BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Alçada ao Senado após a nomeação de seu filho Ciro Nogueira (PP-PI) para a chefia da Casa Civil, Eliane Nogueira (PP-PI), 72, figura nos registros da Câmara dos Deputados como tendo sido funcionária dos gabinetes do parlamentar do PP, que foi deputado federal por 16 anos, e do marido, Ciro Nogueira Lima (1933-2013), que também foi deputado por dois mandatos.
Primeira suplente na chapa em que Ciro foi eleito para o Senado, em 2018, ela tomou posse na quarta-feira (29) na vaga do filho.
Boletins administrativos da Câmara apontam que Eliane ocupou cargos ao longo dos anos 1980, 1990 e 2000 não só nos gabinetes do filho e do marido, mas também de um aliado e em área administrativa que era comandada por Ciro.
De acordo com os registros da Câmara, Eliane Nogueira foi nomeada em 1983, ficando no cargo de assistente parlamentar no gabinete do marido até 1987, período que coincide com o primeiro mandato dele na Câmara.
Em 1991, voltou a ser nomeada no gabinete do marido, quando ele voltou à Câmara. Foi exonerada e renomeada por diversas vezes até que sua nomeação foi tornada sem efeito em outubro de 1994.
Em meados dos anos 1990, Eliane foi nomeada novamente na Câmara, desta vez no gabinete do filho, Ciro Nogueira, que sucedeu o pai como deputado federal. Um mês depois, foi deslocada para o gabinete do deputado Átila Lins (PP-AM), aliado de Ciro.
Depois, mudou para o gabinete da quarta secretaria da Câmara, na época ocupada pelo filho. Por fim, assumiu outro cargo na estrutura da Casa, fora do gabinete do filho, onde ficou até setembro de 2005.
Os boletins administrativos da Câmara mostram uma série de mudanças no status de Eliane Nogueira, com diversas exonerações e nomeações.
Por exemplo, a atual senadora foi nomeada secretária parlamentar no gabinete do marido em 1º de fevereiro de 1991. Foi exonerada pouco mais de um mês depois, em 12 de março. No dia seguinte, foi novamente nomeada.
De acordo com o ato da mesa da Câmara 12/2003, a prática de repetidas nomeações e exonerações tinha como único objetivo forçar o pagamento da rescisão contratual dos assessores, com 13º salário proporcional e indenização por férias, não raro acumuladas acima do período permitido em lei.
À reportagem, a atual senadora afirmou que a prática de nepotismo não era crime em tempos passados e que não houve vantagens indevidas.
“Há 30 anos, trabalhar ao lado de familiares na administração pública não era ilegal e ocorria por questões de confiança. Seria imoral somente se houvesse vantagem indevida, o que não era o caso. Entretanto, a sociedade avança e as leis se modernizam”, afirmou por meio de sua assessoria de imprensa.
Em 2008, o STF (Supremo Tribunal Federal) consolidou em súmula o entendimento de que o nepotismo viola os princípios da moralidade e impessoalidade expressos na Constituição de 1988, não necessitando de lei específica para sua proibição.
Eliane assumiu o mandato querendo mostrar que não será fantoche do filho no Senado. Aliados da família no Piauí dizem que isso vai ficar claro nos primeiros meses de mandato, uma vez que a consideram uma política experiente e inteligente.
Embora nunca tenha ocupado cargo público, dizem que ela sempre atuou nos bastidores das campanhas eleitorais do marido e do filho, organizando reuniões com líderes políticos e articulando apoios. Em 2018, assim como o filho, foi uma das apoiadoras da candidatura de Fernando Haddad (PT) ao Palácio do Planalto.
“Eliane é uma grande política. Sempre foi uma das principais coordenadoras das campanhas nos estados, é uma das políticas mais atuantes nos bastidores”, afirmou a deputada federal Margarete Coelho (PP-PI).
Rivais no estado do Piauí, porém, dizem que Ciro continuará a ser o senador “de fato”.
Em sua declaração à Justiça Eleitoral em 2018, Eliane afirmou ter R$ 3,6 milhões em bens, incluindo participações em cinco empresas –duas agropecuárias, uma rede de concessionárias de motos, e duas de empreendimentos imobiliários.
Em dados da Receita Federal, consta ainda como sócia de uma rádio em Teresina, uma agência de publicidade, uma produtora de filmes para publicidade e uma loja varejista de eletrodomésticos.
Eliane também tem presença constante na sociedade piauiense. É sócia de um grupo de socialites chamado Clube do Chá, que faz reuniões periódicas e ações filantrópicas em Teresina.
Segundo a Lei das Inelegibilidades, a indicação de parentes à suplência das chapas que concorrem ao Senado não é ilegal, mas já há iniciativas no Congresso para impedir a prática.
Em uma postagem nas redes sociais, Eliane afirma ter reagido com espanto ao ser escolhida suplente do filho em 2018.
“Lembro como se fosse ontem do dia em que fui escolhida para ser a primeira suplente de meu filho na chapa que concorreria ao Senado. Apesar de inicialmente espantada, reforcei que estou à disposição para fazer o melhor pelo povo do meu estado”, afirmou.
A senadora ressalta que foi escolhida em uma convenção do partido e não apenas por seu filho. Mas também afirma que o principal motivo foi a relação de confiança e o fato de já acompanhar a carreira política de Ciro desde sua primeira eleição, em 1995.
“Isso garante a continuidade do projeto escolhido pelos mais de 900 mil piauienses que depositaram seus votos em nossa plataforma política”, afirma resposta da assessoria de imprensa.
Ela diz que pretende inicialmente manter toda a estrutura e equipe do gabinete de Ciro.
Eliane se casou aos 17 anos com Ciro Nogueira Lima. Na época, ele era auditor fiscal em Teresina, mas começava a seguir os passos na política do pai e do irmão mais velho.
Pai de Ciro Nogueira Lima e avô do hoje ministro da Casa Civil, Manoel Nogueira Lima iniciou a longa tradição política da família em Pedro II, cidade de 39 mil habitantes a 195 km de Teresina, onde foi prefeito.
Nogueira Lima mudou-se para a capital do estado para estudar direito e continuou de lá o legado político da família. Foi deputado federal entre 1983 e 1987 pelo MDB, partido de oposição à ditadura militar.
Em 1986, concorreu a uma vaga no Senado pelo PFL, mas foi derrotado. Voltou à Câmara em 1991, onde cumpriu mandato até 1995, quando passou o bastão para Ciro Nogueira, seu filho mais velho. Nogueira Lima morreu em 2013 após um câncer de pulmão.
O atual ministro, Ciro Nogueira, deu sequência ao legado, permanecendo 16 anos como deputado federal e outros 10 como senador.
“O objetivo do agente político é contribuir com a sociedade, estando ou não em um mandato eletivo. Gosto de atuar nos bastidores, mas agora Deus quis que eu assumisse outra missão, da qual não vou me esquivar”, respondeu Eliane, ao ser questionada pela reportagem sobre porque nunca havia se candidatado anteriormente.
A senadora afirma que vai atuar em prol do povo dos municípios mais carentes do Piauí e, de uma maneira mais ampla, na tentativa de aprovar propostas que proporcionem a retomada do crescimento econômico.
Ela também diz que “será natural atuar em pautas de defesa da mulher”. Durante sessão da CPI da Covid, seu filho chegou a discutir com Eliziane Gama (Cidadania-MA) ao se opor à participação da bancada feminina no colegiado.