TÓQUIO, JAPÃO (FOLHAPRESS) – Quando o canadense Derek Drouin saltou 2,38 m na Rio-2016, Fernando Ferreira estava na arquibancada do Engenhão.
“A única coisa que pensei foi: ‘Caramba, eu não estou ali competindo! Isso não vai voltar a acontecer'”, prometeu para si mesmo.
No ano anterior, ele havia disputado o Pan-Americano de Toronto. Com 2,20 m, ficou na sétima posição.
Há dois meses, mesmo antes da convocação oficial da CBAt (Confederação Brasileira de Atletismo), Fernando já sabia que estava classificado para os Jogos de Tóquio por causa do ranking e da pontuação nos torneios. Até o embarque, foram mais de 60 dias em que não conseguia conter a ansiedade nos treinos ou em casa.
“Eu me olho no espelho e repito que vou para as Olimpíadas. É uma expectativa imensa”, completa o atleta de 26 anos e 1,98 m.
Na noite desta quinta-feira (29), ele vai realizar o sonho com o início das provas qualificatórias para o salto em altura no Estádio Olímpico de Tóquio. Sua melhor marca neste ano foi 2,28 m. Melhorá-la, ele afirma, pode significar ir para a final. Algo que seria, nas palavras do brasileiro, “incrível”.
Por via das dúvidas, ele colocou a foto da medalha olímpica na tela do seu celular. Olha para ela a toda hora. “Sonho acordado”, afirma.
Na história de Fernando, o atletismo não foi amor à primeira vista. Ele gostava de jogar futebol em Sertãozinho (cidade do interior de São Paulo).
Curioso após receber convite para tentar a modalidade, experimentou e não gostou. Achou os treinos sofridos demais. A primeira prova que participou foi os 800 m, em 2010. São duas voltas na pista oficial. Fernando percorreu a primeira, parou no meio do caminho e foi embora para casa.
“Saí de lá dizendo que aquilo não era para mim, não.”
Seu padrinho, André Gonçalves, também do atletismo, insistiu. Por que não escolher outra prova? André achou que ele poderia gostar.
“Eu já estava namorando o salto em altura. Era uma brincadeira. Cair de costas, pular cambalhota, os movimentos. Eu só comecei a levar a sério quando fui chamado para treinar em São Paulo, em 2013. Quando cheguei, minha marca era 2,05 m. Três dias depois fiz o índice para o Pan-Americano infantil, com 2,13 m. Foi quando a ficha caiu”, conta.
O atletismo já havia virado válvula de escape para algo mais profundo. Ele perdeu os pais quando tinha 12 anos. O pai morreu em acidente de carro e a mãe, de insuficiência respiratória. Fernando teve de ir morar com a avó.
“Eu não era um dos melhores alunos na escola. Era bem hiperativo e a pista é um lugar onde você consegue extravasar. Foi uma maneira de ocupar minha cabeça”.
Um ano e meio depois da mudança para São Paulo, ele começou a namorar e em 2018 se tornou pai de Antonella, que antes do embarque lhe perguntava ao acordar se era naquele dia que ele iria para as Olimpíadas.
No chão do apartamento onde mora a família, Fernando coloca uma marca para correrem de brincadeira.
“Quando a Antonella ganha, pergunta onde está a medalha e o troféu.”
O brasileiro já escutou a filha falar algumas vezes que deseja também fazer salto em altura. Aos 3 anos, ela é muito criança ainda para pensar nisso, mas o enche de orgulho. Tem também a responsabilidade porque, quando ouvia a menina perguntar se o pai ia para as Olimpíadas, em seguida ela emendava nova questão:
“Você vai ganhar uma medalha?”