O contato íntimo – que inclui relações sexuais -, de pele com pele, com lesões de pessoas contaminadas, é apontado como a principal forma de transmissão da varíola dos macacos no surto atual, conforme especialistas.
Beijar, abraçar e, principalmente, ter relações sexuais com pessoas com diagnóstico positivo, são consideradas atividades de risco e devem ser evitadas.
Porém, medidas como uso de máscaras e preservativos, higienização de mãos e o não compartilhamento dos chamados fômites (objetos capazes de transportar patógenos, como lençóis e toalhas) também podem ajudar a evitar a contaminação.
Isso porque, explicam, outras formas de transmissão são conhecidas ou estão sendo estudadas.
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Crianças com menos de oito anos, gestantes e imunodeprimidos – pessoas que passaram por transplante, em tratamento oncológico ou que tiveram diagnóstico positivo para HIV, por exemplo – devem ter cuidados redobrados, uma vez que são mais suscetíveis a quadros graves da doença.
Alguns especialistas também indicam que homens que fazem sexo com homens (HSH) também precisam estar atentos, visto o risco de exposição. Conforme dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), eles representam 98% dos casos.
Por ora, a OMS não recomenda vacinação em massa, principalmente pela indisponibilidade de imunizantes.
Os especialistas ouvidos pelo Estadão concordam com a orientação e apontam que alguns grupos deveriam ser priorizados em uma fila de vacinação, como profissionais que manipulam vírus em laboratório e contatos de pessoas com diagnóstico positivo.
Testar casos suspeitos e obter diagnósticos com agilidade é crucial para controlar a doença, defendem os profissionais de saúde. Só deve buscar testagem, orientam, pessoas que apresentem erupções cutâneas.
O único teste disponível é de biologia molecular – mesmo método do teste PCR para o coronavírus – e depende de secreções dessas lesões, coletadas com swab (bastão), para análise.
Os especialistas destacam que os conhecimentos em relação à doença têm mudado conforme surgem novas informações – de forma relativamente semelhante ao que ocorreu com a covid-19 -, o que pode levar à atualização de orientações.
Isso porque, embora a varíola dos macacos tenha sido identificada em humanos ainda em 1970, as características do novo surto têm se mostrado diferentes.
CONTATO ÍNTIMO
A infectologista Raquel Stucchi, da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), destaca que, no surto atual, há quatro formas de transmissão. “A principal delas é, sem dúvida nenhuma, o contato íntimo, de pele com pele, com a lesão”, afirma. “A lesão transmite até que a casquinha caia e tenha a pele boa embaixo.”
Evitar contato íntimo com pessoas contaminadas, portanto, é a principal forma de prevenção. Parece simples, mas não é bem assim, uma vez que reconhecer o quadro pode ser uma dificuldade.
Raquel destaca que pode haver confusão, pois as erupções na fase inicial, às vezes, parecem com espinhas ou pelos encravados.
Também infectologista, Renato Kfouri acrescenta que dois terços das pessoas vão apresentar menos de dez lesões – bem diferente de fotos antigas que ilustram a doença.
“Muitas vezes há demora no reconhecimento e na suspeição de casos, e consequentemente, o número de infectados e transmissão aumentam”, diz o médico, da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm)
Essa dificuldade de reconhecimento leva à recomendação de reduzir a atividade sexual com múltiplos parceiros, principalmente desconhecidos. A OMS já fez essa recomendação a homens que fazem sexo com homens – que representam 98% dos casos.
Os especialistas ouvidos pelo Estadão indicam que essa mudança de comportamento sexual pode ser adotada pela população em geral para reduzir o risco de exposição.
Isso porque qualquer um pode se contaminar, independente da orientação sexual – prova disso, apontam, os casos confirmados de crianças, mesmo que precisem ser mais bem estudados.
NÃO COMPARTILHAR TOALHAS, LENÇÓIS E LAVAR AS MÃOS
Outra possível forma de transmissão se dá por meio do compartilhamento de objetos.
“É a transmissão por objetos inanimados pelos quais se pode transmitir um vírus que é resistente no ambiente”, explica o virologista Fernando Spilki. Por isso, é recomendado evitar o compartilhamento de lençóis, fronhas, copos e roupas, por exemplo, principalmente com pessoas com diagnóstico positivo.
Raquel acrescenta que também pode haver a transmissão por meio de superfícies contaminadas. “Mas a superfície tem de estar contaminada com a secreção da lesão.
” Nesse sentido, higienizar as mãos é importante. Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), nos Estados Unidos, orientam que usar água e sabão ou desinfetante (para as mãos) à base de álcool. “Especialmente antes de comer ou tocar no rosto, e depois de usar o banheiro”, diz o órgão.
GESTANTES
Uma pessoa grávida pode passar o vírus ao feto por meio da placenta, conforme o CDC.
Na segunda-feira, o Ministério da Saúde publicou nota técnica com cuidados específicos para esse grupo, que também está entre aqueles com risco de quadro grave da varíola dos macacos. Entre os cuidados recomendados pelo governo federal, estão o uso de máscaras em ambientes fechados, o uso de preservativos em relações sexuais (vaginal, anal e oral) e evitar contato com pessoas contaminadas.
USO DE MÁSCARAS
Ainda há, conforme Raquel, a possibilidade de transmissão respiratória. O CDC informa que a frequência pela qual a doença é transmitida por secreções respiratórias e até quando uma pessoa com sintomas pode espalhar o vírus por essa via são estudadas por cientistas.
