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EsportesVanessa salta do Capão Redondo para o mundo e se torna esperança para Paris-2024

Vanessa salta do Capão Redondo para o mundo e se torna esperança para Paris-2024

Vanessa salta do Capão Redondo para o mundo e se torna esperança para Paris-2024

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Quando era mais nova, a menina Vanessa viajava pelo mundo, em sonhos. Queria descobrir lugares. Agora, já adolescente, ela vai conhecer muitos países aos saltos. Ela é uma das atletas mais promissoras dos últimos tempos no atletismo nacional.

Mesmo com as dificuldades que enfrenta, com a falta de uma política pública e com o sucateamento dos locais para treinamentos adequados, vez ou outra surge um competidor de primeiro mundo a encher de esperança o alto rendimento no País. O caminho de formação é sempre longo e, por vezes, decepcionante. Nem todos vingam. E a figura da vez é uma menina de 16 anos, criada no Capão Redondo, em São Paulo, e descoberta na escola pela professora Eliane Vanzin. Vanessa está sendo lapidada como um diamante, há cinco anos, pelo técnico Alexandre Morato, na Associação Desportiva Centro Olímpico do Ibirapuera.

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Seu nome completo? Vanessa Sena dos Santos. “Eu sou a chuchuzinho da mamãe”, diz, toda dengosa, a nova esperança no salto em distância do Brasil, seguindo uma linhagem de competidores importantes ao longo da história. Vanessa é a caçula dos filhos de Valdir e Benivalda. O casal está separado. Valdir trabalha em um sacolão. “É de domingo a domingo, por isso ainda não vi a minha filha competindo”, confessa ele, que trabalha no bairro do Jaguaré.

Benivalda também tem uma rotina dura em seu emprego. É auxiliar de limpeza e folga aos fins de semana, quando dá. Por isso, sempre que pode, acompanha a menina nas competições. “Sinto uma emoção muito grande, o coração bate apressado, forte”, comenta a baiana de 48 anos. “A minha filha caçula sempre foi guerreira, o meu xodozinho, meu chuchuzinho. Sempre se dedicou e está correndo atrás de seu sonho.”

Vanessa passou a ocupar o primeiro lugar no ranking mundial do salto em distância, na categoria sub-18 desde que atingiu a marca de 6,35 metros na prova realizada no dia 23 de abril, quando foi disputado o Campeonato Brasileiro sub-20, em São Paulo. O resultado é o novo recorde brasileiro sub-18 – o anterior pertencia a Janaína Fernandez, com 6,21m desde julho de 2013.

Ela é nascida e criada no Capão Redondo, um dos bairros mais populosos e carentes da capital paulista. Um local onde é enorme a vulnerabilidade da juventude, atingida por diversas tensões sociais e econômicas. Ainda assim, o pessoal que trabalha com esportes e a parte artística define o local como uma fortaleza urbana.

Nesse universo, Vanessa sempre planejou viajar pelo mundo. “Mas não era com o esporte”, confessa a jovem que cursa o segundo ano do ensino médio e que após saltar a melhor marca da temporada para sua categoria, já virou celebridade em seu bairro, recebeu convites para entrevistas e até propostas para cursar universidade fora do país. Tudo está sendo analisando com calma.

“Estou feliz com tudo o que está acontecendo, mas não imaginava que fosse tão cedo e rápido.” Por enquanto, ela não está pensando em sair do Brasil. Mas as viagens são inevitáveis. Na semana passada, a jovem atleta faturou a medalha de ouro, com direito a recorde do campeonato (6,23 metros) nos Jogos Sul-americanos da Juventude Sub-18, em Rosário, na Argentina. Depois, irá disputar a Gymnasíade (Mundial Escolar), de 14 a 22, na Normandia, França. Mas voltará a tempo de comer o bolo que sua mãe fará para seu aniversário. “Meu chuchuzinho vai fazer 17 anos no dia 30”, derrete-se Benivalda.

Mas as competições não vão parar. Depois de soprar as velinhas, Vanessa seguirá em sua maratona particular. E antes do Campeonato Mundial na Colômbia, que será realizado no mês de agosto, em Cali, a atleta vai competir no Pan-Americano de sua categoria, em junho, no Rio de Janeiro. “E também em junho tem o Troféu Brasil”, acrescenta a menina que há algum tempo não encontra sua ‘descobridora’ no esporte, a professora Eliane Vanzin. Ela vai precisar de tempo para contar tanta novidade. “Se não fosse a professora insistir comigo, eu não teria ido disputar o campeonato escolar, onde acabei sendo observada e recebi o convite para treinar no Centro Olímpico”.

Naquele tempo, cinco anos atrás, chegar à pista do Ibirapuera era uma viagem para ela. A condução era pouca, não havia a linha de metrô. E Vanessa também não tinha roupas apropriadas para a prática do esporte. O primeiro tênis foi comprado em prestações pela professora, na volta da competição estudantil, em que ela foi vista por um olheiro, que na verdade já era o treinador atual, Alexandre Morato.

