*Por: Marina Fávaro
O etanol de segunda geração é obtido a partir dos resíduos (biomassa) da fabricação do etanol de primeira geração, especialmente o bagaço da cana-de-açúcar. A digestão desses resíduos é realizada por enzimas produzidas por microrganismos. Uma pesquisa descobriu que protozoários da espécie Muniziella cunha encontrados no sistema digestivo da capivara produzem enzimas capazes de degradar a biomassa.
Publicada recentemente no periódico Microbial Genomics, a descoberta foi realizada a partir de uma parceria entre a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Uma das pesquisadoras responsáveis pelo estudo, Vera Solferini, destaca que, além de favorecer a digestão da biomassa, os microrganismos podem aumentar a eficiência e a produtividade de extração do etanol de segunda geração.
“Algumas espécies de ciliados, como a Muniziella cunhai, possuem um arcabouço enzimático mais robusto do que o observado em muitas bactérias e leveduras comumente empregadas nesses processos. Os resultados dessa pesquisa representam um grande potencial biotecnológico para aplicação nas indústrias de bioetanol”, afirmou a pesquisadora.
Segundo Franciane Cedrola, pesquisadora também responsável pelo estudo, a descoberta pode ter um impacto significativo a longo prazo, já que isso pode reduzir a dependência de combustíveis fósseis, diminuir as emissões de gases de efeito estufa e, consequentemente, mitigar as mudanças climáticas.
LEIA MAIS
Área de soja no Brasil cresce 1,5%, em comparação com 2023/24
Comemos vespa quando comemos figo?
“Com enzimas mais eficientes, a biomassa pode ser convertida em produtos úteis, reduzindo a quantidade de resíduos agrícolas e a necessidade de descarte inadequado, que pode poluir o solo e a água. Por fim, o uso da biomassa de forma eficiente pode reduzir também a necessidade de expansão de terras agrícolas para atender à demanda de produção de etanol diminuindo, assim, a destruição de habitats naturais e ajudando na conservação da biodiversidade”, explicou.
Como as capivaras adquirem o protozoário? Esse era uma dos questionamos das pesquisadoras. Pode ser nojento para nós, humanos, mas os animais ganham os protozoários quando ingerem um tipo específico de fezes, os cecotrofos (que são repletos de microrganismos), provenientes dos pais e das colegas de grupo.
Ao se alimentar de fezes, a capivara adquire o Muniziella cunhai, protozoário que é essencial para o processo digestivo dela. Franciane explica que o objetivo inicial da pesquisa era justamente entender como o protozoário contribui para o processo digestivo da capivara, especialmente na digestão de vegetais de difícil processamento. Afinal, esses animais não são capazes de produzir as enzimas responsáveis por quebrar as fibras consumidas. “A pesquisa demonstrou que essa relação permite que a capivara obtenha nutrientes essenciais, como ácidos graxos voláteis, lipídios, proteínas e vitaminas, que são liberados pelo protozoário durante o seu metabolismo”, explicou.
A pesquisadora defende que a relação capivara-protozoário é do tipo simbiótica mutualista. Ou seja, as duas espécies vivem juntas em uma associação íntima, benéfica e de longo prazo. “Essa relação é estabelecida, por meio da infecção de indivíduos jovens, que nascem sem a microbiota intestinal estabelecida. A partir do momento em que estão no intestino da capivara, os protozoários passam a atuar no seu metabolismo digestivo, obtendo, em troca, nutrientes para o seu próprio metabolismo”, concluiu.
LEIA TAMBÉM
Exportação de peixes de cultivo cresce 72% no segundo trimestre
*Sob supervisão de Marcelo Ferri