Por ora, segundo Raquel, a transmissão respiratória ocorre por meio de gotículas, que são “partículas mais leves que não alcançam grandes distâncias”.
O contato, explica, deve ser muito próximo e prolongado. Nesse sentido, por precaução, ela acha válido o uso de máscaras em locais fechados e de aglomeração, principalmente por crianças, gestantes e imunodeprimidos.
USO DE PRESERVATIVO
Em nota técnica divulgada para as gestantes, na segunda-feira, o Ministério da Saúde recomenda ainda o uso de preservativos.
Segundo Raquel, essa recomendação foi dada por não se saber ao certo se a varíola dos macacos pode ser transmitida por esperma ou secreção vaginal – DNA do vírus já foi encontrado no sêmen. Por enquanto, a doença não é considerada sexualmente transmissível.
Kfouri afirma, no entanto, que o uso de preservativo “sempre deve ser intensificado”, uma vez que ajuda a prevenir também “outras doenças”, como a aids, por exemplo.
TESTES
Conforme o Ministério da Saúde, o Brasil indica apenas testes de biologia molecular para diagnóstico da doença. Testes sorológicos e de antígeno – recursos de diagnóstico rápido – ainda não estão disponíveis.
A análise é feita de amostras das feridas coletadas por swab (bastão). Por isso, especialistas orientam que só busquem pela testagem pessoas que estejam com feridas. Além disso, eles indicam a necessidade de expandir a disponibilidade de testes e aumentar a agilidade de diagnósticos.
VACINAÇÃO
Há duas vacinas desenvolvidas para combater a varíola humana (smallpox), a ACAM2000 e a MVA-BN, que se mostraram eficazes contra a monkeypox, conforme o Ministério da Saúde. Elas ainda não estão disponíveis no Brasil.
A OMS não recomenda a vacinação em massa contra a varíola dos macacos, principalmente pela indisponibilidade de grandes quantidades do imunizante. As poucas doses disponíveis, indicou o diretor-geral, Tedros Adhanom, devem ser direcionadas a quem teve contato com pacientes da doença ou com grande risco de exposição, como profissionais da saúde, funcionários laboratoriais e pessoas com múltiplos parceiros sexuais.
Kfouri concorda. Aponta que, por ora, mesmo que tivéssemos “milhões de doses”, não é o momento de imunização em massa. “A gripe mata muito mais, por exemplo. Não faz sentido você fazer uma vacinação universal de uma doença que tem uma letalidade baixa.” Conforme a OMS, a taxa de letalidade da doença está entre 3% e 6%.
Raquel acrescenta que, em uma fila de vacinação, o grupo de homens que fazem sexo com homens deve ser priorizado. A cidade de Nova York já vacina o grupo, e o Reino Unido expediu recomendação para a priorização dele ainda em junho.
GRUPOS VULNERÁVEIS
Segundo a OMS, crianças, grávidas e imunodeprimidos têm risco aumentado para casos graves da doença. Especialistas destacam que essas pessoas precisam redobrar cuidados.
“Temos hoje dois grandes receios em relação ao que pode acontecer em termos de óbito, e eles residem em pacientes imunossuprimidos: pacientes HIV positivo e em tratamento de câncer ou com alguns tipos específicos de câncer, como linfoma”, afirma Spilki.
Raquel aponta que imunodeprimidos e crianças deveriam ter sido incluídos na nota técnica para gestantes. E também destaca que a pasta deveria emitir recomendações específicas para homens que fazem sexo com homens. “Essas pessoas, às vezes, não vão procurar infectologista, vão procurar urologista, proctologista, talvez médico da família, que não estão, muitos deles, orientados sobre o momento e o impacto dessa doença.”
Graus de risco de exposição
Quem teve contato com pessoas que receberam diagnóstico de varíola dos macacos – mesmo que usando equipamentos de proteção individual (EPI) apropriados -, devem ser monitoradas e ficar atentas quanto aos sintomas durante 21 dias após a exposição, conforme o CDC. Manifestações clínicas como febre, arrepios e erupções cutâneas são sinais de alerta.
O CDC classificou o grau de risco de exposição de algumas atividades:
– Grau de exposição alto
Contato desprotegido entre a pele ou mucosas de uma pessoa e a pele, lesões ou fluidos corporais de um paciente com diagnóstico positivo; contato desprotegido com materiais contaminados, como lençóis e roupas; estar no quarto do paciente ou a menos de 1,8 m dele durante procedimento que possa criar aerossóis de secreções orais, lesões de pele ou ressuspensão de exsudatos secos (por exemplo, sacudir lençóis), sem usar um máscara N95 e proteção para os olhos.
– Grau de exposição intermediário
Ficar a menos de 1,8 m por 3 horas ou mais de paciente sem máscara, sem usar também proteção facial; atividades que resultem em contato entre as mangas e/ou outras partes da roupa, e as lesões de pele ou fluidos corporais do paciente, ou seus lençóis, curativos sujos, enquanto estiver usando luvas, mas sem avental.
– Grau de exposição baixo/incerto
– Entrar no quarto do paciente sem usar proteção para os olhos em uma ou mais ocasiões, independentemente da duração da exposição; durante todas as entradas na área de atendimento ao paciente, usando avental, luvas, proteção para os olhos e, no mínimo, máscara cirúrgica; ficar a menos de 1,8 m de um paciente sem proteção facial por menos de 3 horas, sem usar no mínimo, uma máscara cirúrgica.
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