Uma das signatárias da carta em defesa da democracia organizada pela Faculdade de Direito da USP, a socióloga e presidente do Conselho Curador da Fundação Tide Setubal, Neca Setubal, afirma, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, que a democracia brasileira está em ‘xeque’, mas que a sociedade ‘acordou’ após os reiterados ataques do presidente Jair Bolsonaro ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas. Para ela, o ato marcado para o dia 11 no Largo de São Francisco, em São Paulo, será ‘simbólico’, mas vai gerar um efeito prático. ‘É o que espero’, disse.
Como avalia os recentes movimentos em defesa da democracia, como a Carta aos Brasileiros e Brasileiras da Faculdade de Direito da USP?
Esses movimentos são muito importantes. Para enfrentarmos as desigualdades sociais enormes do País precisamos ter uma democracia forte, com uma sociedade civil robusta, plural e ativa, ou seja, falante. A gente tem hoje uma democracia em xeque, com seu sistema e suas instituições sendo questionadas e atacadas. E isso não é de hoje.
A reunião de Bolsonaro com embaixadores estrangeiros para criticar o sistema eleitoral foi o ápice desses ataques?
Esses movimentos de defesa da democracia ganharam muita força depois da reunião com os embaixadores. Para mim, essa ação foi um tiro no pé e só serviu para acelerar toda essa movimentação da qual faço parte já desde 2021. Você não consegue ter um apoio tão maciço a uma carta, que eu acho que vai chegar a 1 milhão de assinaturas até o dia 11, de uma hora para outra e ainda mais reunindo empresários, entidades e organizações tão diversos, da Febraban à Coalizão Negra. Acho que agora sim chegamos a uma frente ampla. A defesa da democracia mudou de patamar.
Acredita que o empresariado vai defender o resultado das urnas se elas derem a vitória ao ex-presidente Lula que, em tese, não é apoiado pelo mercado?
É disso que se trata. Eu fico muito satisfeita em ver como vários empresários de peso têm assinado de forma individual a Carta aos Brasileiros e às Brasileiras. Isso é uma demonstração de que talvez a maior parte dos empresários que têm influência no País, gostem ou não, vai defender o resultado das urnas. Para mim, essa é uma sinalização fundamental, porque a sinalização das organizações da sociedade civil já está dada desde o primeiro dia do governo Bolsonaro. A entrada de grupos empresariais, de advogados e de juristas nesta defesa é o salto que a gente precisava. Foi meio tarde, mas em tempo ainda.
A Fiesp afirma em manifestação recente que sem Estado Democrático de Direito não há liberalismo econômico. Essa percepção é que está crescendo?
No final do dia é muito melhor para o mercado ter regras claras, definidas com transparência, sem autoritarismo. Para mim, a assinatura de empresários do setor financeiro e entidades do mesmo setor expressa que, independentemente do candidato, há uma consciência de que o sistema democrático é melhor para todos. De novo, veio meio tarde, mas em tempo.
Com exceção do presidente Bolsonaro, a senhora vê no discurso dos demais presidenciáveis a defesa necessária da democracia?
Sim. Lula, Ciro Gomes, Simone Tebet e Luiz Felipe d’Avila, por exemplo, são contundentes na defesa da democracia, o que é fundamental. Estamos num momento crucial no Brasil hoje, por isso considero fundamental esses posicionamentos públicos. É difícil vermos os empresários brasileiros se manifestando, por exemplo.
Acha que essa participação social veio para ficar?
Eu tenho certeza que as entidades e as organizações da sociedade civil acordaram e viram que, independentemente do resultado da eleição, essa extrema-direita vai continuar muito ativa e que, portanto, vamos ter um trabalho muito grande, se o Bolsonaro não for reeleito, no processo de reconstrução do País.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.