Houve um tempo em que as bancas de jornal vendiam, de fato, jornais e revistas. Mas hoje em dia, com a mídia digital e notícias online, como atrair os leitores e consumidores para as bancas?
Produtos eletrônicos, perfumaria, bebidas, doces, cigarros, brinquedos e até sapatos são encontrados no antigo reduto de leitura.
Os jornaleiros tiveram que se reinventar ao longo dos anos desde a revolução da internet e queda drástica de vendas de jornais e revistas.
Na banca da jornaleira Rosalva Pedro Antônio, 58 anos, a Tuty, o forte são os títulos de capitalização e produtos de perfumaria.
Tuty está há sete anos a frente da “Nossa Banca”, no Santa Angelina, é uma das únicas mulheres no ramo em Araraquara.
Cerca de 10 bancas de jornal resistem contra o tempo na cidade. Segundo os jornaleiros entrevistados pela reportagem, nos anos 90, a Morada do Sol chegou a ter até 80 bancas.
“Temos que nos inventar e diversificar para continuar no ramo, estar atento ao que o pessoal procura, aqui são produtos eletrônicos, papelaria e perfumaria. Estou pensando no que posso colocar de mais diferenciado para chamar atenção”, conta Tuty.
A jornaleira trabalha de segunda a segunda, como a grande maioria do ramo, e é uma apaixonada pela profissão. Ela não se vê fazendo outra coisa por enquanto.
QUADRINHOS E CIA
Luiz Regazzini tem 38 anos e se diz um “ratinho de banca”. Desde criança frequentava as bancas atrás de histórias em quadrinhos (HQs) e começou a colecionar.
Quando seu pai veio para Araraquara e abriu uma banca de jornal há 20 anos, foi uma realização. Hoje é ele quem toma conta do espaço, a “Banca da Praça Pedro de Toledo”, um local mais focado em quadrinhos.
“O meu foco é quadrinhos, porque gosto muito desse universo. 80% do meu faturamento vem de HQs. Isso acaba atraindo o pessoal mais novo. Eles compram na internet mas também gostam de vir na banca, porque tem bate papo, pegam o gibi na mão”, aponta.
Regazzini diz que tem usado a internet a seu favor e tem uma rede social da banca onde posta novidades e pega encomendas. “O público mais novo está lá, mas estamos na luta”.
Além dos gibis, há máscaras, brinquedos de super heróis, utensílios para celular, salgadinhos, refrigerantes, entre outros.
“Não gosto de pensar muito no que vai ser da banca, até o pessoal da família me questiona que daqui um tempo não vai existir mais banca de jornal”, expõe.
PROCURA-SE LEITORES
O jornaleiro conta que quando abriram o espaço, em 2001, tinham em torno de 60 bancas na cidade. A média de jornais vendidos aos domingos era entre 300 a 400. Hoje são vendidos 15.
“Hoje se vende 15 de domingo é uma glória. Durante a semana cai para uns três jornais por dia”, frisa.
Ele diz que o perfil do araraquarense que ainda lê jornal impresso é de idoso ou jovem que está prestando vestibular. E algumas escolas que tem na lista de material escolar o gibi ou revistas específicas.
“Tem professores que pedem trabalho de escola em bancas, inclusive nas listas de material tem o gibi, a revista X, para incentivar a leitura”, aponta Ricardo Borges, de 56 anos, sendo 20 anos dedicados a Banca Central de Araraquara.
Ricardo acredita que para a leitura sempre vai ter um tipo de público.
“Eu acho que é uma luta, mas tem o público ainda, se você for ver o DVD acabou de uma vez mas a revista não, está resistindo, tem um público que está acostumado. Talvez não tenha uma renovação de público, embora os jovens gostam mais de mangá, quadrinhos”, conta.
Borges tem clientes habituais que todos os dias passam para pegar o jornal assim que ele abre. O jornaleiro também faz entregas para alguns clientes e tem encomendas de cidades vizinhas, onde não existe mais banca de jornal.
“Tenho clientes em Itápolis, Boa Esperança do Sul, geralmente eles reservam as coleções de livros”, diz.
A estudante Rebeca Flóis , de 19 anos, procurava um mangá na banca de Ricardo. Ela comenta que frequenta a banca desde criança, incentivada por seus pais.
“Desde criança frequento bancas com meus pais, para comprar gibi e jornal. Sempre passo para ver se chegou algum mangá. É bom pegar um livro na mão, uma revista, é diferente da sensação de ler online”, reforça.
DESAFIO NOSTÁLGICO
Na banca do Carmo, do jornaleiro Jorge Luís Agustoni, há um mix de tudo. Foi o meio que ele encontrou de resistir e se reinventar, inclusive na pandemia do coronavírus e lockdown.
Entre jornais, palavras cruzadas e revistas, há óculos, cigarros, sapatos, brinquedos e muita conversa sobre os tempos dourados das bancas.
Jorge começou em 1992 e chegou a ter quatro bancas em Araraquara. Ele acompanha nostálgico, o que na sua visão é o “falecimento das bancas”.
Para ele, o espaço já foi um ponto de encontro e hoje as pessoas perderam o interesse em ler impresso.
“Olha eu acho que a banca será transformada em outra coisa, as pessoas só procuram palavras cruzadas porque gostam de fazer no papel. Antes era ponto de encontro, já tive gerações de famílias que frequentavam. Acho que a banca vai desaparecer. As pessoas só buscam informação pelo celular e internet hoje”, reflete.
Jorge faz questão de lembrar de seu amigo jornaleiro Antônio Alves Inamorato, o Tonhão, que faleceu há menos de um mês por complicações da covid-19.
“O Tonhão saía com a bicicleta que tinha um baú na frente e distribuia os jornais e revista pela cidade. Ele foi um dos primeiros jornaleiros de Araraquara, merece ser sempre lembrado”, conclui.