WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Em seu segundo discurso nesta semana, o presidente dos EUA, Joe Biden, disse que a retirada das tropas do Afeganistão é uma das missões mais difíceis já realizadas pelos militares americanos, o que dificulta prever o que acontecerá agora. E que mesmo com as cenas de desespero dos afegãos, ele segue convencido de que tomou uma decisão correta ao encerrar a ação armada no país.
“Tivemos progressos nos últimos dias. Conseguimos assegurar o controle do aeroporto [de Cabul] e evacuar mais de 13 mil pessoas desde 14 de agosto. Todos os americanos que quiserem voltar serão trazidos para casa”, assegurou, em pronunciamento nesta sexta (20), na Casa Branca.
“Esta missão de retirada é perigosa. Envolve riscos para as nossas Forças Armadas e está sendo feita sob circunstâncias difíceis. Não posso garantir como será o final da operação e que não haverá risco de perdas, mas irei mobilizar todos os recursos necessários”, afirmou.
Biden confirmou que não sabe exatamente quantos americanos precisam de resgate no Afeganistão e nem o paradeiro de muitos deles, mas que seu governo trabalha para obter essas informações. Também prometeu ajudar a evacuar aliados de outros países e afegãos que ajudaram os EUA durante sua operação militar.
Disse também que os EUA fizeram um acordo com o Talibã para que americanos possam passar pelas barreiras montadas por eles nos acessos ao aeroporto. Apesar disso, há muitos relatos de dificuldades nessa travessia. E, nesta sexta, a decolagem de aviões de Cabul foi suspensa por várias horas, por falta de destinos disponíveis para enviar as pessoas resgatadas, de acordo com a CNN americana.
O democrata disse também que conversou com os líderes de Alemanha, França e Reino Unido, e que uma reunião do G7 será feita na próxima semana para definir uma abordagem conjunta sobre o Afeganistão.
Biden discursou ao lado da vice, Kamala Harris, e de Antony Blinken, secretário de Estado. O presidente respondeu à algumas perguntas de jornalistas e insistiu que manteve a retirada para preservar vidas de militares americanos, pois avalia que não faria diferença permanecer mais tempo lá. Ele lamentou as cenas de caos e as considerou “de partir o coração”, mas reafirmou que a missão no Afeganistão agora se resume a resgatar americanos e aliados e que se houver alguma ameaça terrorista a partir de lá no futuro, serão tomadas ações pontuais.
A semana foi marcada pelas cenas de desespero das pessoas que tentam deixar o Afeganistão. Uma multidão se aglomera nos arredores do aeroporto de Cabul, onde os militares americanos estão instalados e de onde partem voos para o exterior. A confusão no local já deixou ao menos 12 mortos.
Na segunda (16), afegãos invadiram a pista e tentaram se agarrar a aviões prestes a decolar. Na quinta (19), imagens mostraram afegãos tentando entregar bebês e crianças para militares americanos, na esperança de que eles possam ter um futuro melhor.
Após tomar o poder, no último fim de semana, o Talibã prometeu moderação, mas tem dado sinais que de que fará o contrário. Houve repressão dura a protestos e a criação de barreiras nos acessos ao aeroporto, o que dificulta a chegada ao terminal de afegãos que tentam fugir.
Embora a retirada de tropas do país asiático tenha apoio popular e bipartídário nos EUA, a forma como ela foi feita gerou muitas críticas. Biden é atacado por não ter planejado a retirada de modo a evitar o caos dos últimos dias. Ele insiste que não havia maneira estável de retirar as forças americanas do país, mas a postura atual destoa de declarações anteriores.
Em julho, o presidente defendeu que as chances do Talibã retomar o poder eram mínimas, enquanto o grupo já estava conquistando territórios. Com isso, veio a questão se Biden não recebeu informações adequadas do setor de inteligência do governo, ou se decidiu manter a retirada mesmo sob alertas de que muita coisa poderia dar errado.
Segundo o Wall Street Journal, um grupo de funcionários da embaixada americana em Cabul enviou um alerta, em julho, de que o Talibã conseguiria dominar a capital logo após a saída das forças estrangeiras.
Em 2020, o governo de Donald Trump fez um acordo com o Talibã, que prometia agir de modo civilizado em troca da saída americana. O acerto foi mantido por Biden, mas o grupo derrubou o governo do presidente Ashraf Ghani antes da retirada dos EUA ser concluída.
Em um discurso na segunda (16), Biden admitiu que seu governo fez previsões erradas, mas culpou os militares e políticos afegãos pela situação. “Tropas americanas não devem lutar e morrer numa guerra que os afegãos não querem lutar”, afirmou. Na quarta (18), Biden deu uma entrevista para a TV ABC e disse que poderia estender o prazo final da saída, marcada para 31 de agosto, caso a retirada de cidadãos americanos não tenha sido concluída.
O Talibã voltou ao comando do Afeganistão quase 20 anos após ter sido derrubado pelos Estados Unidos, que invadiram o país em 2001 para caçar os terroristas responsáveis pelos ataques de 11 de setembro. Na época, o grupo foi derrubado rapidamente, mas a ocupação do país durou duas décadas. Os EUA tentaram estabelecer um regime democrático no país e criar um Exército nacional forte, mas falharam nas duas coisas.