Em Itajubá, no Sul de Minas, um padre revelou, em uma missa no domingo (23), ter sofrido ameaças de um grupo político. De acordo com o pároco da Matriz Nossa Senhora da Soledade, Valmir Teixeira, as ameaças à integridade física ocorreram após proibição de entrega de material com instruções de voto para o candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL). O desabafo do padre foi gravado por um dos presentes e viralizou nas redes sociais nessa segunda-feira (24).
A denúncia do padre Valmir ocorreu pouco antes do final da missa. Segundo o padre, um grupo pró-Bolsonaro estaria fazendo panfletagem com “instruções da igreja” antes, durante e depois das cerimônias. O padre desmentiu a ação. O vídeo completo pode ser acessado na TV Soledade neste link a partir da marcação de tempo 1:17:00.
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“Tem um grupo tentando impor (em quem votar) pautado em muitas mentiras, precisamos filtrar muito as coisas. Eles usam, ainda, o nome da Igreja, eles escreveram no cabeçalho: Instruções da Igreja Católica para escolher em quem votar. Está no papel que estão distribuindo por aí. Isso não é instrução da Igreja“, disse o padre.
Em outro momento do vídeo, o padre Valmir pontua o assédio contra a liberdade religiosa. “Tem um grupo infiltrado nas igrejas distribuindo esse panfleto com propaganda eleitoral. Esse panfleto nitidamente com propaganda política, isso é crime eleitoral e atentado também contra a liberdade religiosa. Todos nós temos a nossa opinião, você tem a sua, eu tenho a minha para escolher o candidato que vamos votar no dia 30″, comentou.
AMEAÇAS
Durante a cerimônia de domingo, o padre Valmir Teixeira revelou que ele e uma assistente da paróquia foram ameaçados após tentar diálogo com o grupo. Como justificativa, o padre enfatizou que ninguém tem autorização para propaganda político-partidária dentro da igreja e em nome da paróquia.
“Conversei com o grupo, houve ofensa e, inclusive, ameaça a uma moça que achava errado eles fazerem aquilo. Foi ameaçada, o rapaz que estava ali disse a seguinte frase: Sei o caminho que você vai para casa e onde você mora. Ameaça direta. Eu recebi um ou dois telefonemas também com ameaças à minha integridade física. Mas eu não tenho medo. Continuarei defendendo a verdade do evangelho”, revelou.
O pároco ainda defendeu a liberdade, mas deixou clara a separação entre fé e política. “A igreja não é lugar de propaganda política, a igreja é lugar para rezar, temos opiniões, o que é lícito, que é da democracia, todo mundo tem direito à liberdade. Somos livres”, destacou.
Em outro trecho do vídeo, ele destaca que as religiões não podem ser usadas como ferramenta eleitoral. “Não podemos fazer com que a religião se torne um aparelhamento, não deixar que a nossa religião ou as religiões sejam aparelhadas. Isso é um mal para a sociedade. Vocês concordam comigo que não estamos elegendo o presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil)? Vamos eleger o presidente da República que vai governar, que deve governar, pois é o dever dele, para os católicos, para os evangélicos, para quem não processa fé, para todas as pessoas”, falou.
REPERCUSSÃO
Durante a Sessão da Câmara Municipal de Itajubá, na segunda-feira (24), diversos vereadores se posicionaram sobre o ocorrido com o padre Valmir Teixeira.
No Grande Expediente, o vereador Pedro Gama (PV), lamentou a situação e fez uso da palavra para acusar outro vereador, Rafael Rodrigues (União) de participar da distribuição dos panfletos na igreja. Confira neste link a partir da marcação de tempo 1:09:00.
“Aqui nesta Casa Legislativa, assim como em qualquer espaço democrático, temos opiniões e posições diferentes. E isto é saudável de acontecer num ambiente democrático, desde que mantida sempre a cordialidade e o respeito. Infelizmente, temos visto cenas lamentáveis de ódio, ataques e violências nos mais distintos lugares e dos mais distintos grupos. E muitas vezes, com incentivo e participação direta de representantes da população”, disse.
Segundo Gama, “cenas assustadoras de mentiras e violências por questões políticas lamentavelmente chegaram ao espaço das igrejas”. Ele afirma, ainda, que o panfleto citado “busca induzir de maneira ardilosa, desonesta e mentirosa o fiel a votar naquele candidato, tentando fazer acreditar que apenas este voto representaria a Igreja Católica. Uma confusão nefasta entre política e religião, baseada em mentiras que ofendem a liberdade política dos fiéis”.
O vereador informou, durante a sessão, que o material foi produzido sem qualquer identificação da gráfica como CNPJ e tiragem, podendo configurar crime eleitoral. De acordo com Gama, isso já foi denunciado à justiça eleitoral.
Ao final da fala, o vereador Pedro Gama diz “lamentar a participação do meu colega vereador Rafael Rodrigues na organização desta panfletagem”, se dirigindo a Rodrigues.
Já a vereadora Andressa Daiany (PT), do Mandato Coletivo Nossa Voz, também fez uso da Tribuna no Grande Expediente para demonstrar indignação com o ocorrido e questionou o financiamento da impressão do material gráfico ao vereador Rafael Rodrigues. “Quem financiou a impressão desses panfletos? Não sabemos. só sabemos que há vereadores auxiliando nessa distribuição. […] Esta ação constitui crime de assédio eleitoral religioso, sabia disso Rafael?”
DEFESA
Em seu momento de fala, o vereador Rafael Rodrigues se diz entristecido ao perceber que os colegas Andressa do Coletivo e Pedro Gama “não sabem ao certo o que de fato ocorreu na distribuição dos panfletos”. Segundo Rodrigues, o material gráfico foi distribuído não apenas na paróquia onde “houve a confusão”, mas em outras igrejas.
Ele explicou, ainda, que o grupo trata-se de um movimento de fiéis leigos independentes, formado por famílias cristãs, que decidiu produzir o folheto. Também, Rodrigues admite que o material é irregular, mas, segundo ele, não configura crime.
“O folheto é sim irregular, nós vimos isso depois que algumas pessoas nos questionaram sobre o CNPJ e a tiragem e isso será feito nas próximas campanhas, mas não é um crime eleitoral. […] O texto que está ali não é um texto mentiroso“. De acordo com Rodrigues, a Igreja Católica “instrui a não apoiar partidos de cunho socialista ou marxista”, segundo o magistério papal do Papa Leão XIII. Ainda, o parlamentar justifica a ação do grupo de famílias leigas em preceitos da CNBB. “Na política deve haver o protagonismo leigo”.
Rodrigues encerrou sua fala com solidariedade ao padre Valmir e se colocou à disposição para colaborar na apuração das ameaças que o pároco sofreu. “Se o reverendíssimo padre foi verdadeiramente insultado e agredido, tem também a minha solidariedade, o meu respeito e a minha amizade para irmos buscar se isso realmente ocorreu e fazermos um boletim de ocorrência porque isso não pode”, finalizou.
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