Nesta sexta-feira (19) é celebrado o Dia do Historiador, aquele que segundo Peter Burke, tem como função “lembrar a sociedade daquilo que ela quer esquecer”. Em São Carlos, um desses profissionais que em palavras e fatos consegue aguçar o senso crítico e trazer reflexões é a historiadora Leila Massarão, diretora da Fundação Pró-Memória.
Leila atua na fundação desde 2004. Em 18 anos de trabalho, ela teve e ainda tem muita história para escrever, literalmente, mas não só as que são contadas desde sempre, também tinham os “esquecidos”.
“Os eventos não são isolados, são um conjunto de coisas que estão acontecendo e vai ter o efeito posterior, então o historiador tem a preocupação de contextualizar exatamente por isso, porque não é uma coisa isolada, é muito maior”, conta ela.
Entre os materiais que estão disponíveis na Fundação Pró-Memória, a diretora destacou quatro que teve participação ativa, sendo que dois deles tem “seu perfil”. Ela explica que nenhum texto é puramente de um autor e que os trabalhos sempre são frutos de parceria.
“Eles nunca são escritos totalmente sozinhos. Quando chega na fase de redação e preparação final do material é que acaba direcionando, a gente vai dar nosso perfil pessoal”, disse Leila.
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Os selecionados
O primeiro tem o título “Aspectos da administração pública municipal”, que também traz a galeria de prefeitos, presidentes da Câmara e outros governantes desde 1865 até 2012. O documento está disponível para distribuição na Fundação.
“Ele foi escrito muito antes de mim, só que ele precisa sistematicamente ser revisado e ampliado, então eu tenho feito a revisão e ampliação dele nos últimos anos. Acaba tendo um perfil mais historiográfico do que teria quando foi lançado pela primeira vez”, contou Leila.
Outro bastante interessante e cheio de curiosidades é o livro “Praças de São Carlos”. Segundo Leila, foi um trabalho que envolveu muitos bolsistas e que já tem duas publicações anteriores, 2014 e 2016, mas com o desenvolvimento da cidade, ele deve estar em constante alteração, e por conta disso uma nova edição está sendo preparada.
“Essa publicação tem o sentido de alcançar uma população que às vezes não sabe quem é o cara que dá nome à rua dele, à praça onde vai ou escola que ele frequentou. Esses elementos que são cotidianos das pessoas são uma forma de a gente divulgar a história local e alcançar a população”, contou.
Durante as edições, Leila comenta que percebeu algo interessante. “A gente notou que nos últimos 20 anos, nas praças dos anos 90 a 2000, houve uma tendência das “praças das desgraças”, porque é sempre uma pessoa que teve uma morte muito triste, muito trágica, ou coisas do gênero, então é muito próximo das pessoas da cidade, e talvez se liguem mais a essas pessoas”, disse.
O terceiro escolhido, “A presença japonesa em São Carlos”, foi seu primeiro livro “sozinha”, fruto de um projeto sobre imigrantes do município que foi financiado pelo Ministério da Justiça. Ele está disponível nas bibliotecas da cidade.
“Foi a partir dele, na verdade, que o Matsuri se consolidou na cidade, que é uma festa que todo mundo conhece. Tem muito relato oral que são uma base importante quando você trabalha com história local, porque muitas vezes essa documentação não existe ou nunca foi coletada e a gente não acha, então as pessoas foram nossos agentes nessa pesquisa, com suas lembranças, com seus documentos, com suas fotos”, relatou a historiadora.
E o quarto, mas não menos importante, é o “Fogo e Vapor – Aspectos da história de São Carlos a partir da ferrovia”, talvez uma das publicações mais importantes sobre a cidade e que foi baseado no processo de tombamento da Estação Ferroviária, em 2017.
“As pessoas tem apego muito grande à Estação, então a gente precisava de um material que desse conta de contar a história da ferrovia, mostrar como foi se desenvolvendo e trazer imagens que fossem muito importantes na construção, que tivessem na memória das pessoas, tanto imagens históricas quanto atuais”, conta ela.
A ferrovia, segundo Leila, teve muita força para urbanização, história econômica, formação de bairros e crescimento industrial, e é claro que tudo isso não foi feito com apenas duas mãos, mas com várias que ficaram escondidas por muito tempo e estão tendo suas histórias escritas.
“A historiografia consegue, a partir de um elemento, abarcar vários. Há outros elementos que mexem com a memória afetiva das pessoas e que vão atraí-las para o material, e deste material o historiador é capaz de trabalhar para que ela tenha acesso a mais informação”, completou.
Esse último, que conta com pouco mais de 130 páginas com imagens, fatos, curiosidades e até comparativos entre épocas, está disponível para venda na Fundação Pró-Memória, que funciona de terça a sexta, das 9h às 12h30 e das 13h30 às 17h.