Crítica contumaz e histórica dos juros altos, a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), sob a nova direção do industrial Josué Gomes da Silva, quer voltar a ser influente no debate nacional e defende agora um alinhamento maior das políticas de juros e fiscal. Ao assumir o comando da Fiesp, representada por um imponente edifício na Avenida Paulista, Josué escolheu ainda o aumento da produtividade como foco da nova agenda, com medidas diretas para a melhoria da educação no Estado de São Paulo.
Josué chamou a atenção ao promover uma oxigenação nos 14 conselhos superiores da entidade, que ganharam maior relevância. Eles serão responsáveis pela definição de diretrizes da Fiesp nos temas de política econômica – o que não ocorria antes. O conselho tem nomes que vão desde o apresentador Luciano Huck (que encomendou uma série de estudos sobre a economia brasileira na época em que cogitava concorrer à Presidência), o ex-presidente Michel Temer, o economista André Lara Resende e Luciano Coutinho, que presidiu o BNDES no governo Lula.
O conselho de infraestrutura, presidido pelo empresário Murilo Lemos dos Santos Passos, ex-presidente da Suzano, terá papel central. O diagnóstico é de que não dá para ser produtivo da porta para dentro da empresa se para fora da fábrica a infraestrutura ruim do País destrói a competitividade dos produtos nacionais.
O “conselhão” da Fiesp tem também Fábio Barbosa (ex-presidente do Santander e nome muito ligado ao meio ambiente) e Pedro Wongtschowski (da Ultrapar e um dos mais vocais críticos da gestão anterior).
O Estadão conversou com empresários na semana passada, que se manifestaram otimistas com os rumos da Fiesp pela primeira vez em muito tempo. Todos ressaltaram que o momento agora é de “resgate”, após um período em que as pautas da Fiesp se misturaram ao projeto político-partidário do ex-presidente Paulo Skaf.
CONFIANÇA. “Pelo que tenho visto, vale dar um voto de confiança para a gestão do Josué, que está tentando fazer um trabalho propositivo para São Paulo e o Brasil”, disse Horácio Lafer Piva, acionista da Klabin e ex-presidente da Fiesp. “Parece que ele vai ficar menos preso aos sindicatos (patronais). A Fiesp vai procurar estar junta a outros formadores de opinião.”
Ao ouvir uma variedade de empresários e se aproximar de entidades de classe, como a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), a intenção seria recuperar a relevância da Fiesp no debate nacional. Uma das dificuldades nesse quesito, disseram algumas das fontes, seria enfrentar a tendência “cartorial” dos sindicatos patronais que detêm os votos para eleger a liderança da Fiesp.
A aproximação com vozes mais variadas, também em posicionamento político, mostra ainda um afastamento da Fiesp do presidente Jair Bolsonaro (PL) após a fase em que Skaf adotou uma estratégia de apoio ao governo atual – até porque, por ora, Lula é quem está em primeiro lugar nas pesquisas.
Há quem reclame, porém, de falta de trânsito com a nova direção. Presidente da Abrinq, que reúne a indústria de brinquedos, Synésio Batista da Costa lamenta que Josué não tenha procurado empresários de 15 setores ligados à Fiesp nem mesmo por e-mail. “Ao não encontrar eco, os sindicatos foram cuidar da vida”, diz Synésio, que conta ter negociado diretamente com o ministro da Economia, Paulo Guedes, benefícios como redução do IPI e extensão de prazo para pagar imposto.
PARCERIA. Em outra frente, o novo presidente da Fiesp acertou com o presidente da Febraban, Isaac Sidney, a criação de um grupo de trabalho para discutir as causas dos juros altos e apontar propostas a serem levadas ao governo e ao Congresso.
O acordo causou estranheza entre alguns associados mais antigos, que lembram dos conflitos por causa das dificuldades de financiamento, reflexo do ambiente de juros altos do País que se repete atualmente. Essa “velha guarda” da Fiesp vê com desconfiança a escolha do mineiro Josué para comandar a
principal entidade da indústria paulista. E há quem acredite que uma aliança com a Febraban representaria “criar um jacaré embaixo da cama”.
Na contramão, o comando da Fiesp considera que não faz mais sentido seguir divulgando notas de repúdio a cada subida de juros. É melhor identificar o que obriga o País a adotar taxas tão altas. “Precisamos rediscutir para que possamos eliminar as travas ao desenvolvimento”, afirmou Josué, na semana passada, durante abertura de um ciclo de cinco debates econômicos com o Tribunal de Contas da União (TCU).
O primeiro debate teve como tema a necessidade de novas regras fiscais, com a presença do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Por trás da nova postura da Fiesp está a noção de que o debate sobre a indústria precisa estar ligado à agenda macroeconômica.
INVESTIMENTO. Outro tema no radar da entidade é a necessidade do aumento dos investimentos públicos, que caíram muito desde a criação do teto de gastos. “O investimento privado em infraestrutura é fundamental e deve ser potencializado ao máximo. Mas não se pode acreditar que o investimento público é desnecessário. O setor privado sozinho não conseguirá suprir todos os gargalos do setor”, diz o novo economista-chefe da Fiesp, Igor Rocha, ao Estadão.
Entre os empresários, o diagnóstico é de que, no cenário pós-pandêmico, a indústria também precisará de um movimento de renovação. Entre os temas no horizonte estão a diversificação produtiva em setores de média e alta tecnologia, associada à descarbonização e à inserção nas cadeias globais de maior valor agregado.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.