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Lazer e CulturaParceiros da Bienal de São Paulo se queixam de ruídos na programação paralela

Parceiros da Bienal de São Paulo se queixam de ruídos na programação paralela

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Desde o século 6º, os sinos das igrejas já marcavam o tempo. Primeiro das atividades religiosas, depois também das horas de trabalhar e comer. Foi só no século 18, de acordo com o sociólogo Richard Sennett, que o tempo se desprendeu do espaço, quando os relógios de bolso permitiram checar o horário sem a necessidade de uma igreja ao alcance do ouvido.

Agora, a 34ª Bienal de São Paulo, ao trazer o famoso sino de Ouro Preto –o único que soou no dia da morte de Tiradentes, à revelia das ordens oficiais na cidade mineira– e seus repiques, transforma também a extensão do tempo em tema.

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E esse tempo, no caso da mostra, aparece ainda mais diluído no espaço, já que nesta edição outras instituições apresentam uma programação em consonância com o que será visto no pavilhão do Ibirapuera.

Dessa forma, se haverá na Bienal uma seleção de pinturas de Antonio Dias em preto, branco e cinza, legendadas por palavras um tanto indecifráveis, no Instituto de Arte Contemporânea, o IAC, será possível, por meio de obras realizadas pelo artista em outras épocas e de uma extensa documentação, entender seu processo de pensamento que exige do espectador a solução de enigmas.

Uma anotação sua para um pedido de bolsa de pesquisa no Guggenheim, por exemplo, apresenta essa produção e o uso da palavra escrita “como uma possibilidade de criar uma imagem mental (não-pintura)”.

“A ideia era criar essa rede para que as pessoas pudessem ver [os trabalhos] em momentos e contextos diferentes. O ponto central era sugerir que o que um artista faz ou uma obra diz está muito influenciado pelo contexto”, afirma Jacopo Crivelli, à frente desta edição da mostra.

As camadas que se criam a partir dessa proposta, de fato, são muitas. No Instituto Tomie Ohtake, por exemplo, o que se vê são imagens de Pierre Verger num horizonte bastante ampliado, com destaque à sua imersão no continente africano e em países da América Latina e da Ásia.

Se sua preocupação com os limites da difusão de conhecimento acerca dos cultos afro-iorubás aparece discreta num dos textos explicativos do Tomie Ohtake, ela ganha amplitude nas imagens de um rito de iniciação do candomblé que estão no pavilhão do Ibirapuera.

E ainda, numa sala mais reservada, que tem na entrada um filme bastante enérgico em que o ator e cineasta Zózimo Bulbul extrapola os limites da imagem e os estereótipos do homem negro no Brasil, é como se as fotografias ali absorvessem, mais uma vez, o aspecto ritualístico das situações que as geraram.

Se é certo que a Bienal sempre pautou o calendário de outras instituições, que pensavam em atrações relevantes para chamar a atenção do público do principal evento de artes visuais do país, a diferença nesta edição é que essa espacialização acontece orquestrada.

Uma tarefa nada fácil num ano que a grade dos espaços culturais sofreu alterações por causa da Covid-19. A exposição de Joan Jonas na Pinacoteca do Estado de São Paulo, inclusive, não foi prorrogada o suficiente para manter o paralelismo inicial, ainda que tenha coincidido com a mostra “Vento”, realizada pela Bienal no ano passado e nomeada em referência a um vídeo da artista.

“Estabelecer uma relação com outras instituições não é algo novo, mas vejo essa articulação de forma positiva. Quando a Bienal nos procurou, mencionei que faríamos a primeira grande exposição da Joan Jonas no Brasil e a partir disso se deu a colaboração”, conta Jochen Volz, diretor da Pinacoteca.

“Essas sinergias que estavam planejadas se perderam um pouco no tempo ou aconteceram apenas parcialmente, mas o público que conseguiu acompanhar terá uma experiência potente das correlações entre os artistas”, acrescenta.

Na opinião do curador Hélio Menezes, do Centro Cultural São Paulo, no entanto, ficou pouco claro na divulgação da Bienal que as decisões curatoriais não aconteceram de modo unilateral. “A Jota Mombaça foi uma indicação para integrar a lista de artistas da Bienal, e não o contrário”, diz.

“Foi uma grande surpresa quando vi a comunicação oficial e o anúncio de que os artistas da mostra estarão nas [outras] instituições. Esse tipo de formulação me parece complicada”, afirma Menezes, acrescentando que os projetos foram construídos separadamente. “Pelo título se evidencia que são conceitos dissonantes –enquanto a Bienal associa o ‘escuro’ à obscuridade, o CCSP põe em questão a ideia iluminista da ‘luz’ como salvadora.”

