SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A reabertura das escolas em São Paulo abriu um novo flanco na desigualdade entre o ensino público e o particular. Enquanto unidades privadas chegam a registrar, em esquema de rodízio, a volta presencial de 70% a 100% dos alunos, na rede pública o retorno iniciou mais minguado.
Ao todo, 17% dos 3,5 milhões de estudantes das escolas estaduais voltaram à sala de aula na primeira semana do ano letivo. O dado relativo à segunda semana só será divulgado na terça-feira (23), segundo a Secretaria da Educação da gestão João Doria (PSDB).
Na rede municipal, a administração Bruno Covas (PSDB) diz estimar que 300 mil de 1 milhão de alunos (30% do total) frequentaram as aulas presenciais ao menos um dia na primeira semana do ano letivo, que acabou na sexta-feira (19).
Em colégios da rede particular, a realidade é outra. A reportagem procurou unidades da rede privada na capital paulista que atendem alunos de alto nível socioeconômico. Nove delas responderam e informaram uma adesão ao retorno presencial entre 70% a 100%. Para cumprir o decreto municipal que permite a volta só de 35% do alunado, essas escolas organizaram um revezamento das turmas para que todas as crianças interessadas pudessem retornar pelo menos um dia da semana.
No Gracinha, no Itaim Bibi (zona oeste de SP), a adesão ao retorno presencial oscilou de 80% a 100% dos estudantes, dependendo da série. Registraram números similares o Equipe (89%), o Lycée Pasteur (de 95% a 99%), o Mackenzie (91%), a rede Maple Bear (90%), o Pentágono (83%), o Rio Branco (84%), o Santa Cruz (95%) e o Santa Maria (70%).
A Prefeitura de São Paulo não conseguiu iniciar o ano letivo com todas as escolas prontas para receber os alunos. Nesta primeira semana, ao menos 580 unidades (cerca de 17% do total) continuaram fechadas por falta de condições adequadas, como ausência de equipes de limpeza e obras inacabadas -a Secretaria de Educação diz que o problema foi solucionado em 380 delas, onde as aulas começam na segunda-feira (22).
A greve deflagrada pelos professores da rede municipal é outro fator que impediu a retomada das aulas em algumas unidades. A prefeitura afirma que a adesão é baixa, já que o índice de faltas foi de cerca de 7%, o que é registrado em períodos normais na rede.
Mas na Emef (escola municipal de ensino fundamental) Jean Mermoz, na zona sul da cidade, as aulas não começaram para todas as turmas na última segunda-feira, já que não havia quem substituísse os professores que aderiram ao movimento.
Aline Vessoni, 36, conta que as aulas da filha, que tem sete anos e está no 2º ano, só começaram na quinta-feira, quando a professora retornou ao trabalho. “Eu apoio a greve, porque também não vejo condições adequadas para o retorno. Eu não vou mandar minha filha e não é certo obrigar os professores a se arriscarem dessa forma.”
Ela diz não acreditar que os protocolos de higiene e distanciamento serão seguidos na unidade, já que considera pequena a equipe de profissionais. “As escolas particulares têm funcionários, infraestrutura, protocolos bem elaborados. Se fosse a mesma situação na rede pública, eu ficaria tranquila. Mas sei que não é assim na escola da minha filha.”
Maria Amélia de Anísio, 37, também decidiu que seu filho de cinco anos não voltará para as atividades presenciais na Emei Sena Madureira, na zona sul, mesmo antes de saber que a unidade não teria condições de reabrir no dia 15. A escola é uma das unidades que estão sem contrato de limpeza.
“Ainda que resolvam essa questão dos faxineiros, não tenho segurança de deixar meu filho na escola. A volta não foi bem organizada e eu não vou arriscar”, disse.
A falta de confiança dos pais tem feito com que as escolas recebam menos alunos do que o planejado. Na Emei Francisco Manuel da Silva, na zona sul, a direção se organizou para receber 80 alunos por dia -dez em cada uma das oito salas. No entanto, na primeira semana de aulas, havia entre 40 e 50 crianças por dia na unidade.
A Secretaria Municipal de Educação não informou quantos dos 300 mil alunos que retornaram para as aulas presenciais são da educação infantil (dos 0 aos 5 anos), etapa em que não haverá rodízio. As escolas dessa etapa só vão atender apenas 35% das crianças, mesmo que o número de interessados seja maior. Serão priorizadas as que estiverem em situação mais vulnerável.
Sem atividades presenciais, os alunos continuarão a ter aulas a distância. O problema é que, ao longo do ano passado, muitos deles não realizaram as atividades remotas -30% no caso do ensino fundamental.
Pesquisador do Centro de Desenvolvimento da Gestão Pública e Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas, João Marcelo Borges integrou um grupo que estudou a questão em países europeus.
Ele diz ter observado que a chave para a adesão ao retorno presencial foi o convencimento das famílias pelas próprias comunidades escolares.
“O diretor ia à escola, fazia um vídeo e mostrava como seriam aplicados os protocolos”, diz. “Não é o secretário de Educação que vai gerar confiança, etamos em um momento da história em que a figura da autoridade está esfacelada. Mas, quando a informação vem dos pares, a chance aumenta.”
Foi o que fez o diretor Aldo Florentino, da escola estadual Eliza Rachel Macedo de Souza, em Lageado, no extremo leste de São Paulo.
A escola é de grande porte e atende alunos vulneráveis, duas características desafiadoras. Ainda assim, ela teve uma adesão maior do que as unidades do seu entorno, conseguindo atrair para as atividades presenciais 617 dos 2.300 alunos (27%).
Para chegar a esse número, Florentino chamou os pais ao colégio em pequenos grupos e mostrou as adaptações e reformas que foram feitas para garantir o cumprimento dos protocolos de segurança. Não ficou nisso: foi à casa dos que não quiseram comparecer.
Ele diz que um obstáculo que tem encontrado para aumentar a adesão ao retorno presencial são as notícias falsas sobre a pandemia que os pais estão recebendo. Ao contrário do que se pensava inicialmente, as crianças adoecem menos e transmitem menos o coronavírus. Pesquisas também mostram que as escolas são ambientes seguros se forem cumpridos protocolos de segurança, mas essas informações não têm chegado a muitas das famílias.
Para o diretor, ainda que os educadores estejam se desdobrando para garantir o atendimento aos alunos que continuarem a distância, quem voltar presencialmente vai estar em vantagem sobre os demais. “O estudante que está na sala de aula consegue resolver sua dúvida em tempo real. A informação que chega primeiro é absorvida mais rápido.”
Subsecretário da Secretaria Estadual da Educação, Patrick Tranjan disse que a adesão ao retorno presencial superou as expectativas da pasta. Segundo ele, a projeção é que a procura dos alunos aumente com o tempo, à medida que as famílias ganhem confiança.
Para Tranjan, parte do retorno tímido na rede estadual se deve também ao fato de o ano letivo na capital paulista ter começado uma semana depois, o que teria levado alguns pais a esperar para não deixar só um irmão em casa.
Ele ressalta que a merenda e o transporte escolar para quem mora a mais de 2 km da escola estão à disposição dos alunos que quiserem voltar à sala de aula.
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Em SP, escolas públicas têm menor adesão à volta presencial do que as particulares
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A reabertura das escolas em São Paulo abriu um novo flanco na desigualdade entre o ensino público e o particular. Enquanto unidades privadas chegam a registrar, em esquema de rodízio, a volta presencial de 70% a 100% dos alunos, na rede pública o retorno iniciou mais minguado. Ao todo, 17% […]
- Por Mídias Digitais
- 21 de fevereiro de 2021
- 4 anos ago
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