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EsportesEntenda caminho que o dinheiro percorre para ajudar clubes na criação da SAF

Entenda caminho que o dinheiro percorre para ajudar clubes na criação da SAF

Entenda caminho que o dinheiro percorre para ajudar clubes na criação da SAF

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Com a implantação, no segundo semestre do ano passado, da Lei da SAF (Sociedade Anônima do Futebol), que possibilita aos clubes brasileiros de futebol se tornarem S.A., o mercado financeiro passou a ser um dos protagonistas neste novo cenário. Termos como Venture Capital e Private Equity passaram a predominar nas mesas de reuniões dos gestores da bola, substituindo os surrados “planejamento” e “gestão eficiente”, que muitas vezes eram usados como fachada pelos dirigentes sem nunca resolver de verdade os problemas financeiros das instituições.

Não é de hoje que o futebol brasileiro passa o pires, quase sempre sem conseguir pagar sua contas anuais e cada vez mais aumentando suas dívidas – alguns clubes, como o Corinthians, têm dívidas de R$ 1 bilhão.

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Os três primeiros clubes considerados grandes a mergulhar neste universo foram Cruzeiro, Botafogo e Vasco, o que causa muita expectativa nesta temporada. Todos, entre o fim de 2021 e início de 2022, se tornaram SAFs e, nos próximos anos, receberão aportes financeiros de investidores, que prometem profissionalizar a administração das entidades.

Neste modelo, todos os trâmites para o envio dos recursos do exterior seguirão os padrões utilizados para uma empresa convencional, segundo o advogado Eduardo Carlezzo, sócio-fundador do Carlezzo Advogados e especialista em Direito Desportivo. Ele afirma que, nos casos em que o investidor é estrangeiro, o recurso prometido para o investimento no Brasil deverá ser internalizado na SAF a partir de um país onde o investidor tenha seus negócios.

“O recurso chega em moeda estrangeira ao Brasil, normalmente dólar, e a SAF faz a conversão de dólar por real mediante um contrato de câmbio, momento em que os recursos serão creditados na conta bancária da SAF, seguindo todas as regras existentes”, explica.

No início deste mês, o fundo do ex-jogador Ronaldo Nazário confirmou que vai realizar um aporte inicial no Cruzeiro de R$ 50 milhões. Foram necessárias discussões com o Conselho Deliberativo do clube, até a decisão ser tomada. Posteriormente, o Cruzeiro espera receber o valor de R$ 350 milhões, de um total de R$ 400 milhões, que será inserido por geração de receitas diretas do clube ou novos aportes – Ronaldo está no mercado atrás de investidores. O clube tem cinco patrocinadores na camisa. Como Ronaldo é brasileiro, pode sacar dinheiro de suas contas, sem a conversão da moeda.

Até agora, foram investidos R$ 23 milhões para o pagamento de dívidas que causaram “transfer ban” ao Cruzeiro – “transfer ban” é uma medida administrativa que impede clube de futebol de contratar jogador por causa de dívidas não pagas do passado. No Botafogo, já entraram R$ 50 milhões por parte do novo fundo investidor, o Eagle Reading, do americano John Textor. O time se reforçou com Patrick de Paula, ex-Palmeiras, e Tchê Tchê, que saiu do Atlético-MG, entre outros.

O aporte inicial teria sido feito via empréstimo para o clube, uma outra maneira de trazer o dinheiro das SAFs para dentro. Ainda serão investidos pelo menos outros R$ 250 milhões nos próximos anos. Já o Vasco assinou um acordo com a empresa 777 Partners, de fora também. Se confirmada a compra da SAF pelo grupo, o clube carioca projeta receber investimentos na ordem de R$ 400 milhões nos próximos anos.

APORTE DE RISCO

Essa nova modalidade administrativa no futebol brasileiro atrela o setor à chamada gestão de risco, mas com a diferença de que os próprios gestores têm a função de trabalhar por melhores resultados. A SAF acaba também com aquele presidente que é eleito por um ou dois mandatos e depois deixa a associação sem prestar contas da receita do clube. No caso do clube-empresa, o dono do time é o responsável por pagar as contas e fazer o investimento crescer.

Os fundos que têm investido no futebol brasileiro entre 2021 e 2022 são do tipo Venture Capital ou Private Equity, conforme explica o economista Denis Rappaport, mestre pela Duke University (EUA). No caso do Venture Capital, o investimento é feito em empresas novas, com potencial de crescimento, mas ainda com poucas receitas. Já o Private Equity é vinculado a empresas já consolidadas no mercado e com alto faturamento.

“Dentro desse panorama, podem até ter prejuízos em muitas situações, mas quando têm lucros, eles são muito altos. Faz bastante sentido, pois qualquer um desses três clubes (Cruzeiro, Botafogo e Vasco) têm potencial para uma ‘virada’ que acabe recompensando esses investidores. Mas, evidentemente, são investimentos de risco”, afirma.

