Quatro vereadores e dois ex-prefeitos de São Carlos assinaram a Carta aos Brasileiros da Faculdade de Direito da USP. O documento defende o Estado Democrático de Direito e as eleições livres.
Entre os detentores de mandato que subscreveram o documento estão os vereadores Roselei Françoso (MDB), presidente da Câmara, Azuaite Martins de França (Cidadania), Djalma Nery (PSOL) e Raquel Auxiliadora (PT).
Os ex-prefeitos Newton Lima e Oswaldo Barba, ambos do PT, também assinaram o documento.
A carta relembra documento lido em 8 de agosto de 1977 por Goffredo da Silva Telles Júnior nas arcadas da Faculdade de Direito do Largo São Francisco em que pedia o restabelecimento da democracia em plena ditadura civil-militar.
O texto defende a reafirmação do Pacto de 1988 e o respeito às regras do jogo democrático. Recentemente, as eleições têm sido ameaçadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e por quadros das Forças Armadas.
A nova carta foi escrita a várias mãos e será lida em evento no dia 11 de agosto, data simbólica que relembra a fundação da Faculdade de Direito do Lardo de São Francisco e da Faculdade de Direito de Olinda (PE).
“Tem gente que é contra a democracia, pessoas que não sabem o que é viver num regime antidemocrático. Eu vivi e fui vítima disso, sei o que é”, afirmou Azuaite, vereador com maior tempo na Casa de Leis.
Em nota, Roselei Françoso relembrou que o Brasil possui eleições transparentes com reconhecimento internacional.
“Nós temos um sistema eleitoral reconhecido mundialmente e o que a gente espera é que os resultados finais das eleições sejam respeitados para fortalecer ainda mais a nossa democracia”, afirmou.
A Carta aos Brasileiros somava, até a manhã desta terça-feira (9), mais de 815 mil adesões. Entre os signatários estão nomes que participaram da Carta de 1977, como o professor emérito da Faculdade de Direito da USP Fábio Konder Comparato, o professor sênior e ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior, os advogados Sérgio Bermudes, José Nuzzi Neto e Jayme Cueva, os ex-ministros da Justiça José Carlos Dias e José Gregori, entre outros.
Os ex-ministros do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto, Carlos Velloso, Celso de Mello, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Eros Grau, Marco Aurélio Mello, Sepúlveda Pertence e Sydney Sanches também assinaram o documento.
Confira, na íntegra, o documento
Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito!
Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.
Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.
Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para o país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.
A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.
Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.
Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.
Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.
Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.
Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.
Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.
Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos às brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.
No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.
Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:
Estado Democrático de Direito Sempre!!!!