procurador é um defensor da operação e já fez postagens nas redes sociais classificando-a como “referência” do combate à corrupção no País.
Ao Estadão, Oliveira classificou como “ridículas” as acusações de Furtado. “Estou atuando no processo simplesmente porque fui sorteado”, rebateu. Ele nega que sua admiração pública pela Lava Jato possa interferir na investigação. “Eu sou um defensor da Lava Jato na medida em que ela ajudou a combater a corrupção no País. Não sou soldado de ninguém”.
O subprocurador, por sua vez, incumbe a Oliveira as acusações que recebe. “Às vezes, o mundo jurídico e o político se interpenetram. A expressão ‘pedalada fiscal’ foi criada por um procurador do TCU. Isso, sim, é exercício de atribuição política”, afirmou Furtado, se referindo à atuação de Júlio de Oliveira no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. O procurador nega, alegando que participou do processo de impedimento porque foi “convocado” conforme as regras de atribuição vigentes na época.
No último sábado, dia 5, senadores do Podemos acionaram a Procuradoria-Geral da República para apurar suposto crime de abuso de poder por parte de Furtado. Os parlamentares pedem adoção de “providências legais” e “sanções cabíveis” contra o subprocurador, alegando que ele teria deixado de observar pareceres técnicos do TCU e reforçando a tese de perseguição política contra Moro.
A pedido de Furtado, o TCU passou a investigar se houve conflito de interesse na atuação de Moro junto à Alvarez & Marsal, visto que a consultoria foi indicada pela Justiça como administradora do processo de recuperação judicial da Odebrecht, empreiteira financeiramente prejudicada por condenações da Lava Jato.
No fim de dezembro, o tribunal determinou que a consultoria revelasse os valores pagos a Moro. Em janeiro, o próprio presidenciável fez uma live para divulgar quanto recebeu pelos serviços prestados à empresa. O ex-juiz tem afirmado publicamente que considera a investigação abusiva.