Dia 13 de julho é o Dia Mundial do Rock. O gênero musical, que ultrapassa gerações, foi se transformando ao longo da história. Apesar de enfrentar momentos de crise, no Brasil sua popularidade tem sido renovada. No primeiro semestre deste ano, o gênero foi o 3º mais ouvido no Spotify, de acordo com dados da plataforma.
Mesmo ganhando expressividade por volta dos anos 50, o rock tem seus primórdios já no final dos anos 30. O músico e professor do curso de Música Popular da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Budi Garcia (Hermilson Garcia do Nascimento), explica que as bases musicais do gênero são associadas à expressão da black music, assim como o rhythm and blues e o estilo country.
Assim, anos depois, ele fica ligado a figuras que se destacaram no início desse estilo musical, como Elvis Presley e Little Richard, nos Estados Unidos. Conduzido por uma filosofia encarnada pela juventude da época, a música é muito marcada pela denúncia social.
A partir da Guerra Fria e um novo contexto geopolítico, o gênero assume um tom mais pesado e engajado, o que transforma a sua sonoridade, originando novos subgêneros e subculturas. “O que rolava socialmente alimentava o rock, e o que o rock, nas suas bandas mais criativas, propunha, também ressoava na juventude e em outros setores da sociedade”, pontua Garcia.
LEIA TAMBÉM
Dia Mundial do Rock: bandas brasileiras fizeram sucesso no exterior
João Rock 2023: evento celebra 20 anos com 70 mil pessoas
Com a invasão britânica e a chamada “beatlemania”, o desenvolvimento do rock como sonoridade acaba se ampliando bastante, como diz o professor: “O rock britânico é mais pesado do que o rock americano daquele período. Eles começam a introduzir a guitarra distorcida, que era uma coisa ainda muito incipiente. A forma de cantar também fica mais ríspida, no sentido do timbre, do jeito”.
Mick Jagger, da banda Rolling Stones, é uma das marcas desse novo estilo, assim, como mais tarde, o beatle John Lennon também acaba adotando o modo de “cantar estranho”. A partir da década de 70, o gênero evolui para o rock progressivo, depois para o punk rock, o pós-punk, o hard rock e o heavy metal.
ROCK E RACISMO
Acompanhado pela realidade da época, o início do rock não deixa de ser ligado ao racismo vigente na sociedade. O professor da Unicamp cita o livro “Criaturas Flamejantes”, de 2006, de Nick Tosches, que apresenta a tese de que, quando surge a figura de Elvis, o gênero já está em declínio como força de renovação e poder de representar uma cultura jovem inconformista com os valores sociais vigentes.
“Ele [o rock] representa esse novo ritmo social também, e não só a coisa do ritmo musical e de tudo que ele congrega enquanto convivência, enquanto trocas simbólicas. Mas é uma expressão que quer mudar as coisas. Então, nesse sentido, tem muita coisa importantíssima que fica de fora porque é de músicos negros”, diz o especialista, que cita como exemplos Milton Brown, Fats Domino e Earl Hooker.
ROCK NO BRASIL
No Brasil, Budi Garcia conta que o rock surge principalmente com a cantora Nora Ney, que por volta de 1955 começa a fazer versões nacionais do que já existia no rock pioneiro. Em seguida, o músico Betinho também se destaca ao compor suas próprias músicas do gênero. Esse modelo de misturar estilos e começar a criar um rock autoral permanece até a Jovem Guarda, nas figuras de Roberto Carlos, Wanderléa e Erasmo Carlos.
Confira um trecho da entrevista com o professor para saber mais sobre a origem do rock no Brasil:
FESTIVAIS E MOBILIZAÇÃO
Se o rock ainda vive nos dias atuais, o mesmo vale para o sentimento dos fãs que o acompanham desde muito tempo. O engenheiro eletricista Luiz Otávio Moreira, aos 58 anos de idade, ainda preserva o mesmo sentimento pelas bandas que marcaram sua juventude, como Led Zeppelin, Queen, Rush, AC/DC e Pink Floyd.
O contato com o gênero musical veio quando estava no Ensino Médio e escutou pela primeira vez o álbum duplo do Queen “Live Killers”. “Não tive dúvidas, dei um jeito de comprar uma fita cassete de 120 minutos para gravar o álbum duplo para poder escutar em casa ou em qualquer outro lugar onde fosse possível rodá-la”, conta.
Talvez, na época, ele não imaginasse, mas essa paixão o levou a um lugar que iria entrar para a história: o Rock in Rio de 1985. Já no primeiro semestre do curso de engenharia elétrica, ele conseguiu participar de dois dos 10 dias da primeira edição do icônico festival de música. Não conseguiu ver o Queen, mas experienciou apresentações de AC/DC, The Go-Go’s, Nina Hagen, Rod Stewart, Scorpions, Barão Vermelho, Blitz e Paralamas do Sucesso.
