Com a volta das atividades de escolas privadas em São Carlos (SP) e outras partes do Estado de São Paulo, pais e mães com filhos matriculados em escolas públicas se perguntam quando os filhos poderão voltar às escolas.
Uma questão suscitada na volta às aulas é a desigualdade de oportunidades entre alunos da rede pública e os de escolas privadas. A volta antecipada dos alunos de escolas pagas pode aprofundar o fosso entre ensino público e privado?
Para a diretora do Centro de Educação e Ciências Humanas da Universidade Federal de São Carlos (Cech-UFSCar), Ana Cristina Juvenal da Cruz, a dicotomia entre escolas privadas em atividade e públicas paradas esconde outras questões mais profundas sobre o ensino estatal.
“A discussão não é se deve abrir ou não abrir, mas quais são as condições para a reabertura que não são equitativas. É isso que devemos discutir de forma mais solidária, de como podemos colocar a educação como um centro de nossa questão contemporânea para pensar as saídas necessárias”, comenta.
Para Ana Cristina, tanto as escolas privadas quanto o público atendido têm melhor suporte para a volta às aulas, algo não visto na rede pública de ensino.
“É claro que observamos uma capacidade de articulação mais organizada do que as pessoas que usam o serviço público ao mesmo tempo em que tem uma estrutura de apoio mais consistente. É claro que as pessoas que podem pagar pela escola particular têm também um sistema particular de saúde. Então se essas pessoas eventualmente se contaminarem, elas terão uma estrutura de saúde mais adequada, mesmo observando que o sistema privado de saúde há superlotação”, comenta.
A diretora do Centro de Educação e Ciências Humanas ressalta as consequências sociais da volta às aulas. “O vírus não tem escolhas sobre quem ele infecta, mas quando acontece, o resultado e o agravamento têm a ver com essa desigualdade”.
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) divulgou relatório no último domingo (24) que mostra que as escolas passaram em média 2/3 do ano letivo fechadas por causa da pandemia. Mais de 800 milhões de estudantes mais da metade da população estudantil mundial ainda enfrentam interrupções das aulas.
Audrey Azoulay, diretora geral da Unesco pediu um pacote de recuperação com financiamento adequado para reabrir as escolas com segurança, “visando os mais necessitados e colocando a educação de volta nos trilhos”.
“Estamos ainda à espera de um plano efetivo que congregue aquilo que temos ouvido o tempo todo de que há de se ter ações conjuntas para a garantia de EPIs (equipamentos de proteção individual), mudanças nas estruturas das escolas que não poderão ser mais como vimos até aqui. E há o debate da inclusão dos professores no plano de vacinação e por fim a própria lógica pedagógica”, opina Ana Cristina.
Aspectos arquitetônicos das escolas, como distribuição de salas, conceituação de espaços de convivência, iluminação e ventilação devem ser repensados pelos governos. O próprio uso das salas com a distribuição de alunos e distância entre carteiras escolares, problemas que já preocupavam professores e entidades antes da pandemia, sob prisma do aprendizado, agora devem ser analisados sob a ótica da saúde.
A diretora do Centro de Educação e Ciências Humanas comenta ainda a necessidade de se “prestigiar” a educação e a ciência, de forma a barrar movimentos anticiência que tentam desacreditar a pesquisa. “Temos observado um projeto distinto, não somente de desacreditar a educação, mas também a ciência e pesquisa, temos visto isso não somente na fala, mas também nas ações de governo. Foram os professores de universidades que foram atrás de fazer uma vacina. Os imunizantes têm nomes de universidades”, finaliza.