Em minha última publicação nesta coluna, ousei apresentar uma análise, muito particular, da personalidade do Presidente, dizendo que o avalio como um psicopata. Depois fiquei sabendo que outros fizeram o mesmo em artigos de diversos jornais do país, o que me fez pensar que não estou enganada. Meu texto produziu várias consequências e reações, mas graças a Deus, não houve nenhum massacre à minha pessoa pelas redes sociais. Acho que o algoritmo do gabinete do ódio não me leu. Ainda bem!
Minha mãe e mais uns conhecidos ficaram com medo de eu sofrer alguma retaliação. Achei isso improvável, mas não impossível. Talvez eu fosse processada, embora isso não tenha me preocupado, pois caso acontecesse, poderia acessar alguém do movimento #calabocajamorreu lançado por Felipe Neto que reúne advogados dispostos a defender, voluntariamente, aqueles que têm problemas na justiça por chamarem Bolsonaro de #genocida.
Muitos me disseram que minhas palavras coincidiram com suas opiniões, que se sentiram representados no texto e esse tipo de comentário me deixa bastante feliz. Mas a maior repercussão do artigo foi em mim mesma. Geralmente sou uma pessoa bastante calma e depois da publicação, ao fazer um exercício de autocritica, notei que sair esbravejando por aí, publicamente, é um velho e conhecido sinal de que eu não estou muito bem. Pois é, minha gente, psicólogo também fica mal. Na verdade, quem é que consegue ficar bem nos dias de hoje?
Diante do número absurdo de mortes por Covid, do colapso sanitário provocado pela contaminação desenfreada, do surgimento de novas variantes e da lentidão na distribuição de vacinas, junto ao esfacelamento de outros setores da sociedade como cultura, turismo, educação e economia, nossa saúde mental também pode colapsar. Não é de hoje que a
Psicologia estuda os efeitos da exposição continuada ao estresse, como causa de diversos problemas mentais como os Transtornos de ansiedade, de Estresse pós-traumático e Depressão, descritores de várias alterações comportamentais que acompanham muito sofrimento psíquico e grandes dificuldades na condução do dia-dia.
Atravessar uma pandemia tem sido um grande laboratório para psicólogos e afins. Há os que estão na linha de frente, trabalhando na beira do leito no hospital, coordenando equipes de profissionais da saúde ou oferecendo suporte aos familiares. Todos os outros estão nos bastidores, cuidando de um contingente enorme de pacientes amedrontados, exauridos, ansiosos, enlutados, deprimidos, descompensados e desesperados. Nossos consultórios, reais ou virtuais, também se tornaram um ambiente de campanha, em que predominam as emergências ligadas à guerra contra a Covid, e no qual sobra pouco espaço para os antigos ou novos projetos de desenvolvimento pessoal. Minha sensação é que as demandas pelo trabalho dos psicoterapeutas também foram contaminadas pelo coronavírus.
Portanto, não estranhe se um dia seu terapeuta cancelar a sessão inesperadamente, se parecer muito triste e cair no choro junto com você, se aparecer descabelado e com olheiras, se demostrar alguma irritação a mais, se tiver engordado, se esquecer alguma parte importante da história ou se publicar um texto meio agressivo.
Psicólogo também é gente e é normal não estarmos bem o tempo todo. A terapeuta americana Lori Gottlieb que o diga. Em seu livro “Talvez você deva conversar com alguém” ela relata com autoridade, sensibilidade e leveza como conseguiu conciliar o terrível sofrimento de uma desilusão amorosa, seus atendimentos e o enfrentamento da mudança de posição de terapeuta para paciente. Poderia ser mais um livro que revela o que acontece dentro dos consultórios de psicoterapia, mas para mim, ele significou muito mais. Lê-lo neste momento, em que estamos todos sofrendo, foi muito reconfortante, além de me lembrar algo fundamental: precisamos ser mais gentis, generosos e compassivos com nós mesmos.
Depois de um ano vivendo nesse cenário, voltamos cinco casas e retornamos ao início do tabuleiro. E esta fase do jogo está horripilante. Estamos com mais conhecimento, porém com mais medo, mais cansaço e mais confusão. Antes nos apegamos ao “vai passar”, pensando que o tal “novo normal” seria uma coisa temporária. Agora, duvidamos se esta crise, um dia, irá terminar.
E diante de tanta incerteza, podemos ficar mais sensíveis. Devemos, então, ser menos exigentes e aceitar que não seremos o aluno exemplar, a melhor mãe, o marido ideal, ou a melhor namorada. Que iremos pisar na bola e, provavelmente, nossa performance profissional poderá não ser suficiente para ganharmos o título de funcionário do mês.
Em alguns momentos, me falta inspiração para escrever essa coluna. Falta assunto novo e eu e vocês, meus queridos leitores, não aguentamos mais falar de pandemia. Entretanto, escrever sobre o que dói e expressar o que sentimos pode contribuir muito com o reestabelecimento da paz emocional. Colocar no papel, no Instagram, no WhatsApp, no Facebook ou em qualquer lugar suas emoções, pensamentos e acontecimentos pode ser um exercício salvador. Vale prosa, poesia ou somente relatos despretensiosos. Mergulhar no mundo da fantasia também é uma boa opção. Ando enveredando para a escrita de contos de ficção, mas essa é uma outra história que, quem sabe, contarei no próximo texto.