BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse nesta quarta-feira (28) que o general da reserva Luiz Eduardo Ramos não recebe nota 10 por não saber conversar com o Congresso Nacional.
O militar foi deslocado do comando da Casa Civil para a Secretaria-Geral da Presidência justamente por reclamações de parlamentares. Presidente do PP e líder do centrão, o senador Ciro Nogueira (PI) assumiu o lugar de Ramos na pasta apontada por Bolsonaro como “alma do governo”.
“O general Ramos é uma pessoa nota 9. Não é 10 porque falta para ele um pouco de conhecimento para melhor conversar com o parlamentar”, disse Bolsonaro em entrevista à Rádio Mundial, da cidade de Luís Eduardo Magalhães (BA).
O presidente disse que o líder do centrão encontraria dificuldade similar à de Ramos se tivesse de dialogar com o mundo militar. “É a mesma coisa que eu querer que o Ciro Nogueira converse com o Alto-Comando das Forças Armadas. Ele não sabe como conversar de forma adequada, vamos assim dizer”, afirmou.
Bolsonaro ainda disse que a Casa Civil é o ministério mais importante. Na terça-feira (27), o presidente afirmou que a pasta é a “alma do governo”.
Ramos tentou se manter no cargo, e Bolsonaro também havia demorado a ceder e aceitar a troca. Ambos são amigos de longa data. O presidente já rifou diversos aliados ao longo do mandato, e alguns viraram posteriormente desafetos.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo na semana passada, Ramos se disse surpreendido pela sua saída da Casa Civil. “Eu não sabia, estou em choque. Fui atropelado por um trem, mas passo bem”, afirmou o general.
À Rádio Mundial, Bolsonaro disse ainda que avalia se filiar ao PP para disputar a reeleição à Presidência em 2022. “Devo disputar [as eleições], não posso garantir. E temos conversado com vários partidos, entre eles o PP, ao qual integrei durante 20 anos.”
Bolsonaro oficializou nesta quarta-feira a reforma ministerial para abrigar o centrão na cúpula do governo. Pelo desenho definido, a reforma envolve trocas em três pastas. Ciro ocupou o lugar do general da reserva Luiz Eduardo Ramos na Casa Civil, que foi deslocado para a Secretaria-Geral da Presidência, pasta que era ocupada por Onyx, agora ministro do Trabalho e Previdência.
Ao trazer o senador para o coração do governo, Bolsonaro sela seu casamento com o centrão –grupo de legendas fisiológicas que, na campanha de 2018, era frequentemente criticado pelo então presidenciável.
O episódio que marcou o discurso contra a velha política na campanha foi protagonizado pelo atual ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno. “Se gritar pega centrão, não fica um, meu irmão”, cantou o general num ato partidário de 2018. Em sua versão, ele canta “centrão” no lugar de “ladrão”, que consta na letra original composta por Ary do Cavaco e Bebeto Di São João.
Pouco mais de dois anos depois, o discurso mudou radicalmente. “Eu nasci de lá [do centrão]”, afirmou Bolsonaro na última quinta-feira (22). “Eu sou do centrão.”
Ciro afirmou em 2017 que Bolsonaro é “fascista” e “preconceituoso”. Ele também apoiou a candidatura de Lula ao Planalto em 2018. Bolsonaro tem minimizado as falas antigas do novo ministro da Casa Civil.
Parlamentares, sobretudo os do centrão, vinham pressionando pela saída de Ramos da Casa Civil.
A avaliação é que o general não tem traquejo político, falha na articulação com o Legislativo e breca demandas de senadores e deputados, como a liberação de emendas.
Há ainda a constatação de que, com a proximidade das eleições de 2022, é preciso ter alguém na Casa Civil que saiba dar visibilidade aos feitos do governo.
Aliados também esperam que Ciro Nogueira costure as alianças políticas necessárias para a campanha de reeleição de Bolsonaro.
A prioridade para articuladores políticos e dirigentes de siglas que hoje pretendem apoiar a reeleição é a reformulação do Bolsa Família e outras medidas que impulsionem a recuperação da economia em 2022, após a vacinação da população contra a Covid-19.
A aposta é que, com um programa de forte apelo popular e uma economia aquecida, o presidente deve conseguir recuperar a popularidade.
Atualmente, pesquisas indicam aumento na reprovação do governo e favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o pleito do próximo ano.
A aproximação do chefe do Executivo com o centrão ocorre em um momento de extrema fragilidade do governo, quando Bolsonaro se vê ameaçado por mais de cem pedidos de impeachment e pelo avanço da CPI da Covid, que tem jogado luz sobre supostos casos de corrupção na gestão.
Hoje o governo Bolsonaro tem 23 ministérios, 7 a mais do que os 15 prometidos na campanha eleitoral de 2018. Sob a gestão de Michel Temer (MDB), seu antecessor, eram 29 pastas.
Aliados rifados por Bolsonaro Bolsonaro retirou força ou até excluiu do governo parte de seus apoiadores
Gustavo Bebianno: aliado e articulador da campanha em 2018, foi demitido da Secretaria-Geral da Presidência em fevereiro do ano seguinte. Tornou-se opositor ferrenho do presidente. Ele morreu em março de 2020 após sofrer um infarto. General Santos Cruz: foi demitido em junho de 2019 da Secretaria de Governo após seguidas crises com os filhos do presidente, além de um embate com o escritor Olavo de Carvalho, guru do bolsonarismo Joice Hasselmann: a deputada rompeu com o presidente em outubro de 2019, quando foi retirada da liderança do governo no Congresso Magno Malta: ex-senador chegou a ser cotado para vice de Bolsonaro, mas se afastou do presidente Paulo Marinho: um dos principais articuladores da candidatura ao Planalto, o empresário cedeu casa para a campanha, mas rompeu com Bolsonaro e tornou-se crítico do presidente Alberto Fraga: ex-deputado era visto como ministro informal de Bolsonaro e chegou a criar expectativa de receber oficialmente uma pasta para comandar. Fraga disse ao Painel, da Folha, que o ditado “eu sou amigo dos meus amigos” não se encaixa em Bolsonaro e que “a insensibilidade dele deixa todo mundo revoltado” Major Olímpio: o ex-senador coordenou a campanha de Bolsonaro em São Paulo, mas se tornou opositor do presidente. Ele morreu em março deste ano por complicações da Covid-19. Fernando Azevedo e Silva: Bolsonaro demitiu do comando da Defesa o amigo de longa data por considerar que as Forças Armadas estavam se afastando do governo Luiz Eduardo Ramos: também amigo de longa data do presidente, o general perdeu força no Palácio do Planalto e foi deslocado do comando da Casa Civil para a Secretaria-Geral da Presidência. Ramos foi pego de surpresa pela troca e tentou se manter no cargo Sergio Moro: ex-juiz da Lava Jato pediu demissão em abril de 2020, alegando que havia pressões para troca no comando da PF. Convidado para ser “superministro”, Moro virou um dos alvos preferenciais das críticas do presidente