A rotina de trabalho é puxada, são até 12 horas de segunda a domingo percorrendo as ruas de Araraquara levando comida, remédios e outras mercadorias para a população.
As moto entregadoras, ou motogirls, estão cada vez mais presentes no dia a dia do trânsito da cidade, e são parte da linha de frente na pandemia do coronavírus com as entregas e riscos diários.
Com os restaurantes e bares fechados para atendimento presencial devido ao decreto municipal que visa evitar a transmissão da covid-19, o número de entregas/delivery aumentou consideravelmente.
Ingrid Sampaio, de 20 anos, faz parte de um grupo cada vez mais crescente de mulheres que fazem entregas em Araraquara.
A motogirl conta que sempre curtiu motos e em agosto do ano passado tirou a sonhada carteira de motorista na categoria A.
Com uma moto na mão e sem emprego, começou a fazer entregas em janeiro deste ano. E foi desta forma ganhou experiência no trânsito.
“Não queria procurar um CLT por conta do que estamos passando e estava muito difícil arrumar emprego. Como gosto muito de moto uni o útil ao agradável, vi que como motogirl dava pra tirar um dinheiro”, diz.
Ingrid conta que enfrenta discriminação, chuva, sol e desrespeito de motoristas no trânsito. Mas diz que está na profissão para quebrar esse tabu e fazer o que gosta.
“Quando comecei tinham umas cinco mulheres só, agora vejo que aumento bastante. As mulheres veem a gente correndo e criam uma coragem pra começar, porque existe um certo tabu de ver mulher fazendo entrega porque geralmente é só homem que faz, e viemos pra quebrar esse tabu”, aponta.
MAIS RESPEITO
A motogirl Taís Macedo de Miranda, 27 anos, começou na profissão em fevereiro de 2020, na pré-pandemia e não parou mais.
Estimulada por vídeos e comentários positivos sobre renda mais estável com a moto, ela começou a pilotar. Já passou por dois acidentes, mas não pensa em “reduzir a marcha”, já que a moto é sua única fonte de renda.
“Fiquei três meses afastada, machuquei a boca, rosto, tudo nas entregas. Falta muito respeito no trânsito com a gente”, diz.
A entregadora Ingrid também reforça que um dos maiores problemas é o desrespeito no trânsito da cidade.
Ela já sofreu um acidente na volta de uma entrega e diz que costuma parar até em rua que não tem placa de pare.
“Motoristas não respeitam o sinal, placa de pare, e acham que todos motoboy andam sempre correndo e desrespeitando tudo. Quando motoristas avançam sinal e batem na gente ainda saímos como culpados, isso traumatiza”, conta.
FREIO NO PRECONCEITO
Uma outra questão que elas vivenciam é a discriminação na rotina de entregas. Algumas são mais difíceis de lidar e geram até questionamento entre elas sobre a profissão em duas rodas.
“É um pouco difícil lidar com algumas pessoas, porque acham que somos o próprio vírus”, lamenta Taís.
Elas reforçam que tomam todo o cuidado para trabalhar, e seguem fielmente as normas sanitárias.
Ingrid cobra mais conscientização e apoio das pessoas e frisa que quem corre risco na pandemia são elas ao cruzarem a cidade toda levando alimentos e bebidas para as nossas casas.
“As vezes bate uma tristeza e nos perguntamos se é isso mesmo que a gente quer. As pessoas tem que reconhecer que é a gente que está levando alimento para elas nessa situação de pandemia enquanto estão em casa protegidas. Estamos correndo risco levando alimento pra elas, elas precisam se conscientizar mais, apoiar o entregador e reconhecer nosso trabalho”, diz.
Ela informa que fazer uma avaliação positiva nos aplicativos já colabora bastante para o trampo fluir melhor.
“A avaliação é a melhor coisa porque as vezes sofremos acidente e ficamos paradas, e o score fica baixo por não corrermos durante um período”, explica.
AMIZADES
Às vezes quando um pneu estoura ou algum acidente acontece em questão de minutos há entregadores para ajudar. A amizade e união entre eles é forte e necessária no dia a dia.
“A gente faz muita amizade, tem parceria, todo mundo é parceiro e conhecemos todo o canto da cidade”, enfatiza Ingrid.
Para Taís, eles são como uma família: acolhem e se ajudam sempre.
“98% é homem mas somos uma família, somos acolhidas, se fura um pneu, já tem 10 ajudando. O fato de ser mulher não sei se faz diferença mas sempre somos acolhidas e nos apoiam”, finaliza.