RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Responsável pelo comando do comitê que implantou o racionamento de energia em 2001, o engenheiro Pedro Parente considera fundamental que o governo aprove base legal para dar poderes à gestão da crise energética atual.
No fim de maio, Parente foi convidado pelo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, para contar sua experiência e fazer uma avaliação sobre o cenário atual e considera que o ministério tem atuado no sentido correto para enfrentar a crise.
Mas acha que ainda faltam instrumentos jurídicos para suportar a tomada de decisões, “sem necessidade de recorrer à burocracia do governo”, disse em webinar de lançamento do livro “Curto Circuito – Quando o Brasil quase ficou às escuras”.
“Me parece que falta uma coisa que a gente teve em 2001 desde o início que é uma base legal de suporte a decisões de natureza extraordinária para uma situação de natureza extraordinária”, afirmou.
O governo planeja editar uma medida provisória sobre o tema, mas ainda não há confirmação de como será nem de quando isso ocorrerá. O texto da MP daria maior autonomia a um comitê responsável por gerir os reservatórios das hidrelétricas.
Em 2001, o governo Fernando Henrique Cardoso editou uma medida provisória criando o CGE (Comitê de Gestão da Crise de Energia), grupo interministerial que planejou e geriu o programa de racionamento.
A MP dava “superpoderes” a Parente, segundo contam os autores do livro, os jornalistas Roberto Rockmann e Lúcio Mattos. A CGE podia propor o reconhecimento de situação de calamidade pública, remanejar verbas de estatais e interferir no mercado de energia.
“As decisões dessa Câmara teriam que ser terminativas -ou seja, não podia sequer existir a possibilidade de que se tomasse uma decisão de manhã e de tarde fosse necessário ir ao Ministério da Fazenda ou do Planejamento ver se havia orçamento para resolver a questão”, escrevem os jornalistas.
Assim, o grupo foi formado com representantes de alto nível de órgãos que poderiam ser necessários na condução da crise, como os ministérios da Fazenda e do Planejamento, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e da AGU (Advocacia Geral da União), por exemplo.
“É uma situação extraordinária e quanto antes se compreender isso, quanto antes essa medida sair, melhor sairemos do processo”, afirmou Parente no webinar desta quinta.
Hoje no comando da empresa de investimentos EB Capital e presidente do conselho de administração do frigorífico BRF, Parente diz que não tem acompanhado em detalhes a situação do setor elétrico.
Mas diz ter ficado com a impressão de que o MME (Ministério de Minas e Energia) vem acompanhado a situação de forma adequada. “Sem surpresa de última hora como tivemos em 2001, dá mais condições para a prevenção ou pelo menos para tentar amenizar os efeitos”.
O ministro Bento Albuquerque diz que, com as medidas que o governo vem tomando desde 2020, como a contratação de usinas térmicas, é possível garantir que não haverá necessidade de racionamento de energia em 2021.
“O ministro tem todas as informações à mão, eles usaram modelos com margem de segurança bastante grande… Talvez ele se sinta confortável a dizer isso”, comentou. Em 2001, lembrou, ele preferia não dar certeza absoluta.
Parente diz que a experiência do racionamento mostrou a capacidade de engajamento da população. “Uma grande lição foi saber que se pode contar com as famílias, com a sociedade, com as empresas para ajudar em problemas de caráter nacional.”
Ele avalia que o governo tem sido transparente na condução da crise, o que pode amenizar impactos sobre a popularidade do presidente Jair Bolsonaro em caso de necessidade de racionamento.
Mas pondera que, quanto mais cedo se começa a agir, menor o custo. “Existe essa ideia de empurrar um pouco mais para ver se a situação se resolve por si só. Se não se resolver, pode representar um custo maior, inclusive em termos de popularidade”, afirmou.
A crise energética de 2001 é apontada como um dos fatores que levou à derrota do PSDB na eleição presidencial de 2002, vencida por Luiz Inácio Lula da Silva. Parente concorda, e avalia que pesou muito a percepção de que o governo FHC foi pego de surpresa.
“Precisamos ver o que vai acontecer, o que vai representar a evolução das chuvas nos próximos meses, que é determinante para definir a necessidade ou não de redução voluntária ou compulsória no consumo.”