Imagine o seguinte cenário: em uma sala de aula se inicia uma conversa, os alunos e alunas falam sobre as manifestações que estão ocorrendo em plena pandemia de COVID-19 e sendo organizadas pela oposição ao governo atual.
Nesse debate, alguns se colocam como favoráveis, visto que as ações tomadas pelo governo para combater a crise sanitária se mostram ineficazes. Outros se colocam contrários, mesmo que sejam opostos à governança de Bolsonaro, pois se não seguida as medidas sanitárias, acabam por disseminar o vírus e demonstram uma contradição no discurso, entre ficar em casa e ir para a rua. Um terceiro grupo, se alinhando às visões e decisões tomadas pelo governo, acredita que as manifestações só demonstram um caráter de parcialidade.
Esse cenário e os questionamentos e contradições que surgem a partir dos debates são conflitos, sobretudo, conflitos ideológicos. Em outras palavras, em uma sala de aula se encontram pessoas que vêm de diferentes bairros e cidades, pertencem à diferentes etnias, faixas-etárias, religiões e religiosidades, orientação sexual, gênero, para não falar as ocupações trabalhistas, estruturas familiares, etc.
Se compreendemos que a escola abarca uma grande quantidade de pessoas, que são diversas e tem visões de mundo diferentes, e a própria escola está inserida nos conflitos sociais, no modo de organização da sociedade, então precisamos começar a nos colocarmos enquanto sujeitos políticos, que convivem com outros indivíduos, que presenciam contradições, embates sociais, e que temos que achar resoluções.
Todo o percurso até aqui nos conduz por uma direção: o diálogo. É apenas com o diálogo que se entra em contato com o outro e suas opiniões, suas posições políticas e sua visão de mundo, que se pode viabilizar uma sala de aula que busque ser democrática, respeitando o outro, que possui opiniões e posições distintas da minha, consigo conviver com ele de forma que possamos buscar soluções que beneficiem à ambos. É importante, por fim, que entendamos que não se trata de relativizar a verdade, pois temos métodos e metodologias científicas que prezam por conclusões que elucidem essas dúvidas.
Os diferentes precisam estar em contato, sobretudo em seu processo de formação da identidade e da cidadania, para aprender a conviver pacificamente e compreender que existem privilégios historicamente construídos para uns e exclusões sistemáticas para outros.
Há ainda, aqueles que defendem a neutralidade da escola, dizendo que seus assuntos devem estar alinhados somente com os conteúdos escolares. Tal afirmação parte do pressuposto que a escola é um espaço completamente alheio aos demais espaços vivenciados pelos estudantes e professores. Os conteúdos escolares surgiram todos dentro de um cenário político, econômico e social, e é importante que os estudantes possam visualizar suas conexões com a realidade, compreendendo que a transformação da sociedade e a sistematização do saber, foi realizada por sujeitos históricos. Apropriando-se do saber produzido ao longo de toda a humanidade, e aplicando-o à seu contexto histórico, apreende-se que eles próprios são sujeitos históricos e, com uma visão crítica acerca da realidade, podem atuar em busca de melhorias para a sociedade atual. Dessa forma, falar sobre política na escola torna-se imprescindível para a construção de um indivíduo crítico e ativo na sociedade, visto que o debate entre grupos sociais distintos fomentam a compreensão de violências sociais e, portanto, promove como consequência o combate à discriminação, à intolerância e ao autoritarismo que quer se impor em contraponto à pluralidade própria da democracia.
* Alunos de Graduação do Curso de Ciências Sociais da UNESP – Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara. O projeto “Pílulas de Educação Política” é realizado sob a supervisão do Prof. Danilo Forlini, responsável pela disciplina “Ciências Sociais e Educação: Diálogos com a Ciência Política” feito em parceria com o Prof. Bruno Silva, coordenador do blog Multipli_Cidade do Portal A CidadeON.