Fatos ocorridos antes do assassinato da retroescavadeira podem dar nova conotação às rusgas entre Iébel Garcia Silva e Milton César Magalhães.
Na manhã de 22 de março, o assassinato com o uso de uma máquina pesada deixou o Brasil estarrecido pela brutalidade e discrepância de forças entre o agressor Milton e a vítima Iébel.
Quase um mês depois, fatos anteriores à fatídica manhã vieram à tona. Em redes sociais, o vereador Djalma Nery (PSOL) divulgou que fora procurado por Iébel para uma denúncia sobre suposto caso de favoritismo no uso de carro oficial – para leva e traz de funcionários de outras cidades – e contratação de horas-extras.
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Segundo o vereador, os fatos já foram levados ao conhecimento do Ministério Público, tanto na face criminal – em que o caso está tramitando após oferecimento de denúncia – quanto na cível – no que tange à administração pública.
A denúncia foi alvo de requerimento apresentado pelo vereador dois dias antes da morte de Iébel. As respostas chegaram ao gabinete do parlamentar nos últimos dias.
IÉBEL PROCURA VEREADOR
Em denúncia apresentada – e a qual o acidade on teve acesso – são mostrados ‘prints’ de conversas entre Iébel e Djalma. O servidor público procurou o vereador para apresentar a denúncia em meados de fevereiro.
Entre idas e vindas, a conversa se estende por semanas até dias antes de Iébel ser assassinado. Ele foi orientado por Djalma a apresentar denúncia anônima para a Ouvidoria. A Prefeitura de São Carlos confirmou o recebimento, em 14 de março, da informação anônima cujo protocolo foi mencionado pelo próprio Iébel nas mensagens.
“É muito bom jogar isso daí na tribuna, falar o que está acontecendo. Ocorreu isso daí [mencionando o uso de veículo oficial] com muita frequência em 2022 e, mesmo com a proibição feita pelo Marchesin [Benedito Carlos Marchesin, então presidente do Saae], continua em 2023”, afirma Iébel em um dos áudios. Posteriormente, o servidor afirma haver “conivência” de uma das chefias da autarquia quanto aos fatos.
“A gente conversou por telefone. Por WhatsApp depois ele mandou algumas mensagens explicando. Ele me trazia denúncia que queria formalizar para as autoridades (…). Eu sugeri que formalizasse aquela denúncia de maneira anônima, já que eu entendi que era uma coisa perigosa pelo contexto, justamente por ele ser um servidor”, afirmou o parlamentar em entrevista ao acidade on.
Em 6 de março, Iébel afirma não saber se a nova gestão [de Mariel Olmo] tem conhecimento do que ocorre na autarquia, mas afirma que vai aguardar para ver. “É como eu te disse. Se eu comprar certas brigas sozinho, eu vou estar sozinho num mar de tubarões zrs (sic)”.
Dez dias depois, nova troca de mensagens. Iébel informa que o carro oficial foi usado novamente para levar “um funcionário novamente”. A informação foi confirmada em resposta do Saae ao requerimento do vereador. O nome que aparece no documento oficial é de Milton César Magalhães.
A revelação chegou ao conhecimento do vereador após Djalma protocolar, a 20 de março (dois dias antes do assassinato) requerimento pedindo apuração do suposto caso de favorecimento no Saae. O documento recebeu aprovação do plenário em 28 de março e foi despachado para a Prefeitura.
“Fiz o requerimento para que pudessem explicar o uso do veículo oficial. Porque aqueles mesmos veículos eram usados tantas vezes para levar as mesmas pessoas para as cidades vizinhas? Porque as horas extras eram concentradas nas mesmas pessoas?”, indagou.
“Para o nosso espanto, poucos dias depois disso a ficamos sabendo desse assassinato e quem matou foi justamente a pessoa que era mais beneficiada pelo uso irregular e pelas horas extras”, afirma.
REVELAÇÕES DO SAAE
A resposta do requerimento foi emitida em 17 de abril e chegou nesta semana no gabinete do vereador.
O documento, ao qual o acidade on teve acesso, mostra transporte pessoal de Milton feito com carro público do Saae em cerca de 40 ocasiões entre o ano passado e este, a maior parte concentrada entre fevereiro e julho. A última carona com carro oficial foi dias antes do assassinato, em 13 de março, sete dias antes da denúncia de Iébel, na mesma data mencionada em mensagem.
Em requerimento, o Saae informou, ainda, que Milton recebeu 212 horas extras ao longo do ano passado. Sem levar em consideração os custos pagos pela jornada, que podem variar conforme horários e adicionais, é o equivalente a mais de um mês de trabalho, se considerada uma jornada de segunda a sexta, 8h diárias.
“Tenho a expectativa de que o Ministério Público possa instaurar um inquérito junto à Vara da Fazenda Pública para apurar esse esquema de horas extras e de uso de veículo oficial”.
O QUE DIZ A POLÍCIA CIVIL
O titular da DIG (Delegacia de Investigações Gerais), João Fernando Baptista, afirmou que o inquérito – já entregue ao Ministério Público – chegou à conclusão que o assassinato foi cometido por rixa entre autor e vítima.
“Toda linha de investigação foi neste sentido e as testemunhas também corroboraram”, afirmou.
O delegado revelou que ouviu de cinco a seis testemunhas. Parte deles, servidores do Saae. Questionado se depoimento de testemunha com algum tipo de envolvimento com irregularidades na autarquia enfraqueceria a tese da Polícia Civil, Baptista respondeu: “Não vou poder responder porque é uma conjectura em cima da outra”.
“Vou procurar o vereador para saber o que ele tem [de denúncia] para poder responder”, complementa.
Sobre a possibilidade de irregularidades no Saae aventada pelo vereador, o delegado afirmou que se for da alçada da DIG, pode ser investigado. Caso contrário, será encaminhado ao Ministério Público ou outro delegado.
O QUE DIZ O SAAE
Em nota, o Saae informou reiterar “que segue colaborando com as investigações”.
O QUE DIZ AS PROMOTORIAS
Procuradas, as promotorias cível e criminal de São Carlos não responderam aos questionamentos do acidade on até o fechamento desta reportagem.
O QUE DIZ A DEFESA DE MILTON
Procurada, a defesa de Milton César Magalhães não atendeu às ligações do acidade on. O espaço segue aberto para manifestação dos advogados.
SINDICATO SE POSICIONA
O Sindspam (Sindicato dos Servidores Públicos e Autárquicos Municipais de São Carlos e Dourado) afirmou que não recebeu denúncias relacionadas a suposto favorecimento de funcionários no uso do carro oficial ou divisão de horas-extras.