BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Representantes de distribuidoras, associações de consumidores e analistas de mercado estimam que a bandeira 2 vermelha a mais cara na conta de luz terá de dobrar de valor em setembro para cobrir a alta dos custos de geração de energia.
Se a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) adotar medida nesse sentido, a conta de luz passará por um reajuste médio de 15,2%.
Com a maior crise hídrica dos últimos 91 anos, as hidrelétricas perderam espaço na oferta, enquanto o governo se viu obrigado a acionar térmicas fonte mais cara, cujo custo é repassado ao consumidor.
As bandeiras verde, amarela e vermelha constam da conta de luz e servem para indicar a necessidade de se reduzir o consumo. Caso contrário, o cliente paga mais.
Questionado, o ministro Bento Albuquerque (Minas e Energia) afirmou à reportagem que, embora a “atualização” das bandeiras seja competência da Aneel, ela “contempla o valor necessário para a cobertura de custos de GSF [risco hidrológico] e de despacho termelétrico adicional, dentre outros [fatores]”.
“Na atual conjuntura, esses custos estão aumentando. Os custos adicionais ou serão considerados na bandeira ou serão considerados na tarifa”, disse o ministro.
Distribuidores e grandes consumidores, no entanto, aguardam um impacto mais forte via bandeira tarifária, o que acarretaria um aumento de até 15,2% caso passe de R$ 94,90 para cerca de R$ 190 o MWh (megawatt-hora).
A projeção desse aumento nas contas de luz foi feita pelo diretor de regulação da TR Soluções, Hélder Sousa. A empresa desenvolveu um sistema que simula as condições de projeção das tarifas consideradas pela Aneel.
Segundo Sousa, a tarifa média hoje sem impostos nem bandeiras é de R$ 532 por MWh (megawatt-hora). Com a bandeira vermelha 2 a R$ 94,92, o valor passa para R$ 627. Se a bandeira for para R$ 190, a tarifa saltará para R$ 722 um aumento de 15,2%. O cálculo não considera impostos.
Com o agravamento da crise hídrica, que fez secar rios que abastecem os reservatórios das hidrelétricas, o país passou a importar energia da Argentina e do Uruguai e a acionar termelétricas por, em média, R$ 2.000 o MWh.
Muitas empresas, particularmente indústrias intensivas de energia, passaram a buscar o insumo no mercado livre para tentar amenizar seus custos.
Nesse mercado, o preço de referência (o chamado PLD) passou de R$ 213, em janeiro deste ano, R$ 583, em agosto.
A bandeira é um sistema que reflete justamente o aumento de custo variável da energia sempre que há fenômenos adversos, como uma seca muito intensa.
As concessionárias trabalham com tarifas reguladas sobre as quais incide o valor da bandeira vigente.
A pressão pelo repasse integral dos custos atuais para o sistema de bandeiras vem desde a última reunião da Aneel, no final de junho.
Naquele momento, a área técnica da agência recomendou que o país continuasse consumindo energia com bandeira vermelha patamar 2 (a mais cara) e propôs um aumento para R$ 115 o MWh ou R$ 11,50 a cada 100 kWh (quilowatt-hora).
Naquele momento, se o reajuste da bandeira vermelha nível 2 fosse de R$ 11,50, o aumento previsto nas contas dos consumidores seria entre 10% e 15%, movimento que exerceria ainda mais pressão sobre a inflação medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
No acumulado dos últimos 12 meses até agosto, o IPCA-15 atingiu 9,3% e um dos maiores impactos foi o da energia elétrica, que subiu 5% no mês, segundo o IBGE.
Por isso, o diretor-geral da Aneel, André Pepitone, preferiu uma proposta intermediária. Impor um reajuste de 52% na bandeira vermelha 2, o que daria R$ 94,90 o MWh. Esta foi a decisão do conselho diretor, no final de junho deste ano.
Com a decisão, a diretoria da agência optou por parcelar o reajuste, postergando cerca de R$ 3 bilhões para as tarifas em outro momento.
Para isso, realizou uma consulta pública para que os consumidores decidam se preferem que esse repasse seja feito ainda neste ano. A expectativa no mercado é que a decisão saia nos próximos dias.
Desde então, a situação das geradoras ficou ainda pior diante do agravamento da seca.
O diretor-geral do ONS (Operadora Nacional do Sistema), Luiz Carlos Ciocchi, afirmou nesta quarta-feira (25) que havia previsão de chuvas na região Sul entre julho e agosto, mas elas foram frustradas, o que levou o grupo de monitoramento emergencial da crise a tomar medidas mais drásticas de preservação da água no sistema e partir para um pacote de incentivo à redução de consumo por consumidores do mercado regulado (residencial e empresas de menor) e para grandes consumidores.
O programa de redução de consumo de consumidores residenciais foi anunciado no Ministério de Minas e Energia também na quarta, sem os detalhes mais importantes. Durante o evento, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, rechaçou racionamento.
Assessores do Palácio do Planalto avaliam que a adoção de um racionamento no momento prejudicaria ainda mais Jair Bolsonaro em sua campanha pela reeleição. O presidente vê sua popularidade despencar diante de medidas contra a pandemia e da degradação do cenário econômico. Para eles, palavras como racionamento e reajustes de preços precisam ser evitadas diante do custo político.
O ministro e sua equipe de secretários e até o diretor da Aneel se esquivaram de comentar sobre futuros reajustes das tarifas, algo dado como certo pelo mercado.
Pepitone, da Aneel, não explicou se o programa de descontos para os consumidores residenciais será capaz de amenizar as contas diante de um provável aumento da bandeira vermelha 2. Ele disse apenas que a agência está “estudando”, mas não explicou o quê.
Consultada, a Aneel não respondeu até a publicação desta reportagem.