Quando o Campeonato Paulista começou, a Ferroviária anunciava que, em fase ofensiva, iniciaria suas jogadas com três jogadores na saída de bola, que seriam dois zagueiros e um volante. Mais adiantados, teríamos dois meio-campistas que atuariam como “médios”, responsáveis por conectar o sistema ofensivo da equipe. Na linha de frente, cinco atletas ofereceriam profundidade, com laterais e pontas trocando de posição, em amplitude ou entrelinha, com um centroavante por dentro.
Foi assim que o time jogou nas duas primeiras rodadas, contra Corinthians e Água Santa.
Contudo, se a estrutura estava bem definida, as dinâmicas coletivas não foram suficientemente elaboradas. Na prática, a Locomotiva não conseguia construir suas jogadas desde o campo de defesa, entregando a bola para seu adversário quando pressionada. No momento em que a marcação alta dos rivais cedia, ao atacar, a equipe ficava restrita às inversões de jogo dos zagueiros para os laterais ou pontas posicionados pelo lado. Todavia, como o Ferroviária não conseguia desenvolver sua saída de bola, acabava por ser incapaz de atrair o adversário para gerar espaços e transformar as “viradas de jogo” em um padrão verdadeiramente vantajoso do ponto de vista ofensivo. Para se defender, o time se reorganizava em um 4-4-2 espaçado, em que os volantes da segunda linha erravam o momento em que deveriam avançar para tentar retomar a posse.
Contra o Botafogo-SP, o técnico Elano tentou mudar a plataforma tática, resgatando o 3-4-3 que a equipe usou na Série D. Entretanto, do ponto de vista organizacional, os problemas estruturais se repetiram, tanto que a mudança de sistema foi interrompida ainda no primeiro tempo, na partida contra o RB Bragantino. Inclusive, contra o time da Red Bull, jogando no 4-2-3-1, a Ferroviária mostrou o seu melhor desempenho no estadual. Verdade seja dita, explorando uma situação de jogo específica, em que havia superioridade numérica no meio-campo, o que facilitava os caminhos para que a Locomotiva chegasse no campo de ataque.
A partir de então, independentemente da plataforma tática, os problemas coletivos se tornaram crônicos. Não por acaso, a Ferrinha terminou a 7ª rodada do Paulistão na zona de rebaixamento.
Contra a Inter de Limeira, uma adversária direta na luta contra o descenso, uma mudança emergencial indicou o caminho que o clube deve seguir para que finalize sua participação no Campeonato Paulista sem mais sustos. Sobretudo na segunda etapa, em que, excetuando o vacilo de Tcharlles que ofereceu um pênalti para o rival, a Ferroviária se defendeu melhor, ajustando a altura do bloco defensivo e o momento em que os meio-campistas pressionariam, oferecendo menos espaços para que a Inter de Limeira produzisse no campo de ataque. A orientação para um jogo de contra-ataque, explorando a velocidade dos pontas e laterais, tornou-se a melhor a saída. Ainda assim, a marcação por dentro, entre a linha de meio-campo e de zagueiros, precisa melhorar.
Ao final do estadual, um debate sobre a montagem do elenco da Ferroviária para a disputa do Paulistão, com participação ativa de seu treinador na escolha dos jogadores, deve ser feita, considerando a incoerência desmedida que há entre o modelo de jogo do time e os atletas contratados para a competição. Não existe uma equipe que queira ter uma saída de bola sustentada sem um volante com capacidade de construção desde o campo de defesa. Do mesmo modo, não faz sentido pressionar a defesa adversária sem meio-campistas agressivos sem a bola e que recomponham rapidamente em seu campo de defesa. Há uma contradição em termos entre os perfis aqui mencionados e jogadores como Marquinhos, Vitinho e Uillian Correia, que possuem suas virtudes, mas que não correspondem ao empreendimento coletivo inicialmente indicado por Elano.
Por enquanto, o que resta é corrigir os próprios erros promovidos pela comissão técnica e direção de futebol da Ferroviária, para que o time esteja na primeira divisão do Campeonato Paulista do ano que vem.