BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Na segunda rodada de reuniões com o BC (Banco Central), realizada nesta quinta-feira (19), analistas do mercado financeiro mostraram preocupação não só com a persistência da inflação e com o risco fiscal, mas também o desempenho da atividade econômica em 2022, que deve ser mais fraco que o esperado.
Participantes relataram à reportagem que a maior parte dos economistas indicou que fará novas revisões para baixo de suas projeções para o PIB (Produto Interno Bruto) do ano que vem. No boletim Focus desta semana, em que o BC divulga as estimativas do mercado, a expectativa era de crescimento de 2,04% e, segundo um participante, muitos analistas já preveem elevação em torno de 1,5%.
A percepção é que, como a inflação não cede, a autoridade monetária terá que aumentar ainda mais os juros. Com a atividade ainda em recuperação, o aperto monetário afetaria muito o crescimento econômico.
O resultado é uma inflação acima da meta, mas dentro do intervalo de tolerância, mas que gera um efeito danoso na atividade, contou um participante, que preferiu não ser identificado. Segundo este participante, o piso para a Selic ao fim de 2021 foi de 8% entre os participantes poucos ainda veriam a taxa em 7,5%.
Para 2021, há consenso no mercado e no BC de que a inflação deverá estourar a meta fixada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), de 3,75% com 1,5 ponto percentual de tolerância para cima e para baixo.
Hoje, o Copom (Comitê de Política Monetária) do BC já mira a inflação de 2022 e 2023, no chamado horizonte relevante, para quando o comitê entende que a política monetária pode fazer efeito, com metas de 3,5% e 3,25%, respectivamente.
Na semana passada, o Copom elevou a Selic em 1 ponto percentual, maior alta em 18 anos. Os juros foram para 5,25% ao ano. Para a próxima reunião, em setembro, o Comitê indicou que fará nova alta na mesma magnitude.
De acordo com o Focus, a expectativa é que este ano encerre com alta de 7,05% no índice de preços, acima do máximo definido para 2021, de 5,25%. Para 2022, a expectativa é de 3,90%.
Outro participante afirmou que a preocupação com as contas públicas, com a inflação e as incertezas geradas em meio à pandemia de Covid-19 com a variante Delta “assustando” também foram tema do encontro.
Além disso, há preocupação com a atividade em 2022, que vem sendo tema de grande debate, pontuou o participante.
Este é o segundo dia de reuniões fechadas com economistas, que são divididas em três grupos. O primeiro encontro ocorreu nesta quarta-feira (18) e os outros dois ocorreram nesta quinta pela manhã e à tarde.
No primeiro dia os analistas avaliaram que a economia está entrando em ritmo de eleição, o que deve pressionar por mais gastos e colocar o lado fiscal em risco, além de gerar mais inflação.
Nessas reuniões, que ocorrem a cada trimestre, o BC não se pronuncia, apenas ouve análises, demandas e preocupações dos economistas. Os encontros antecedem a publicação do Relatório de Inflação.
Nesta quinta, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou na Comissão de Relações Exteriores do Senado que os juros podem voltar ao patamar de dois dígitos.
“Juros de dois dígitos não têm quase em lugar nenhum do mundo. Nós com a nossa confusão aqui já estamos começando a empurrar os juros para dois dígitos de novo. Se a gente trabalhar sério, vacinar, baixar a bola, esperar a próxima eleição, juro fica de um dígito”, disse.
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou em eventos dos quais participou ao longo da semana que os ruídos fiscais em torno do novo Bolsa Família, o Auxílio Brasil, e outras medidas anunciadas pelo governo foram responsáveis pela elevação das expectativas do mercado para a inflação de 2022 acima do projetado pela autoridade monetária.
Na simulação do BC, a inflação deve ficar no centro da meta no próximo ano, que é de 3,5% com tolerância de 1,5 ponto percentual para cima e para baixo.
“Reconhecemos que há grande quantidade de ruído em torno do Bolsa Família e de novas medidas que o governo divulgou”, afirmou na terça-feira (17), em referência também à PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos precatórios (dívidas do governo na Justiça).
“Esse ruído recente em torno de como o novo Bolsa Família será está gerando muito barulho nos dados, isso é um fato. O governo tem que passar uma mensagem forte em relação a isso”, reconheceu Campos Neto.
Nesta quinta, o titular do BC reafirmou que o ruído fiscal é predominante nas expectativas de inflação e indicou que isso também tem gerado as revisões para baixo para o crescimento do PIB de 2022.
Segundo Campos Neto, o mercado relaciona o novo programa social às eleições do próximo ano. Para ele, quando o governo explicar como será pago e esclarecer que a medida não deve impactar as contas públicas, o ruído deve diminuir.
“Assim que o governo explicar o que é o Bolsa Família e como será pago, além de esclarecer que não vai ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal ou todos os elementos fiscais que estamos olhando, isso ficará mais claro [para o mercado]”, pontuou.