O fato de a exposição ter sido adiada e agora ocorrer entre setembro e dezembro deste ano, com a exibição online de dois filmes inéditos, é, de acordo com o curador, só uma coincidência. Algo bastante distinto do que ocorreu no Sesc Pompeia, que teve o tempo de montagem reduzido para garantir a abertura da exposição de Alfredo Jaar no período da Bienal.

A data foi considerada importante não só para Danilo Miranda, diretor do Sesc paulista e membro do conselho da Fundação Bienal, como para o próprio Jaar. “Combinar as mostras era uma forma de obter um público maior. Os artistas trabalham na solidão, mas, na hora de expor, queremos ter público”, justifica o artista chileno.

“Resolvemos fazer o mais próximo da abertura [da Bienal] na esperança de que possa trazer mais visibilidade para todos. É uma coisa de sinergia, de juntar esforços de várias instituições”, acrescenta Miranda. O plano, a princípio, era inaugurar também individuais de Abel Rodríguez e Eleonora Fabião nas sedes do Sesc de Interlagos e do Carmo, mas as duas acabaram suspensas em razão da pandemia.

Afinar o calendário, nesse sentido, foi mais fácil para as exposições que foram pensadas como uma parceria entre os espaços, a exemplo da Casa do Povo, que arcou com a montagem da exposição da coreógrafa israelense Noa Eshkol, enquanto o transporte de obras ficou a cargo da Bienal. A proposta de que o centro cultural no Bom Retiro abrigasse os tapetes da artista, feitos de forma coletiva e a partir de sobras de tecido, neste caso, partiu dos curadores da 34ª Bienal.

“É uma artista que nasceu em um kibutz, e a Casa do Povo tem esse espírito coletivo. Ela recolhia retalhos de rua e nós estamos nesse bairro têxtil, com várias lojas de tecido”, afirma Marilia Loureiro, curadora do espaço.

A diferença no grau de participação da Bienal na construção dessa rede, no entanto, com mostras pensadas em conjunto e outras realizadas de maneira autônoma, não deixou de causar ruído.

Segundo Ana Magalhães, diretora do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, o MAC, que abre no período uma mostra individual de Regina Silveira, seria importante “que todas as instituições pudessem construir um projeto coletivo”. O museu, de acordo com ela, foi procurado ainda em 2019, quando estava recebendo uma importante doação de obras da artista. A proposta da Bienal, em complemento à exposição retrospectiva, foi atualizar a trajetória de Silveira por meio de uma instalação inédita no pavilhão do Ibirapuera.

“É inteligente e saudável que as instituições façam parcerias dessa natureza, mas acho que essa estratégia precisa ser consolidada, e isso significa pensar em captação e planejamento de recursos em comum”, diz Magalhães.

“A gente esperava que viesse uma proposição de fortalecimento institucional, uma parceria em termos mais práticos e efetivos, mas isso não ocorreu”, complementa Hélio Menezes.

Em resposta, Jacopo Crivelli Visconti argumenta que toda forma de colaboração e troca de conhecimento, mesmo do ponto de vista técnico, é bem-vinda, mas que isso “não era o que estávamos propondo”. “Buscamos ampliar as possibilidades de acesso do público a obras de artistas que estariam em exposições, mas nossa proposta era mais conceitual e curatorial”, afirma.

Se o principal ponto, de acordo com ele, era a experiência dos visitantes, uma pequena amostra do resultado dessa proposição aconteceu antes mesmo da abertura de Noa Eshkol na Casa do Povo, quando a curadora Marilia Loureiro convidou Sonia Limachi, costureira da cooperativa Emprendedoras Sin Fronteras, para ver a individual em primeira mão.

“Eu fiquei impressionada com as formas, desenhos, tecidos. Nunca pensei que alguém pudesse costurar assim”, conta Limachi, que planeja, junto com as colegas, uma excursão para o pavilhão da Bienal, espaço que até então desconhecia.

Resta saber se, em meio a uma pandemia que insiste em não arrefecer, o restante do público terá a mesma disposição.

34ª BIENAL DE SÃO PAULO – FAZ ESCURO MAS EU CANTO

Quando: Ter., qua., sex. e dom., de 10h às 19h. Qui. e sáb., de 10h às 21h. Abertura neste sábado (4). Até 5/12.

Onde: Pavilhão da Bienal, Parque Ibirapuera, portão 3, São Paulo

Preço: Grátis

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