Mega-assaltos, como o de Araçatuba semana passada, representam um dos maiores desafios na segurança pública para a gestão João Doria (PSDB), que tem como bandeira fortalecer estruturas no interior. São ao menos outros sete casos de repercussão nos últimos três anos, com ação de quadrilhas violentas, além de outro crime do tipo na Grande São Paulo.
Os grupos usam armas de guerra, detonam bombas e tomam reféns – em Araçatuba eles foram colocados no capô de carros. O crime amedrontou a cidade, onde explosivos foram espalhados pelas ruas. O governo destaca investimentos no setor, principalmente por meio dos Batalhões de Ações Especiais (Baeps) e das Divisões de Investigação Criminal (Deics), além de queda superior a 90% nos roubos a banco e explosões de caixas eletrônicos na última década. Mas o reforço não tem impedido os recorrentes assaltos cinematográficos.
Antes de Araçatuba, ganharam repercussão crimes em Mococa, Ourinhos, Botucatu e Araraquara, no ano passado. Em 2019, houve assalto a uma transportadora de valores no Aeroporto de Campinas, além do roubo milionário de ouro no Aeroporto de Guarulhos, e do assalto em Guararema, que teve 11 suspeitos mortos. Em julho deste ano, foi atacada uma fábrica de joias em Jarinu. A prática é conhecida como novo cangaço.
Especialistas apontam que as organizações criminosas estão se unindo para ataques que resultem em grande aporte financeiro para seus caixas, comprar drogas e armas e planejar novas ações. São quadrilhas altamente preparadas e que distribuem tarefas, possivelmente ligadas ao Primeiro Comando da Capital (PCC) e outras facções. “É terrorismo urbano”, diz a desembargadora do Tribunal de Justiça de São Paulo Ivana David, especialista em crime organizado.
O Estado terá de correr para cumprir a promessa de chegar a 22 batalhões de ações especiais de polícia – os Baeps – na atual gestão. Em 31 meses de mandato, foram instaladas nove unidades. Como já havia cinco quando Doria assumiu, em janeiro de 2019, ainda faltam oito batalhões. Para atingir a meta fixada, terá de criar um batalhão a cada bimestre, já que a atual gestão termina em 16 meses.
Conforme a Secretaria da Segurança Pública (SSP) paulista, a atual gestão trabalha para ampliar o número de Baeps em todo o Estado, mas não deu prazos. “Há estudos em andamento para definir o cronograma”, informou, sem mais detalhes. “O combate à criminalidade e o reforço no policiamento são compromissos do governo.”
Desde 2019, disse a pasta, foram criadas 12 Divisões Especializadas de Investigações Criminais (Deics), atendendo todas as regiões do Estado. “O número já supera as dez unidades prometidas no início da administração”, acrescentou, em nota.
Enquanto as Deics reúnem todas as atividades de polícia civil especializada, os Baeps são responsáveis por ações táticas de policiamento militar ostensivo e de preservação da ordem pública, incluindo policiamento montado e com cães. Dos 14 Baeps atuais, nove estão no interior, um no litoral, dois na Grande São Paulo e dois na capital.
Na prática, a ideia é que as unidades operem de modo mais ostensivo, com patrulhamento de choque. O efetivo, sempre superior a 200 PMs por unidade, recebeu treinamento padrão Rota, tropa de elite da PM.
Os primeiros cinco batalhões, criados na gestão Geraldo Alckmin (PSDB), atendem Campinas, Santos, São José dos Campos, a área Leste da capital e Barueri. Doria inaugurou Baeps de São Bernardo, centro da capital, Presidente Prudente e São José do Rio Preto, em abril de 2019, e os de Piracicaba e Ribeirão Preto em dezembro daquele ano. Em 2020, foram os de Araçatuba e Bauru, em agosto, e de Sorocaba, em dezembro.
Problema complexo
Especialistas apontam que apenas a criação de novas unidades das polícias Civil e Militar não é suficiente para enfrentar o crime organizado. É necessário planejamento mais amplo, como treinamento e uso de inteligência.
“A mera criação de delegacias e batalhões não vai, necessariamente, se mostrar estratégia efetiva contra o crime organizado”, diz o perito criminal Cássio Thyone Rosa, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Para ele, é difícil dizer se a distribuição das unidades permitirá cobrir com deslocamento rápido as cidades sem essa estrutura – o Estado tem 645 municípios. É necessário, acrescenta, mais tempo para ter parâmetros que permitam avaliar a estratégia dos batalhões.
“Sem aumento de policiais e estrutura específica, nada muda no enfrentamento desse tipo de criminalidade. Combater organização criminosa exige inteligência e contra-inteligência, maior investimento em tecnologia, recursos humanos e melhor remuneração dos policiais”, afirma Ivana David.
A ação em Araçatuba foi na virada do mês, quando bancos têm mais dinheiro em caixa. Quadrilhas escolhem cidades pequenas ou médias, com menos tropas preparadas para esses crimes, e boa movimentação financeira. Para Rosa, chama a atenção ainda o uso de drones e explosivos. “Quando traz aparato como esse, se entende que não é ação de amadores”, diz.
Diferentemente de outros ataques, quando explosivos abriam cofres, nesse eles foram instalados na rota de fuga para dificultar a perseguição. “Explosivo, em tese, é controlado pelo Exército. Se alguém teve acesso a tanto, precisa ver se houve furto em pedreira ou mineradora.”
O coronel Álvaro Camilo, secretário de Segurança em exercício, admitiu à Rádio Eldorado na terça-feira a necessidade de integrar mais a força estadual e os bancos para coibir crimes. “A informação estava reservada dentro do banco. Se soubéssemos que o risco era grande, poderíamos ter aumentado o efetivo na cidade”, disse ele, que também defendeu o uso de drones pela polícia, como fez a quadrilha.
Estatísticas
Em 2020, o Estado viu os crimes patrimoniais, como roubos, despencarem. Se contar a última década, diz o governo, houve redução de 92% nos roubos a banco e de 98% nas explosões de caixas eletrônicos.
Nos primeiros sete meses deste ano, segundo o governo, 46 envolvidos com roubos a banco foram presos no Estado, alta de 142% ante o mesmo período de 2020. Até o domingo, havia sete suspeitos presos e um morto em Araçatuba. Os casos de Ourinhos, Botucatu e Araraquara resultaram na prisão de 27 criminosos e no indiciamento de outros doze, afirma o Estado.
“Indicadores de segurança são importantes, mas não são ferramentas absolutamente exatas para se aferir o grau de eficiência da segurança pública”, diz o delegado Gustavo Mesquita Galvão Bueno, presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado.
Para ele, a segurança exige abordagem multidisciplinar e maior valorização da categoria. (Com informações do jornal o Estado de S. Paulo)