À frente do Ministério da Agricultura há pouco mais de um mês e com tempo escasso para entregar o Plano Safra 2022/23, até junho, Marcos Montes se diz “animado” para fazer algo “robusto”, ainda que “dentro do possível”. Em entrevista ao Estadão/Broadcast, Montes, que antes era secretário executivo da ex-ministra Tereza Cristina (que saiu para concorrer às eleições), disse que pretende manter as taxas de juros “abaixo da casa dos dois dígitos” e que, entre manter as taxas baixas (atendendo um número menor de produtores) e ter taxas “um pouco mais ardidas” (e suprir um número maior de agricultores), prefere a segunda opção. Segundo Montes, o abastecimento de fertilizantes ainda preocupa, embora em menor escala. A pasta continuará trabalhando em duas frentes: importar mais adubos e estimular a produção interna. A seguir, os principais trechos da entrevista.
O Orçamento de 2022 não prevê recursos para a equalização de taxas de juros do Plano Safra 2022/23. De onde poderá sair o dinheiro?
O Plano Safra 2022/23 é o assunto mais delicado para nós hoje. A discussão sobre a equalização parte do valor que trabalhamos no Plano Safra passado, em torno de R$ 13 bilhões. Em cima disso, temos de jogar o diferencial de juros do ano passado para este, de 3% a 3,75% ao ano para 12%. E tem também os custos da produção, que aumentaram muito.
A OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras) diz que, para oferecer o mesmo montante do ano passado, com correção e aumento da Selic, seriam necessários cerca de R$ 19 bilhões. O sr. vê de onde poderia remanejar o dinheiro?
A Economia vai ter de se movimentar para buscar. Precisamos fazer um Plano Safra que condiga com a realidade do Brasil, e já começamos um pouco atrasados. Falamos com o presidente da República, e ele tem pedido que isso seja quase que prioridade na Economia.
O aumento das taxas de juros do Plano Safra é dado como certo? O ministério avalia fazer aumento maior para os grandes produtores?
Essa discussão terá de ser muito madura. O juro muito baixo vai fazer com que os recursos sejam menores, e atenderíamos menos gente. Os juros um pouco mais ardidos ampliariam os empréstimos. Hoje, quando o produtor vai captar em qualquer ente privado, a taxa bate em 16%, 17%, até 20% ao ano. Vou trabalhar para que as taxas fiquem abaixo da casa de dois dígitos.
Ainda há preocupação do governo com o abastecimento de fertilizantes?
Estamos preocupados, mas estivemos mais preocupados há um mês. O fluxo (de embarques russos) está normal e estamos abrindo mercados. Estou indo para a Jordânia, o Egito e o Marrocos para falar de fertilizantes.
Além do Canadá, já visitado, e dos países árabes que receberão a comitiva brasileira, há algum outro país em vista com potencial de ampliar a exportação de fertilizantes para cá? A China está no radar?
Todos países são potenciais. A ex-ministra Tereza Cristina esteve no Irã também, que tem grande potencial de nitrogenados. Estamos fazendo prospecção no Chile. Tudo está no radar. Como se criou um núcleo de fertilizantes, para a formação do Plano Nacional de Fertilizantes, tudo passa por um grande estudo do grupo, e seguimos essa linha estabelecida tanto na produção interna quanto na busca lá fora.
Em relação à China, recentemente houve suspensão de habilitações de frigoríficos brasileiros. A ex-ministra Tereza Cristina vinha falando das tratativas de retomada das habilitações para cerca de 50 novas plantas. Na avaliação do sr., o que está por trás da decisão da China?
Temos hoje quase 100 plantas habilitadas para a China. Algumas foram desabilitadas, sujeitas a verificações e auditorias. Acho que vamos crescer nas nossas exportações para a China e temos plantas preparadas e já auditadas. Temos uma lista que totaliza 79 novas plantas em três novas etapas, nas quais estamos trabalhando para que sejam habilitadas. Sobre as desabilitadas, temos de entender o momento que a China está vivendo. (Os chineses) estão extremamente preocupados com a onda de covid-19, e precisamos respeitar. Todas essas plantas desabilitadas são casos em que foram encontrados traços de RNA de vírus nas embalagens das carnes enviadas. É excesso de zelo? Não, é a filosofia deles. As desabilitações são em porcentual pequeno perto do número de plantas que temos e do crescimento que tivemos. Com o consumo lá aumentando, eles vão precisar dos nossos produtos e o Brasil está preparado para poder exportar ainda mais.
Sobre a inflação dos alimentos, dentro do que compete ao ministério, o que pode ser feito? As ações passam por restrição a exportações para garantir abastecimento interno?
Custamos a sair (da posição) de um país importador de alimentos para exportador. Acredito ser opinião de todo o setor e do governo que isso (restringir exportação) jamais acontecerá. Outro ponto é que exportamos em média de 20% a 25% de tudo que produzimos, e o restante fica para consumo interno. Temos é de estimular a produção. Quanto mais produzirmos, mais vamos combater a fome no mundo e internamente. Nossa produção está crescendo. Apesar de tudo que estamos passando, acho que o agro ainda será por muito tempo a locomotiva da agricultura brasileira.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.