MACEIÓ, AL (FOLHAPRESS) – Ao fim da primeira rodada da final masculina do skate park nos Jogos Olímpicos de Tóquio, a medalha de ouro parecia decidida. Keegan Palmer, 18, havia executado uma volta excepcional e conseguido 94,04 pontos de 100 possíveis.
Cada um dos oito finalistas teria mais duas voltas na difícil tentativa de superar a altíssima marca do jovem australiano. O brasileiro Pedro Barros, que registrara 86,14, não conseguiu melhorar o próprio número. O norte-americano Cory Juneau foi muito bem e alcançou 84,13.
O improvável, porém, aconteceu, e a nota de Palmer foi batida. Pelo próprio Palmer. Ele provocou aplausos e gritaria enquanto preenchia seus 45 segundos com múltiplas manobras difíceis. Ao finalizar a sequência, atirou seu skate no chão e esperou a pontuação: 95,83.
“Eu só queria conseguir uma boa nota boa de início e consegui uma muito boa. Então, resolvi fazer a manobra mais difícil que tinha pensado para a prova e aumentei essa nota. Foi f…”, afirmou o atleta à Folha, em entrevista realizada por videochamada.
O desempenho o colocou à frente de Pedro Barros, 26, medalha de prata, com quem tem uma relação bastante próxima. A amizade surgiu há nove anos, quando o brasileiro viajou com a família para surfar na Austrália.
“Foi uma daquelas amizades instantâneas entre os pais dele e os meus, sabe? Andamos juntos, rolou um convite para eu conhecer a casa dele, um tempo depois nós fomos. Foi irado conhecer [Florianópolis], é um lugar que amo. Crescer andando de skate com o Pedro foi demais, e estar no pódio com ele foi muito legal”, afirmou Keegan.
De acordo com o australiano, foi Pedro quem lhe mostrou “como andar de skate com coração, agressividade e força”. Sete anos mais novo, ele viu o catarinense dominar múltiplas competições, executando manobras difíceis nos momentos de pressão, e conseguiu superá-lo na primeira vez da modalidade nos Jogos Olímpicos.
O desempenho, o carisma e a amizade com Barros deram a Palmer a admiração de muitos brasileiros. Ele entende algumas palavras em português, mas precisou da ajuda do tradutor para compreender que as mensagens que brotaram em suas páginas nas redes sociais eram carinhosas, algumas delas de pessoas que admira.
“Eu sou muito fã do Adriano de Souza e do Italo Ferreira, por exemplo, e ver que eles comentaram nas minhas publicações foi bom. São dois dos meus surfistas favoritos”, disse o australiano, que deixou Tóquio feliz também por ter conhecido jogadores de basquete dos Estados Unidos e da Austrália.
Foi um momento especial para o skatista, que nasceu nos Estados Unidos e cresceu na Austrália. Hoje ele vive no estado norte-americano da Califórnia, quase uma regra para quem atua em alto nível na modalidade, mas não houve dúvida no momento de escolher o país que representaria nas competições: “É preciso respeitar as raízes, onde tudo começou”.
E tudo começou em uma terra onde o surfe é muito praticado. Aos três anos, ele já pegava ondas com o pai nas praias australianas e, ao mostrar um bom equilíbrio sobre a prancha, ganhou também um skate. A ideia de se profissionalizar em um esporte foi crescendo, até que uma opção entre eles se fez necessária.
“Escolhi o skate porque vi que estava evoluindo muito mais rapidamente nele, gostava desse sentimento de melhorar rapidamente. Fiz minha primeira competição aos seis anos e vi que o skate é uma família. Se você tem um skate e começa a andar, já faz parte de algo significativo, você aprende todos os dias”, afirmou.
Diante de medalhistas como a japonesa Mojimi Nishiya, a britânica Sky Brown e a brasileira Rayssa Leal, de 13 anos, Keegan é quase um veterano aos 18. Sabe que um desempenho tão elevado exige muito treinamento, não é apenas diversão, porém é contra o estabelecimento de uma idade mínima -algo discutido antes e depois do sucesso dos muito jovens em Tóquio.
“Não concordo com o limite de idade, acho que não faz sentido. Veja só: se você é mais novo e consegue derrotar os caras mais velhos, tem que competir mesmo. Ser novo e andar de skate com as pessoas mais velhas é bom para aprender a trocar experiências”, opinou, embora ciente de que o equipamento de proteção obrigatório aos menores de idade não traz garantias.
“Eu mesmo quebrei meu fêmur aos 12 anos, foi a coisa mais louca da minha vida. Foi difícil voltar a andar, passei seis meses no processo. Fiz muita fisioterapia e até achei que não conseguiria andar de novo, mas estou aqui. Tenho risco alto de me machucar por causa das manobras que preciso tentar, mas também surfo e malho, melhorando minha condição física para aguentar as pancadas.”
Não foram muitas as pancadas no Japão. A precisão na execução de seus movimentos o fez cair de pé no Ariake Park, bem equilibrado sobre o skate, para aplausos de brasileiros como Italo Ferreira, Adriano de Souza e Pedro Barros.