O que caracteriza uma feira cosmopolita é sua capacidade de absorver obras de artistas de diferentes tendências (e origens) e galerias com trânsito internacional. Com quase duas décadas de existência, a SP-Arte confirmou sua adesão a esse modelo, retomando seu formato presencial no Pavilhão da Bienal com sucesso nesta segunda edição pós-pandemia. Com 133 galerias participantes, a edição deste ano não se rendeu ao esquema das anteriores, em que a passagem de um estande a outro era quase imperceptível em virtude da homogeneidade de repertório e uniformização na escolha dos artistas – invariavelmente era sempre um nome predominante, como se toda a feira fosse a extensão de uma mostra individual (e o nome de Mira Schendel surge como o exemplo mais recorrente nas edições anteriores).
Pois a edição deste ano contemplou não só os vetores da arte moderna e contemporânea como novos artistas cujo advento no mercado é fruto dessa mudança de percepção. Para citar apenas um exemplo, a galeria que leva o nome da marchande Marli Matsumoto (que trabalhou com a veterana Luisa Strina por mais de dez anos) radicalizou e apresentou na feira só artistas com idade entre 28 e 40 anos, do carioca Elvis Almeida, que foi assistente do pintor Luiz Zerbini (com uma exposição no Masp), à ex-bailarina transexual gaúcha Elle de Bernardini, de 31 anos, que pulou da Royal Academy of Dance de Londres para o palco das artes visuais. Ou Raphaela Melsohn, de 28 anos, que vira Bruce Nauman do avesso numa obra pós-conceitual carregada de humor. Ou ainda Juan Casemiro, de Itajubá, que faz um aggiornamento do ready-made de Duchamp com objetos reciclados.
JOVENS
Claro, são jovens em começo de carreira, cujas obras oscilam entre R$ 5 mil e R$ 30 mil. Numa feira que tinha Miró (por R$ 12 milhões, ainda em negociação até o fechamento desta edição), Tarsila do Amaral (R$ 10,5 milhões), várias esculturas de Anish Kapoor (média de R$ 5,5 milhões) ou Lygia Clark (R$ 2,5 milhões), é quase nada, mas, como dizia aquela velha canção dos anos 1960 de André Previn (You Gonna Hear From Me), os jovens artistas citados ainda esperam chegar lá algum dia.
O fato é que os colecionadores estavam atrás de obras milionárias, nem tanto as históricas – e surpreende que, no ano do centenário da Semana de Arte Moderna de 22, poucas galerias tenham apostado em seu legado. Claro, Di Cavalcanti podia ser visto em vários estandes, mas o pintor já é uma presença constante nas feiras (e algumas telas suas foram vendidas por preços entre R$ 2 milhões e R$ 5 milhões).
A Dan Galeria apostou alto e colocou frente a frente um retrato de Tarsila (pintado em 1922 e muito reproduzido, mas não vendido) e uma tela de Anita Malfatti de 1925 (A Mulher e o Jogo), avaliada em R$ 6,5 milhões e vendida por preço equivalente. Considerando as cotações do surrealista Ismael Nery na mesma Dan (entre R$ 8 milhões e R$ 14 milhões), a da primeira geração das pintoras modernistas era razoável.
RECORDE
Coube à pintora contemporânea Adriana Varejão atingir o patamar dos modernistas da Semana de 22. A Galeria Almeida e Dale vendeu sua tela Sauna, de grandes dimensões, por R$ 6 milhões, e ainda um Volpi por R$ 2,8 milhões, entre outras obras de seu estande, que tinha, entre outros nomes, o das pintoras portuguesa Paula Rego e a alemã Eleonore Koch, única discípula de Volpi.
Volpi, outra presença permanente na SP-Arte, manteve seu lugar no pódio (preços entre R$ 550 mil e R$ 2,6 milhões), mas quem subiu de posição foi o pintor baiano Rubem Valentim (1922-1991), duplamente homenageado em seu centenário pela galeria Almeida e Dale e pela Pinakotheke, com um livro e breve exposição no Rio). O preço médio de uma boa tela de Valentim, de dimensões médias, girou em torno de R$ 1 milhão (as pequenas giravam em torno de R$ 120 mil), um pouco mais que a rara pintura do carioca Ivan Serpa dos anos 1960 (R$ 750 mil) à venda na galeria de Aloísio Cravo Neto, ao lado de uma rara aquarela (R$ 250 mil) de Léger. Por um pouco mais (RS 400 mil), a Galeria Raquel Arnaud vendeu uma escultura de Waltercio Caldas.
Poucas galerias estrangeiras participaram da feira este ano, mas as brasileiras estavam repletas de obras de artistas de fora (Damien Hirst, Calder, Miró). Duas concorrentes do Uruguai, a Sur e a Galeria de las Missiones, ambas com foco no construtivismo de Torres García (preços em torno de US$ 1 milhão), apostaram em María Freire (preços a partir de US$ 35 mil) e Figari (preços equivalentes).
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.