O professor Budi Garcia destaca a importância dessa mobilização da sociedade realizada a partir de eventos que envolviam o rock. Assim, a luta por direitos sociais da época se encontra com acontecimentos como o Festival Pop de Monterey, em 1967, e o Woodstock, em 1969. No caso do Rock in Rio, o Brasil passava por um momento de redemocratização, com o evento marcado por menções às “Diretas Já”.
DE GERAÇÃO EM GERAÇÃO
Mas o rock não vive apenas naqueles que experienciaram esses grandes movimentos, e sim permanece passando de geração em geração. Para a Sara Lopes, de 26 anos, que trabalha como Assistente Jurídico, essa fascinação pelo gênero começou quando ainda era criança, por volta dos cinco ou seis anos, ao escutar pela primeira vez “Another Brick in the Wall”, do álbum “The Wall”, do Pink Floyd, que o seu pai tinha.
E se antes a fita cassete era um objeto necessário, hoje basta apenas ver um videoclipe pela tela do computador, celular ou televisão. Aos cinco anos, Ramon Rocha, discente do curso de Psicologia, assistia gravações de bandas como Red Hot Chili Peppers e Green Day, e foi o som unido ao visual apresentado que despertou seu interesse pelo ritmo do rock. Mas foi no jogo de videogame “Guitar Hero” que ele conheceu os clássicos do gênero como Kiss, Deep Purple, Black Sabbath e Led Zeppelin;
Não só o gosto pelas vozes gritantes e os solos de guitarra e bateria ainda conquistam as novas gerações, como também as temáticas que efervesceram ainda na juventude dos anos 50. Para Sara, a influência do rock em sua vida tem grande parcela de responsabilidade no desenvolvimento do seu pensamento crítico. “Passei a enxergar o mundo com outros olhos, aprender a questionar, me posicionar e buscar entender o que estava deixando passar despercebido pelas entrelinhas”, afirma.
Já para Ramon, além do criticismo, ele “mudou no sentido de não seguir o que todo mundo ouve, fala e acompanha nas mídias”. Até mesmo o gosto por outras formas de expressões artísticas foi impactado pelo rock, de maneira que o incentivou a consumi-las e explorá-las com mais profundidade.
NOVOS CAMINHOS DO ROCK
Mas nem só dos clássicos vivem as novas gerações. Como já é comum desde seus primórdios, o rock se reinventa com novas vertentes e hoje está cada vez mais presente em estilos alternativos, indie, pop rock, entre outros. Com uma sonoridade menos agressiva e estridente, bandas como Arctic Monkeys, The Killers e The Strokes prevalecem no gosto dos jovens da atualidade.
Os novos rostos do rock acabam sendo até mesmo os responsáveis por levar este público aos mais antigos, como aconteceu com Lukas Blumrich, de 23 anos. Foi a partir de covers do cantor John Mayer que o estudante de Medicina teve contato com nomes como B.B. King, Eric Clapton e Grateful Dead.
Entre as novas formas de musicalidade, o gênero está sempre aberto a experimentações, e tem bandas que usam e abusam da mistura de estilos e possibilidades, como é o caso do The 1975, que Lukas usa como exemplo. “Gosto muito também de como o gênero se aprofunda às vezes em questões românticas e outras em questões sociais ou políticas, quer dizer, tem muito espaço para tudo”, ele complementa.
Mas uma sensação que prevalece entre os fãs é de que o rock está perdendo público e apreço para outros estilos do mainstream, como o pop e o sertanejo. Mesmo com suas formas de se renovar e reinventar, a capacidade de estar na mídia de forma massiva, de fato, diminuiu bastante para o estilo musical, conforme disse o professor Budi Garcia.
Ainda assim, os fãs que surgem ou permanecem mantêm uma comunidade fortalecida, com um sentimento de conexão que pode vir até mesmo a partir de um simples objeto, como uma camiseta de banda, por exemplo. “Automaticamente você se identifica, porque você sabe que a influência daquela banda exercida sobre a pessoa conduz a um caminho comum entre os fãs”, comenta Sara Lopes.
Para definir a sensação de união e imortalidade no gênero musical, Luiz Otávio Moreira reafirma a máxima já conhecida: “Ser fã de rock faz você se sentir como aquele garoto que ia mudar o mundo, cantado pelo Cazuza. E é um sentimento que não morre nunca”.
LEIA MAIS
Escola cívico-militar: Governo de SP vai ampliar programa no estado
*Sob supervisão de Marcos Andrade