O economista acrescenta que o fato de as empresas serem S.A. não as impede de se encaixar no perfil de fundos Private Equity, que investem somente em empresas particulares, e não de capital aberto. “Acontece que os clubes-empresa são S.A. de capital fechado. Não são negociados publicamente, por isso eles ganham a definição de ‘private equity’. Normalmente esses fundos investem na melhora da lucratividade e governança das empresas que compram, de modo a que no futuro se tornem atrativas para ter suas ações negociadas, por exemplo, em bolsa de valores”, diz o especialista.

Entre os estímulos encontrados na Lei da SAF em busca de atrair os clubes para o novo modelo, estão a possibilidade de emissão de debêntures e das ações em bolsa, conforme explicado. Debêntures são valores mobiliários que representam dívidas de médio e longo prazos das Sociedades Anônimas, com remuneração em porcentagem do CDI, IGP-M ou IPCA e ainda em taxa prefixadas, por exemplo.

O objetivo de fundos de capital Private Equity é dar condições para as empresas abrirem capital na Bolsa de Valores. Rapapport, no entanto, prevê dificuldades neste sentido. “Não será fácil trazer clubes de futebol brasileiros a um padrão atrativo para lançamento de ações em bolsa. Por outro lado, esses investidores são experientes e têm estratégia. Pode ser que consigam”, diz.

Para Harold Thau, especialista em investimentos e sócio-fundador da Técnica – Assessoria de Mercado de Capitais, os grupos que passaram a investir no futebol brasileiro levam em conta em seus cálculos uma série de itens, como risco, variação da inflação dos países de origem em relação ao país em que pretendem investir, custo de capital de terceiros (financiamentos tipo bancários) e do próprio capital.

“Uma SAF é investimento de renda variável, pois as receitas e despesas podem variar ao longo dos anos. Portanto, os investidores que colocam dinheiro neste tipo de sociedade querem obter retornos superiores aos que obteriam em investimentos de renda fixa, pelos riscos envolvidos”, observa.

Apesar de a SAF ter alguns incentivos fiscais em relação às empresas convencionais, os trâmites para o envio do dinheiro ao Brasil não mudam, explica o tributarista Miguel Delgado Gutierrez, especialista em planejamento tributário e sócio da Gutierrez Marubayashi Advogados. O caminho do dinheiro, antes de entrar nos cofres do clube, deve seguir trâmites rígidos. O valor sai do banco estrangeiro para o nacional, mas a operação tem de ser registrada no Banco Central e comunicada à Receita Federal.

Este tipo de operação é registrado com o código rde-id (Remessa do Exterior – Investimento direto). “Os investimentos de fundos estrangeiros em clubes do País devem, obrigatoriamente, ser registrados no Brasil, sob pena desses investimentos serem tratados como domésticos. Esse registro permite que os investidores estrangeiros remetam lucros, dividendos e o capital inicialmente investido no Brasil por meio do mesmo mercado de câmbio utilizado para trazer o capital para o País”, explica Gutierrez.

O advogado, contudo, faz importante advertência. “O investidor estrangeiro e o receptor do capital no Brasil podem sofrer pesadas multas caso não tenham registrado o investimento no Banco Central dentro do prazo estabelecido.”

LUCRO TAXADO

Gutierrez ressalta que, em relação a impostos, o capital estrangeiro que entra no Brasil como investimento direto não sofre qualquer tributação. A remessa de lucros e dividendos e a repatriação do capital estrangeiro aplicado no Brasil estão isentas do pagamento de Imposto de Renda.

“Porém, isso só se aplica se a soma do capital a ser enviado ao exterior for igual à soma que foi registrada no Banco Central. Se o montante de capital devolvido for superior ao valor registrado, será considerado como ganho de capital do investidor estrangeiro, sujeito, aí sim, ao Imposto de Renda na fonte a uma alíquota de 15%”, destaca Gutierrez.

O tributarista considera um benefício para os investidores o fato de a SAF possibilitar que os clubes-empresa paguem, nos cinco primeiros anos, impostos com taxa de 5% sobre a receita mensal, sem incluir as receitas de transferências de atletas. Depois desse período, o valor a ser pago cai para 4%.

No caso dos clubes-empresa, o imposto é unificado, mas isso não significa que todos os tributos não estão sendo pagos, conforme esclarece o economista.

Nestes 5%, portanto, estão incluídos o IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica), CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), PIS, Cofins e contribuição previdenciária. “Claro que, apenas como clubes, havia ainda mais isenção de impostos. Mas, se comparado com empresas ditas convencionais, há sim uma redução e um benefício para os clubes de futebol. Isso em relação a tributos federais, porque em relação aos estaduais (ICMS) e municipais (ISS), a incidência do imposto é a mesma”, diz.

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