Os impactos da crise hídrica entre os são-carlenses deverão ir muito além da fatura da conta de luz no final do mês. As famílias devem ser afetadas por alterações nos preços de inúmeros itens que estão presentes no dia a dia.
A crise hídrica na Região Hidrográfica do Rio Paraná tem o potencial de empurrar o país para uma crise energética, de acordo com especialistas. O Brasil é dependente da energia que vem das águas, com 67% da geração. Quando faltam chuvas, como o ocorrido neste ano, menor é o potencial de produção.
Quando há pouca água nas barragens, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aciona plano de contingência que inclui a ligação de usinas termoelétricas, mais caras. E a conta vem para o consumidor. Em uma casa que gasta 200 kWh ao mês, o custo a mais é de quase R$ 12,50, comparando a bandeira vermelha 2 atual com uma bandeira verde, quando não há custo adicional.
O acréscimo no preço da energia, que representa R$ 6,24 para cada 100 kWh gastos, é exponencialmente maior em comércios e estabelecimentos de serviços, que dependem mais da energia para manter equipamentos ligados.
Um dos casos é o do restaurante de Marques Antônio Pereira dos Santos. Ele mantém oito freezers, uma câmara fria, e geladeiras de bebidas em seu estabelecimento. Para economizar a energia e em função da pandemia, o empresário desligou parte dos equipamentos.
“Como o movimento não está como era antes e há menos atividades operacionais estou com três freezers desligados. Hoje o movimento é outro”, relata.
Com a contenção de gastos com energia, o empresário conseguiu baixar a fatura de quase R$ 4.000 para algo em torno de R$ 2.000. Apesar de mais baixo, o gasto é ainda maior do que há quatro anos, quando ele recebia faturas de R$ 1.700 “com tudo ligado”.
“Tudo encareceu, agora a luz ficando cara. Vamos ter que sentar e somar para ver o preço final. Mas o resultado é nós e os clientes pagarmos a conta”, resume.
Em distribuidoras de bebidas, a situação não é tão diferente. Na de Eduardo Mendes, por exemplo, para manter cervejas e bebidas geladas há um peso que representa 40% da tabela de custos. “Atrapalha bastante, ainda mais agora nesses tempos de pouco movimento devido a pandemia”.
Em padarias, as coisas também não andam fáceis. Quem tem forno elétrico já sente o impacto neste mês, mas não há para onde “fugir”, uma vez que o gás envasado também teve altas recentes, como é o caso de Márcio Terra, dono de panificadora.
Por lá há dois fornos, um elétrico e outro a gás. A energia para ele tem um peso não tão grande nas contas da empresa, mas ele vai ter que reduzir suas próprias margens para manter a clientela.
” Vamos ter que engolir o custo. É o que acontece com tudo. Ou você assume o custo ou é engolido pelo concorrente. Você reduz sua margem de ganhos mas mantém a venda”, exemplifica.
Segundo o economista Paulo Cereda, há ainda outras formas de o aumento da energia chegar às famílias. Os supermercados fazem uso intensivo de eletricidade em câmaras frias, por exemplo. Há ainda a cadeia da indústria de embalagens, com uso de injetoras, sopradoras e modeladoras.
“E por aí vai: supermercado, açougues, casas de frios, tudo que depende de refrigeração terá uma pressão de preços num momento de crise e fica ruim porque tem a inflação de custo somado com o período de recessão econômica”, explica.
De acordo com o economista, futuramente, a falta de água poderá repercutir na lista de compras de supermercado e feiras. Com menos água, menor oferta de grãos e hortaliças, o que empurra o preço para cima.
“Com certeza teremos uma quebra de safra de setores importantes de culturas como a do milho, que vem para a indústria alimentícia humana e animal. É base para muitas rações como as de frango, porco e vaca e aí uma coisa vai passando para outra”, resume.