O Dia da Consciência Negra, celebrado neste 20 de novembro, representa a luta contra a discriminação e a desigualdade racial. Artistas de Araraquara disseram ao ACidade ON o que a data representa para cada um deles e quais conquistas ainda faltam para a população negra do país. Confira:
NILCEIA VICENTE
A atriz Nilceia Vicente, 43 anos, acredita que o dia 20 de novembro deve ser comemorado como marco de resistência e luta, para que o movimento negro possa sempre se organizar em relação às frequentes tentativas de apagamentos de suas lutas na história brasileira.
“O movimento negro sempre foi muito atuante, temos vários exemplos na história de figuras que sempre levantaram a voz para falar sobre, para e com a comunidade negra. E algumas dessas figuras não estão nos livros de história, não fazem parte com valor e reverência que se deve nos livros de história, nas escolas, nos lugares onde são extremamente necessárias. Esse dia é para celebrar todas essas figuras que cotidianamente fazem esse trabalho de elevar a autoestima da população negra, que é majoritária no Brasil, mas vive sob controle de uma política e uma estrutura extremamente violentas. Mas que, ainda assim, constroem lindamente a identidade desse país com alegria, sabedoria, conteúdo e consistência. É por isso que seguimos nos fortalecendo e nos reconhecendo como figuras atuantes e pensantes na sociedade”, avaliou.
Em sua avaliação, falta hoje no Brasil uma consciência coletiva mais ampla sobre o que é o racismo, a partir da reflexão e de ações afirmativas de toda a sociedade.
“O racismo não é um problema dos negros, é da sociedade como um todo. E o dia 20 de novembro vem trazer a consciência dessa luta, de que devemos ampliar o debate no processo de educação junto às comunidades na base, para que crianças possam crescer de forma mais saudável, reconhecendo e amando nossa história. E que ela seja refletida e debatida à exaustão, até que algumas soluções possam vir à tona e seja reduzido o risco de mortes físicas e sociais”, concluiu a artista.
Nilceia iniciou sua carreira nas oficinas culturais de Araraquara e se formou na Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo (USP). Integrante do Grupo 59 de teatro coletivo de atores. Entre seus trabalhos mais recentes estão os espetáculos teatrais Floresta, com direção de Alexandre Dal Farra; Terror e Miséria no Terceiro Milênio, com o Grupo Bartolomeu de Depoimentos, Stellas Pretas Claridade e Luz, com direção de Geogette Fadel e o filme 7 Prisioneiros, com direção de Alexandre Moratto (Netflix).
KHAL DIAS
Para o músico, produtor e compositor Khal Dias, 40 anos, celebrar o Dia da Consciência Negra remete ao simbolismo da resistência e da coragem.
“É óbvio que não é um dia que exemplificará toda a luta de um povo, ou muito menos maquiar todas as mazelas que a comunidade afro ainda enfrenta. Mas, nos traz a certeza que ainda há muito por ser conquistado e que a força da mudança está em nós mesmos”, avaliou o artista araraquarense.
Em 15 anos de carreira, Khal tem pautado sua atuação nas artes de forma geral, com enfoque nas temáticas étnico-raciais e sociais. Vem contribuindo com composições e militância para um olhar cuidadoso sobre as mazelas da periferia, principalmente por meio da música.
Militante do movimento Hip Hop, possui trabalhos de relevância sociocultural e dividiu palco com artistas do cenário nacional, como Monkey Jhayam, Rappin Hood, Flavio Renegado, Liniker e Funk Buia.
Em estúdio, realizou gravações com artistas com Nomadebeatz, Pedro Neves, Emana, Amon Poeta e Enemeya Queen, entre outros. Recentemente teve a música Torre de Babel regravada pela banda BatMacumba Samba Reggae.
Atualmente Khal Dias integra o coletivo Projeto R (Rap, Raiz e Rua) e é vocalista da Banda BR21.
NALA SUÊ
A multiartista e ativista política araraquarense Nala Suê, 24 anos, não vê a data como celebração, mas sim como um dia de grande reflexão, união das lideranças negras e responsabilidade.
“Dia 20 de novembro para mim e minha família é dia de luta e memória a Zumbi dos palmares, vamos a tradicional marcha na cidade e nos aquilombamos para cuidarmos de nós e nos mantermos vivos em um país que ainda mata e explora preto seja criança ou adulto”, apontou.
Para a ativista, o dia de ter “consciência” é todo dia, e reforçou a importância dos debates, manifestos culturais, ocupação de posições e espaços da comunidade negra.
“Neste dia o povo preto brasileiro em mais de mil cidades vive um feriado com promoção de fóruns, debates, manifestos culturais, que buscam dar continuidade a luta pela vida e direito de existir do povo preto. Para alguns de nós, principalmente os pretos, o dia de ter consciência é todo dia. Mas nesta data, o racismo está em pauta e na agenda de muitos que modificam o sistema, principalmente por ter se tornado um feriado”, refletiu.
Ela ainda questionou a romantização dos feriados brasileiros e o genocídio da população negra, além de enfatizar a união da comunidade.
“Neste dia é importante sabermos nos articular e fortalecer aquele que se articula contra o genocídio da população e a melhoria para a comunidade. Que nossa união não seja romantizada pela celebração dos feriados brasileiros. Como uma pessoa preta e consciente de quem sou, digo: A nossa união neste dia é necessária para a continuidade de um legado. Ubuntu!”, arrematou.
Nala Suê é uma atuante e talentosa multiartista no cenário de Araraquara que se inventa como cantora, poeta, compositora, atriz e produtora. A ativista política também já disputou uma cadeira da Câmara dos Vereadores na última eleição.
FABY D´KÀSYAH
Para a professora de dança do ventre afro Fabiana de Cássia Guedes, a Faby D´Kàsyah, o Dia da Consciência Negra representa principalmente a memória de Zumbi e a bravura de Dandara, entre outros que lutaram pelo fim da escravidão. Um marco por equidade e importância histórica.
“A data é um marco para evidenciar as nossas ações e lutas por equidade. Mas com certeza, se trata de resgatar nossa origem, ancestralidade, espiritualidade, reconhecer nossa grandeza, realeza, beleza, a nossa importância histórica como criadores e precursores, como grandes civilizações”, avaliou.
Ela também comentou sobre o que acredita ser o despertar da consciência do povo preto e ocupação dos espaços.
“Pessoalmente falando, acredito no despertar da consciência do povo preto. Acredito que consciência negra não se trata de mendigar aceitação ou pedir permissão para estar vivo. Não se trata de convencer a sociedade racista a evoluir mentalmente. A descolonização da mente do nosso povo é um processo lento graças à mídia, ao sistema de ensino etc. Mas avançamos a cada dia. E é desta maneira que ocuparemos todos os lugares”, avaliou.
Faby D’Kàsyah iniciou os estudos com dança do ventre movida pela paixão ao antigo Egito em 2002.
Em 2008, foi a 2ª bailarina de Dança do Ventre de Araraquara a conquistar o Selo de Qualidade em Dança do Ventre “Khan El Khalili”, que é a qualificação de excelência em aulas e apresentações de nível internacional.
Já atuou como arte educadora voluntária e hoje atua nas Oficinas Culturais Municipais e no Centro de Referência Afro através de projetos culturais.
“Utilizo a dança do ventre como militância e almejo resgatar as suas reais origens africanas”, concluiu.