“A primeira sapatilha foi um outro professor quem deu”, relembra a professora de Educação Física que dava os treinos no pátio ou mesmo na quadra da escola municipal José Olympio Pereira Filho. “Em nossa região, o esporte é a melhor alternativa para tirar as crianças da ociosidade. Elas têm poucas oportunidades. E para elas é fundamental se envolver em alguma atividade. Para que fiquem sem tempo livre para se envolver com o que não se deve”.

A professora viu potencial naquela menina tímida, mas de passadas largas. “Desde o início, ela se destacava. E mostrava habilidade no salto em altura. Era um treino improvisado, algo mais lúdico. Ela tinha potencial, mas não queria muito competir. Era mais tímida, mais calada, mais quietinha. A gente treinava na quadra, com um colchãozinho para amortecer a queda”.

Então, a professora a incentivou como pôde. Eliane não queria falar do tênis comprado para algumas das crianças, mas quem conhece a periferia de São Paulo e o trabalho com a juventude sabe muito bem que os técnicos e professores fazem o papel de pais, mães e educadores com as crianças – mesmo tendo seus próprios filhos – como a professora, mãe de três jovens na época em que Vanessa surgiu para o esporte.

“Existem muito mais crianças com o potencial da Vanessa em nosso bairro, mas é preciso espaço para que as aulas de Educação Física sejam dadas adequadamente”, admite a professora, que hoje trabalha em funções administrativas na escola. Ela sabe que no Brasil, infelizmente, é mais fácil destruir pistas do que construí-las. Uma consciência que o técnico Alexandre Morato tem também. Sua missão no Centro Olímpico do Ibirapuera é garimpar e aperfeiçoar talentos. O Centro Olímpico não tem equipe adulta. Sendo assim, logo os atletas do alto rendimento são transferidos para outros clubes.

“A nossa filosofia é de formação. Cada um tem seu papel dentro do esporte e eu separo bem isso em meu trabalho”, acredita o treinador, que viu a menina pela primeira vez competindo nos Jogos Escolares. “Vanessa fazia a prova do salto em altura e já se percebia que tinha o perfil de atleta e logo a gente observou que tinha potencial”.

Ser um lapidador de pedras brutas não o deixa frustrado. Pelo contrário, seu trabalho é muito elogiado e respeitado. Alexandre foi atleta dos 400 metros e na juventude chegou a competir pelo Brasil em dois Sul-Americanos: no Paraguai e no Equador. “Depois me dediquei aos estudos”. E acompanhar a menina Vanessa nas competições internacionais é só mais um degrau em sua carreira de técnico e educador. “Nosso objetivo é que os resultados venham naturalmente, sem forçar. E ela ainda faz os 100 e 200 metros, porque uma prova ajuda a outra, inclusive no salto em distância. Ela tem 11s82 nos 100 metros e 24s03 nos 200 metros. As duas marcas a credenciam para o Mundial de Cali, mas nos 100 metros, o Brasil já tem outras duas atletas com tempos melhores. Então, ela precisará baixar ainda mais o seu resultado. Correr 11s78. E isso pode acontecer”.

Nas competições da Argentina, além de tentar melhorar sua marca, Vanessa deverá ter um penteado novo. “Quando fiz o resultado de 6,35m, eu estava com um penteado que minha irmã Naiara tinha feito: era um rabo de cavalo com baby-hair. Mas lá em Rosário, eu mesma vou fazer o penteado: é uma trança com box-braids. Para dar sorte”.

Independentemente do penteado a ser apresentado no dia da prova, Vanessa vai exibir também uma incrível leveza na execução de seus saltos. “Ainda tenho muito a corrigir. É uma prova muito técnica”, admite ela, que é fã das saltadoras brasileiras. “A Eliane Martins eu gosto de ver saltar e também já conversei com ela. Adorava ver os saltos da Keila Costa, que já disputou quatro Olimpíadas”, diz.

Seu treinador sabe que ela tem possibilidades boas também nos 100 e 200 metros, mas sua especialidade mesmo é o salto em distância – uma prova em que ela parece competir sem fazer muito esforço, com uma leveza incrível. “É uma prova muito técnica, mas eu sofro, sim, na competição, na execução do movimento. Aos poucos, vou aprendendo. Gosto também da velocidade, porque são provas que andam lado a lado”.

Todas essas viagens e provas, além de aumentar a lista de países conhecidos, vão aumentar também a sua coleção de medalhas. Até o fim desta temporada, Vanessa deverá ter muito mais do que as 50 penduradas no quadro na parede de sua casa. “Acho que tenho mais de 40 medalhas. E já viajei para o Peru e Paraguai. Agora, já tenho as viagens marcadas para a Argentina, França e Colômbia”.

Quando a pergunta é sobre a Olimpíada de 2024, em Paris, ela demora um pouco para responder. “Eu me vejo, sim, nos Jogos Olímpicos. Assim como me vejo saltando acima dos sete metros. Sete e pouquinho.” Como se vê, a Chuchuzinho da mamãe Benivalda está apenas iniciando uma caminhada que, com certeza, vai colocá-la na história do atletismo nacional, ao lado de gente como Silvina das Graças, Conceição Geremias, Cida Barbosa, Keila Costa e Maurren Maggi. O que era apenas um sonho, está virando realidade. “Espero servir de inspiração para os jovens do meu bairro, onde adoro viver”.

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